Depois do acerto com O Diário de Bridget Jones, tanto na relação com o público quanto na dinâmica com a crítica especializada, era inevitável que uma continuação fosse desconsiderada. Os dilemas da protagonista interpretada com carisma e paixão pela texana Renée Zellweger provavelmente continuariam, mesmo que a sua jornada no filme ponto de partida já nos garantisse alguma evolução. Assim, alguns poucos anos depois do sucesso que deu a primeira indicação ao Oscar de Melhor Atriz para representante do papel principal, Bridget Jones: No Limite da Razão, também inspirado em um livro homônimo de Helen Fielding, foi lançado. Confesso que gosto de algumas coisas da narrativa, mas falta muita coisa do antecessor para justificar essa sequência como relevante. Uma série de situações improváveis e exageradas se estabelece, colocando a nossa suspensão da descrença em sinal de alerta. O elenco, apesar de engajado, sofre diante do roteiro dominado por problemas, além da direção de Beeban Kridon, confusa diante do manancial de situações constrangedoras oriundas do texto assinado por Andrew Davies, Adam Brooks, Richard Curtis, além da presença de Fielding, autora do romance que já não pode ser considerado um material interessante de tradução para o cinema.
O filme expande o universo da personagem, focando em suas lutas amorosas, sua busca por autoaceitação e as pressões sociais que a cercam. O enredo segue Bridget, que agora está em um relacionamento amoroso com o advogado Mark Darcy (Colin Firth). Ao mesmo tempo, ela se envolve em um novo romance com o sedutor e canalha Daniel Cleaver (Hugh Grant), criando um triângulo amoroso que desperta a inseparável insegurança e a constante confusão que caracteriza sua vida. O filme começa com a tentativa de Bridget de equilibrar sua vida profissional e pessoal, enquanto ela lida com suas próprias expectativas e os padrões impostos pela sociedade. O grande problema? Ser confusa e atrapalhada é algo engraçadinho, divertido, que nos causa alguma identificação. Mas, desta vez, nossa querida protagonista se apresenta demasiadamente atrapalhada. O histrionismo alcança níveis exaltados. E assim, cansa.
Um dos temas mais proeminentes é a luta de Bridget para aceitar a si mesma em meio a padrões de beleza e comportamento frequentemente inatingíveis. Ao longo do filme, ela se esforça para se encaixar nos moldes tradicionais do que significa ser uma mulher bem-sucedida e amada. A sua jornada é marcada por falhas e imperfeições, o que ressoa com muitas mulheres que enfrentam a pressão para serem “perfeitas”. A jornada de Bridget é, portanto, uma mensagem poderosa sobre aceitação pessoal e autenticidade, mas que os envolvidos no projeto não conseguem colocar em cena de forma mais efetiva por causa dos excessos mencionados anteriormente. Bridget Jones explora a complexidade dos relacionamentos, questionando constantemente o que exatamente significa estar em um relacionamento saudável. A relação de Bridget com Mark evidencia tanto amor quanto desentendimentos. Por outro lado, seu retorno a Daniel representa perigo e a tentação do que é familiar, ainda que volátil. Como lidar?
Mark traz muita segurança, mas excesso de burocracia. Daniel estabelece a diversão, mas a falta de um propósito mais firme. O dilema de Bridget ilustra a dificuldade de fazer escolhas em um ambiente emocionalmente carregado, refletindo as falhas e os acertos que muitos enfrentam em suas vidas amorosas. Em seu desenvolvimento, as interações com suas amigas servem como um suporte vital para Bridget. As conversas e os momentos compartilhados entre mulheres e o estereotipado amigo gay destacam a importância da amizade feminina. Essas conexões não apenas oferecem conforto, mas também proporcionam uma reflexão sobre a vida e as decisões que se deve tomar. O solilóquio de Bridget com suas amigas fornece um espaço seguro para explorar suas inseguranças, mostrando como a camaradagem pode proporcionar força em tempos difíceis. O humor autodepreciativo de Bridget, sua tendência a se meter em situações embaraçosas e os diálogos espirituosos garantem que a narrativa mantenha sua leveza, mesmo quando aborda dilemas emocionais mais complexos. Muitas queixas? Sim, mas o filme também consegue criar algumas passagens envolventes e diálogos inteligentes e divertidos.
Com seus problemas narrativos responsáveis por muitas inconveniências dramáticas, Bridget Jones: No Limite da Razão, ao menos, acerta em seus elementos estéticos. A trilha sonora é badalada e dominada por clássicos e contemporâneos. Além dessas músicas da cultura pop, selecionadas para embalar algumas sequências, a textura percussiva de Harry Gregson-Williams e Stuart Roslyn entregam viagens entre o melancólico e o festivo sem forçar a barra para arrancar lágrimas dos espectadores mais sensíveis. Adrian Biddle, em sua eficiente direção de fotografia, nos entrega belas imagens para contemplar, em especial, nos enquadramentos externos, oriundos da cenografia natural por onde os personagens trafegam ao longo dos 108 minutos de trama. O mesmo pode ser dito de Gemma Jackson no design de produção, setor que reflete com assertividade as dimensões psicológicas e sociais dos personagens diante dos espaços por onde se estabelecem internamente. Os figurinos, outro ponto importante para a concepção, em especial, da protagonista, também cumprem os seus papeis ao traja-la. Jany Temime, responsável por assinar as funções do setor, entrega algo dentro do esperado. Assim, numa análise panorâmica, faltou mesmo qualidade dramática, retomada em O Bebê de Bridget Jones.
Bridget Jones: No Limite da Razão (Bridget Jones: The Edge Of Reason) – Inglaterra/França, 2004
Direção: Beeban Kidron
Roteiro: Andrew Davies, Adam Brooks, Richard Curtis, baseado no romance homônimo de Helen Fielding
Elenco: Renée Zellweger, Colin Firth, Hugh Grant, Gemma Jones, Jim Broadbent, Jacinda Barrett, Sally Phillips, Shirley Henderson
Duração: 108 min