Cinema é uma arte difícil e complexa. Roteiro, direção, atuação, iluminação, figurino, maquiagem, fotografia e trilha sonora são alguns (dentre tantos outros) fatores envolvidos na concepção de um filme. Imagine a quantidade de pessoas e trabalho existentes em torno de uma obra do gênero. Agora, depois desse breve exercício, imagine tudo isso somado ao peso extra de que estão filmando sobre a vida de um dos maiores gênios dessa arte e, naturalmente, a expectativa sobre o resultado, principalmente do público, é gigantesca. A responsabilidade chega assustar, não é? Para alegria de todos os cinéfilos e apaixonados pela sétima arte, Chaplin, dirigido por Richard Attenborough, é uma cinebiografia digna do tamanho e da genialidade de Charles Spencer Chaplin, apresentando desde sua infância humilde em Londres até seu exílio na Suíça.
Muito antes de interpretar por uma década o “gênio, bilionário, playboy e filantropo” Tony Stark nos filmes do Homem de Ferro (e entrar para o grupo de Hugh Jackman de “atores que nasceram para interpretar esse personagem”), Robert Downey Jr. teve a missão, 16 anos antes, de representar o criador do icônico Carlitos e um dos mestres do cinema mudo. E, novamente, para nossa alegria, o resultado é absolutamente satisfatório. Inclusive, a atuação de Downey Jr. é, sem sombra de dúvidas, o ponto mais alto do filme.
A maneira como o ator absorve as principais características de Chaplin, como o andar clássico do Vagabundo, é deslumbrante, a ponto de questionarmos se não houve algum tipo de mágica que possibilitasse a encarnação do britânico no norte-americano. O já citado andar, as caretas, os trejeitos cômicos, a constante busca pela perfeição, o completo fascínio pela arte (além de atuar, Chaplin dirigiu, produziu, roteirizou e compôs para diversos de seus filmes) estão todos presentes tão fidedignamente que o encanto é imediato. O eterno Tony Stark, não à toa, concorreu ao Oscar de Melhor Ator naquele ano, um reconhecimento à altura de sua interpretação.
Além da espetacular atuação de Robert Downey Jr. como protagonista, Geraldine Chaplin (filha de Charles Chaplin) teve a difícil tarefa de executar o papel de sua própria avó paterna, Hannah Chaplin, que sofreu com enfermidades mentais desde a juventude de seu pai. Seu desempenho, no entanto, é extremamente bem feito e igualmente tocante, algo triste de certa forma devido ao pouco tempo de tela que lhe foi dado (assim como o grande Anthony Hopkins, que fez o papel de George Hayden, fictício biógrafo de Chaplin, e também dispôs de menos tempo de tela do que estamos acostumados a vê-lo). Acredito que ao lado do pouco tempo dado principalmente a Geraldine Chaplin, as relações amorosas do protagonista também foram retratadas de forma rápidas demais. Sim, é verdade que esse gigante do cinema teve diversas companheiras ao longo de sua vida e tomaria tempo demais da projeção mostrar detalhadamente todos, entretanto suas relações aparecem e desaparecem com tamanha velocidade e obviedade que torna-se previsível ao espectador anteceder os acontecimentos amorosos de Chaplin antes mesmo de se concretizarem.
Também é interessante notar como a arte, razão pela qual dedicou toda a sua vida, lhe trouxe tantas alegrias e felicidades e equivalentes problemas e tristezas. Enquanto visivelmente sentia-se realizado criando obras como O Imigrante e O Grande Ditador, a relação com seu irmão e empresário, Sydney Chaplin (Paul Rhys), estremecia-se cada vez que uma das obras de Chaplin continha críticas sociais (uma de suas marcas e um dos motivos que ocasionou seu exílio). O cuidado de Attenborough em apresentar esses extremos de sentimentos é tão perceptível que resulta numa emocionante película acerca de um dos maiores nomes que já tivemos o prazer de conhecer nessa arte. Uma verdadeira viagem para todos os fãs de Chaplin ou daqueles que desejam conhecer mais sobre a vida deste magnífico artista.
Chaplin (idem – EUA, 1992)
Direção: Richard Attenborough
Roteiro: William Boyd, Bryan Forbes, William Goldman
Elenco: Robert Downey Jr., Geraldine Chaplin, Paul Rhys, John Thaw, Moira Kelly, Anthony Hopkins, Milla Jovovich
Duração: 143 min.