Número de temporadas: 7
Número de episódios: 176 + um telefilme que foi ao ar entre a 3ª e a 4ª temporada
Período de exibição: 22 de setembro de 1982 a 14 de maio de 1989
Há continuação ou reboot?: Não.
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Em razão de seu diagnóstico de Mal de Parkinson ainda muito cedo, aos 30 e poucos anos, Michael J. Fox acabou tendo uma carreira relativamente curta no audiovisual, mesmo que, tecnicamente, ele esteja ativo até hoje, com todas as limitações da debilitante doença. No entanto, o ator, apesar de ter estrelado diversas outras obras, teve três verdadeiramente grandes e inesquecíveis momentos em sua vida profissional, protagonizando três obras que marcam a televisão o cinema. A primeira delas é Caras e Caretas, série que durou sete temporadas, e em que ele viveu o “jovem Republicano” Alex P. Keaton; a segunda delas (e aqui eu aglutinei as três em uma só) é a Trilogia De Volta para o Futuro, em que ele, apesar de ter sido a primeira escolha de Robert Zemeckis para encarnar Marty McFly, foi contratualmente impedido de estrelar justamente em razão de Caras e Caretas (mais especificamente em razão da licença maternidade da atriz Meredith Baxter, que vivia a mãe de Alex, o que tornou essencial a dedicação do ator à série), entrando apenas depois em substituição a Eric Stoltz, com a produção do primeiro longa já adiantada e, finalmente, como Mike Flaherty, em Spin City, do mesmo criador de Caras e Caretas, outra longeva sitcom que durou seis temporadas, mas que ele teve que sair em razão do avanço extemporâneo de sua doença a partir do final da quarta temporada, no ano 2000, com Charlie Sheen entrando como um novo personagem com função equivalente.
Fiz essa longa introdução porque, mesmo considerando a infelicidade de sua doença, Fox é um daqueles raros atores que tiveram, no coração de sua carreira, três obras que marcaram época e que são até hoje lembradas. Sua escalação em Caras e Caretas – um daqueles títulos em português que parecem idiotas, mas que, na verdade, é perfeito – foi relativamente polêmica, pois a produção não o considerava galã o suficiente para o papel em razão de sua diminuta estatura, algo que fica muito evidente já no piloto quando o vemos ao lado dos atores que vivem o pai, mãe e irmã do meio. No entanto, sua presença foi tão magnética, tão memorável logo no começo da série que seu criador, Gary David Goldberg, que originalmente imaginara a série tendo como protagonistas Elyse Donnelly Keaton (Baxter) e Steven Keaton (Michael Gross), os pais de Alex (Fox), Mallory (a então estreante Justine Bateman, irmã de Jason Bateman, que depois viria a viver outros papeis e a tornar-se produtora, roteirista e diretora) e Jennifer (Tina Yothers), alterou o curso da narrativa já em seu quarto episódio para efetivamente fazer de Alex o personagem principal.
E, mesmo considerando que o elenco que forma a família Keaton é ótimo, com especial destaque para Baxter e Gross vivendo ex-hippies de inclinação de esquerda que tem embates ideológicos com Alex em razão de sua inclinação mais à direita, fica evidente desde o piloto que Fox, pequenino ou não diante de seus pares, é o grande destaque de Caras e Caretas. Não afirmo isso em retrospecto, com uma visão nostálgica, mas sim com base no trabalho de Fox nesse início e a forma como seu personagem conservador, que preza o dinheiro e o status social acima de tudo, somente para, repetidas vezes, perceber o quão estava enganado, é magistralmente construído pelo ator a partir de um roteiro de Goldberg que chega a dar a entender que desde o início o showrunner via algo especial em Fox.
Falando em roteiro, a temática ampla da série, o choque de gerações, ganha um esperto recorte específico e em perfeita consonância com a época, que marcou o começo da Era Reagan e seu “reaganonomics“. Esse é, aliás, o mote da narrativa que constrói críticas ao conservadorismo, ao republicanismo e às políticas que acabariam beneficiando o empresariado americano, estabelecendo contrastes que, claro, parecem naturalmente exagerados, como é o centro narrativo do episódio piloto, ou seja, a tentativa de Alex de encantar uma rica e bela socialite de sua escola, o que o leva a jantar com ela e sua família em um exclusivíssimo clube de elite cuja própria existência tira seu pai do sério, levando-o a fazer uma cena vergonhosa por lá. Mas o melhor é que o exagero não é gratuito; ao contrário, ele serve à narrativa e ao que a série deseja passar sem tratar tudo de forma maniqueísta e sem exatamente demonizar os lados dessa conversa. Sim, o showrunner tem um óbvio viés político, mas ele constrói uma conversa elegante e não simplesmente trata de usar frases de efeito para mostrar o que acha.
Com isso, mesmo que, na origem, Caras e Caretas não tivesse Fox com centro absoluto das atenções, o piloto parece deixar claro que isso era completamente inevitável. Fox domina as cenas com sua jovialidade e timing cômico e é capaz de fazer humor apenas ficando de pé alisando sua gravata. Lógico que ajuda muito o texto ser esperto e o restante do elenco ser ótimo, mas o futuro Marty McFly é o grande achado ali. E, claro, a ideia de se discutir política de maneira elegante e, ainda por cima, em um ambiente familiar, parece tão estranha nos dias de hoje tão marcados pela polarização de lados e entrincheiramento de ideias, que a série parece ser de uma realidade paralela.
Caras e Caretas – 1X01: Piloto (Familty Ties – EUA, 22 de setembro de 1982)
Criação: Gary David Goldberg
Direção: Asaad Kelada
Roteiro: Gary David Goldberg
Elenco: Meredith Baxter, Michael Gross, Michael J. Fox, Justine Bateman, Tina Yothers
Duração: 24 min. (cada episódio)