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Crítica | BRZRKR – Vols. 1 a 3

Pancadaria sem fim.

por Ritter Fan
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Resultado de uma das mais impressionantes campanhas de quadrinhos originais do Kickstarter, que arrecadou quase 1,5 milhões de dólares, BRZRKR, segundo consta, é criação de Keanu Reeves que não só co-escreveu os roteiros ao lado de Matt Kindt, como emprestou sua imagem para que Ron Garney a usasse para conjurar o personagem titular, comumente chamado apenas de B. Trata-se de um interessante caso de criação instantânea de uma franquia, já que, com uma maxissérie de 12 edições já publicadas (esta que é objeto da presente crítica) pela BOOM! Studios, mais duas HQs one-shot lançadas e outra por vir, espera-se para futuro muito próximo um romance literário dentro desse universo e, claro, o lançamento de um longa-metragem live-action e de uma série animada pelo Netflix.

Como minha crítica da primeira edição da maxissérie deixou claro, BRZRKR é, basicamente “pornô de violência”, com a arte de Garney dedicando páginas e mais páginas para pancadarias infinitas em que B, um guerreiro imortal de 80 mil anos de idade, mata todo mundo que vê pela frente das maneiras mais horríveis possíveis e é também mutilado e até morto algumas vezes, somente para regenerar logo em seguida, como uma versão mais do que turbinada, bem mais velha, só que sem garras de Wolverine. Cumprindo missões para o governo dos Estados Unidos com o objetivo de ele ser estudado de maneira que uma “cura” para sua imortalidade possa ser descoberta e ele, então, possa morrer em paz, entre uma destruição e outra B passa por exames psiquiátricos e profundas pesquisas sobre sua origem e, mais importante ainda, o local em que nasceu, para que seu tormento possa, então, chegar ao fim.

Quando terminei meus comentários sobre a primeira edição, afirmei que a continuidade da história “muito provavelmente oferecerá mais complexidade narrativa e revestirá seu protagonista ainda sem nome de mais e interessantes camadas” e, ainda que ela de fato ganhe mais complexidade, não sei se posso afirmar que há mais do que a camada da superfície para o personagem que é monocórdio em sua vontade de morrer e de matar, sem realmente ganhar uma construção maior que vá além das lembranças de seu passado remoto. Mesmo considerando a quantidade gigantesca de páginas dedicadas à “arte de matar pessoas das maneiras mais sanguinolentas possíveis”, algo que, admito, Garney faz muito bem, com painéis dinâmicos e detalhados e repletos de sangue, tripas e tudo mais que alguém que só queira violência descerebrada pode esperar, o desenvolvimento do passado de B prende a atenção do leitor e eleva a narrativa para além do entorpecimento mental causado pelos morticínios.

Claro que o leitor não deve esperar perfeita lógica para a origem do protagonista, mas é interessante como Reeves e Kindt emprestam uma aura messiânica a B e como sua presença em basicamente o mundo todo ao longo dos milhares de anos de sua vida cria uma função interessante de manutenção da memória de civilizações perdidas. Não é algo muito trabalhado ao longo das 12 edições que formam os primeiros três volumes da série, mas, na medida em que a história avança e aprendemos sobre um grupo milenar que cultua B como um deus, quais são os reais interesses dos EUA e como seu DNA vem sendo usado, a dupla de roteiristas até consegue criar um semblante de coesão. Não gosto de como eles acabam “aloprando” no final, quando um teste extremo em B é realizado e ele é catapultado para “fora do tempo e do espaço” (ou algo do gênero), mas creio que esse tipo de abstração bizarra faça parte de uma história que não pode ter apenas uma explicação científica, precisando socorrer-se do que podemos interpretar como sendo o sobrenatural.

Mesmo com esses aspectos positivos, o roteiro é telegrafado demais. Eu sou o primeiro a defender previsibilidade de histórias, mas, aqui, Reeves e Kindt basicamente dizem exatamente o que vai acontecer mais a frente e, ainda por cima, fazendo o uso mais básico e banal de clichês de toda a sorte, de relações amorosas até o “vilão escondido”. Considerando, porém, que BRZRKR tem todo o jeito de ser algo cientificamente criado para ser facilmente explorado nas mais diversas mídias e para alcançar o maior público possível, esse tipo de construção simplista, no estilo de blockbuster hollywoodiano, era mais do que esperado. Pelo menos a arte de Garney, se o leitor já estiver acostumado com violência extrema (que, vamos combinar, já deixou de ser novidade há muito tempo), é consistente, bonita e fluida, cumprindo exatamente seu dever, que é o de mostrar o potencial da obra a executivos com vontade de garimpar obras para serem adaptadas para o audiovisual e, claro, ao público em geral, ainda que o nome de Reeves na capa da HQ seja inegavelmente o maior atrativo até para quem não tem o hábito de ler quadrinhos.

Apesar de ter 12 edições e quase 360 páginas, a maxissérie não acaba aqui. Sim, o grande arco inicial é encerrado, mas Reeves e Kindt não se furtam de abrir um gigantesco espaço para continuações e, mais ainda, para expansões da mitologia. Novamente, isso já era de se esperar, pois faz parte do jogo de criação automática de novas franquias para serem exploradas à exaustão enquanto ainda estão frescas e parecem novidades. Não tenho a menor dúvida de que BRZRKR vendeu e continuará vendendo muito em quadrinhos e tenho menos dúvida ainda de que, uma vez transpostas para o audiovisual, as HQs amealharão mais um exército de apreciadores que verão qualquer coisa (1) com Keanu Reeves; e/ou (2) com a promessa de extrema violência; e/ou (3) com computação gráfica até o talo. Vamos ver até aonde essa brincadeira vai…

BRZRKR – Vol. 1 a 3 (EUA, 03 de março de 2021-2023)
Contendo:
BRZRKR #1 a 12
Roteiro: Keanu Reeves, Matt Kindt (baseado em criação de Keanu Reeves)
Arte: Ron Garney
Cores: Bill Crabtree
Letras: Clem Robbins
Editoria: Ramiro Portnoy, Eric Harburn, Matt Gagnon
Editora: BOOM! Studios
Datas originais de publicação: de 03 de março de 2021 a 15 de março de 2023
Editora no Brasil: Editora Panini
Datas de publicação no Brasil: março de 2022 (Vol. 1), agosto de 2022 (Vol. 2), dezembro de 2023 (Vol. 3)
Páginas: 359

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