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Crítica | “Brat” – Charli XCX

O encapsulamento perfeito de uma geração pop.

por Handerson Ornelas
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Não é sempre que um álbum toma proporções memísticas tão grandes a ponto de ganhar conotação de marca nas redes. Brat, sexto álbum da britânica Charli XCX, é um dos poucos casos de obras pop abraçadas absurdamente tanto pelo público, quanto pela crítica especializada. Para além de toda identidade visual genial do álbum – que chegou até na candidata a presidência dos EUA, Kamala Harris, entrando na piada – estamos falando de uma obra que consolida a importância de uma artista pop que ajudou a moldar o lado mais experimental do gênero nos anos 2010.

365 abre o disco como tese perfeita da declaração de Brat. É um manifesto de força implacável, irredutível e autêntica da cantora. A faixa de abertura sabe encapsular muito bem o tom versátil do disco, fazendo uso de beats que, mesmo que minimalistas, não deixam de soar imponentes. A interpretação de Charli entrega a receita ideal de uma composição pop, sabendo ser intensa na mesma proporção que também é sexy e dócil. A sequência seguinte é feita de dinamites de puro êxtase pop: Club Classics e Symphaty is a knife são pura fritação para as pistas e possuem a marca do hyperpop que fez a cantora virar um expoente da PC Music, o selo musical que ficou marcado pela exploração escrachada e experimental do pop dos anos 2000.

O principal fator que separa Brat do restante da discografia de Charli XCX é sua versatilidade na exposição de sentimentos e seu apetite por traduzir isso em novas nuances sonoras. Para cada pedrada de beats pesados e letras empoderadas como vemos em Von dutch, existe um contraponto da britânica através de canções como So I e I might say something stupid, que pegam de surpresa o ouvinte tradicional ao se apoiar em uma composição intimista e frágil, que reflete sobre o sentimento de não pertencimento. Everything is romantic talvez seja o melhor exemplo dessa exploração, colocando na mesma faixa o contraste de belos arranjos orquestrados com a fritação típica dos beats da PC Music. O clássico e o moderno se encontram em uma composição sobre redescobertas, entregue com uma qualidade de proporção cinematográfica.

Charli sabe muito bem que a pessoalidade é fator determinante para uma obra pop, ainda que isso seja negligenciado por certa parte da indústria fonográfica. Canções como Apple e I think about it all the time mostram um lado inseguro da cantora que contrasta com sua força performática. A britânica reflete sobre seus anseios de ser mãe, o impacto na carreira e a efemeridade do tempo através de uma composição extremamente relacionável e próxima. A catarse máxima da obra talvez fique com Girl so confusing, uma ode às complexidades, fortalezas e diferenças da mulher moderna. Sua versão com a Lorde já configura um dos melhores marcos musicais de sororidade da música recente sem precisar apelar para um discurso piegas ou oportunista.

Em livre tradução, “brat” poderia ser classificado como “atrevida” ou “pirralha”. Entretanto, Charli se apropria da palavra de tal forma que a resignifica completamente, imprimindo uma conotação tão poderosa que, ao se fundir com a internet, parece ter se tornado praticamente um estilo de vida. Ainda que inerentemente reflexo de um nicho, é impressionante um álbum produzir tamanho efeito nas redes em tempos onde conteúdo é tão volátil. Diante de uma era onde a reciclagem musical se faz cada vez mais frequente, Charli comprova que a autenticidade musical ainda pode gerar um impacto absurdo no ouvinte, sem perder rastro do que faz uma música ser essencialmente pop.

Brat
Artista: Charli XCX
País: Inglaterra
Lançamento: 7 de junho
Gravadora: Atlantic
Estilo: Pop, PC Music

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