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Crítica | Clube de Compras Dallas

por Rafael W. Oliveira
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Em meados anos 80, a AIDS havia se tornado uma epidemia mortal. E em meio a uma sociedade ignorante e mal informada, a doença era ligada como pertencente apenas ao grupo de homossexuais e viciados em drogas ilícitas. E para Ron Woodroof (Matthew McCounaghey), um heterossexual texano residente do Texas, tal “exclusividade” da doença lhe permite a liberdade de transar irresponsavelmente com o maior número de mulheres possível, até o dia em que, para sua surpresa, acaba sendo diagnosticado como portador do HIV. Ao descobrir a realidade renegada dos portadores do vírus, Ron, com o auxílio do travesti Rayon (Jared Leto) cruza a fronteira de sua cidade e dá início a um negócio de vendas de drogas consideradas ilegais em seu país, mas que parecem ajudar no tratamento das pessoas portadoras do vírus, uma vez que os hospitais ainda não descobriram o tratamento adequado para conter o vírus.

Dirigido por Jean-Marc Vallée (de C.R.A.Z.Y. – Loucos de Amor e A Jovem Rainha Vitória) e roteirizado por Craig Borten e Melissa Wallack, Clube de Compras Dallas surgiu como uma das surpresas que, em geral, recebem seu merecido destaque apenas durante a época de premiações, ou mais especificamente, quando surgem os indicados ao Oscar. Há muito que vinha se comentando sobre o processo de transformação de McCounaghey e Leto para interpretarem seus papéis, onde ambos emagreceram diversos quilos para se adequarem as exigências físicas de seus personagens.

Clube de Compras Dallas é, de certa forma, uma espécie de filme-propaganda para a imagem dos dois atores: não é de hoje que McCounaghey, antes um rosto pouco destacado pela crítica, tem recebido diversos elogios por suas interpretações visivelmente mais maduras e ambiciosas, tais como as vistas em O Poder e a LeiKiller Joe – Matador de Aluguel e Possessão. E Leto, apesar dos anos em que esteve fora das telas, retorna trazendo consigo um nível razoável de polêmica sobre sua surpreendente transformação para a caracterização travestida de seu personagem.meados do

Tais objetivos nada modestos poderiam ter chegado a resultados desastrosos, se ambos os atores não estivessem em momentos tão inspirados de suas carreiras, e indubitavelmente, se tornam a alma e o corpo de Clube de Compras Dallas. McCounaghey surpreende, principalmente, pela entrega física ao papel de Ron Woodroof, mas também exibe um envolvimento emocional com o papel digno de um grande ator. De início, Woodroof nos causa repulsa por seus atos irresponsáveis e preconceituosos, tal como deve ser, com McCounaghey injetando um grande nível de intensidade em sua performance. E conforme a transformação de Woodroof ocorre e suas idealizações começam a tomar novas formas, o ator é hábil ao transitar do visceral para o sensível de maneira extremamente orgânica, trazendo verossimilhança a nova personalidade que se forma em Woodroof. Leto, que também impressiona por sua entrega física, não fica atrás e surge irreconhecível como o travesti Rayon, apostando em trejeitos e expressões que trazem um certo humor para sua figura, mas também denunciam o sofrimento que rodeia, aflorando na tela uma auto-confiança poucas vezes vista.

Apesar da excepcionalidade indispensável do trabalho destes dois atores (sem o qual o longa poderia, facilmente, ter se tornado pouco destacável), Clube de Compras Dallas ainda carrega seus méritos próprios. Embora Jean-Marc Vallée jamais se desprenda do tom de filme-denúncia da obra (o que lhe traz certa redundância) e o roteiro apresente certas repetições que acabam por ressaltar tal redundância, o diretor obtêm êxito ao trazer um certo tom de leveza e humor ácido para sua narrativa, evitando assim o melodrama que, tantas vezes, acaba por atingir produções semelhantes, trazendo assim um bem-vindo contraponto a realidade cruel daqueles que se encontravam contaminados pelo vírus HIV. E apesar de se estender para além do que precisava, o roteiro também é eficiente na construção/desconstrução da personalidade de Ron Woodroof, transformando-o numa figura extremamente complexa e, surpreendentemente, de fácil conexão com o espectador. Afinal de contas, nós somos ou já fomos alguém como Woodroof, uma pessoa de julgamentos precipitados sobre sua própria realidade e sobre as pessoas que fazem parte dela.

Apesar de suas já comentadas obviedades (como a crítica às denuncias farmacêuticas e seus interesses monetários), Clube de Compras Dallas é um filme digno sobre um tema ainda atual, e que merece ser descoberto. As grandes interpretações de McCounaghey e Leto (prováveis vencedores da já próxima 86° edição do Oscar) já fazem valer a conferida, mas felizmente, o filme carrega suas próprias qualidades que lhe trazem um algo a mais.

Clube de Compras Dallas (Dallas Buyer Club, EUA, 2013)
Roteiro
: Craig Borten e Melissa Wallack
Direção: Jean-Marc Vallée
Elenco: Matthew McCounaghey, Jared Leto, Jennifer Garner, Steve Zahn, Denis O’Hare, Griffin Dune
Duração: 117 min.

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