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Crítica | Better Man – A História de Robbie Williams

O cabaré das cinebiografias musicais.

por Kevin Rick
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Hollywood adora aproveitar o sucesso de certas ondas de gêneros, subgêneros e estilos narrativos que estão em alta. Nos últimos anos, uma das sensações de bilheteria tem sido cinebiografias de músicos e bandas. Obras assim sempre tiveram algum tipo de espaço na mídia, mas agora parece que todo mês uma nova biopic é anunciada e com o excesso de produções, vem a exaustão, a fadiga e a necessidade criativa de procurar novas formas de atrair o público para assistir o mesmo tipo de trama. É pensando nisso que o diretor Michael Gracey, que encabeçou o razoável O Rei do Show, decide trazer um twist para a dramatização da carreira do cantor Robbie Williams: transformar o artista em um chimpanzé antropomórfico com imagens geradas por computador e captura de movimento. A proposta é ousada, maluca e surpreendentemente adequada para a persona extravagante e caótica de Williams. É difícil, porém, não imaginar que estamos assistindo uma versão alternativa de Planeta dos Macacos em que o Caesar é um popstar.

A grande pergunta é: existe algum direcionamento narrativo, artístico e dramático que faça sentido ou é tudo só um chamariz bobo? Bem, minha resposta é que temos um pouco dos dois. Inevitavelmente, a escolha chama atenção, algo que aparenta ser o maior propósito por trás do marketing da produção – que talvez não tenha dado tão certo, já que o filme não foi bem na bilheteria. No entanto, Gracey se aproveita da ideia para se aventurar por caminhos fantasiosos, com uma construção estética cartunesca e cheia de exageros visuais, o que beneficia algumas das set-pieces musicais que transbordam realismo mágico em suas coreografias exuberantes com uso pesado de computação gráfica. O cineasta se permite ser bizarro, ridículo e autoindulgente em longas cenas musicais que são bem divertidas, muitas das quais parecem cenas de ação, como uma insana sequência em que Williams literalmente luta com seus demônios, e outras que beiram o surrealismo, como na cena surpreendentemente bonita do cantor atingindo o fundo do poço em um acidente de carro que tem uma transição soberba para o personagem se afogando.

Outros musicais e outras cinebiografias de artistas flertaram com a fantasia – o recente Rocketman vem à mente -, mas não exatamente da forma que é feita aqui, realmente borrando as linhas de realidade do material, que por vezes até soa satírico, apesar de no final se revelar mais excêntrico do que crítico. Interessante, também, como a escolha pelo macaco encontra correlações dramáticas com a personalidade de Williams, sempre implorando por atenção – o que o torna extremamente antipático, vale ressaltar -, ao mesmo passo que se enxerga como um pária, sendo que a obra não tem receio de pesar a mão na autocrítica e no retrato autêntico do protagonista em todos os seus erros e em seu narcisismo insuportável. Nesse sentido, a narrativa sabe utilizar os hits do cantor como pontes emocionais para determinados pontos do arco do personagem, com destaque para o uso de Angels em um momento comovente da narrativa, mas é perceptível como o texto é artificial, seja na forma que tenta forçar algum tipo de carisma ao protagonista através da vilanificação de quase todos os coadjuvantes próximos do mesmo, seja no uso chatíssimo de narrações expositivas do próprio Williams.

O grande problema de Better Man acaba sendo facilmente suspeito antes mesmo de entrarmos na sala de cinema: por trás de toda a esquisitice, de toda a pompa visual e de toda a ginástica da produção para vender algo diferente, o roteiro é genérico ao ponto da exaustão. Temos o empresário malvado; o uso excessivo de drogas; os constantes problemas com ego e com a fama; e um arco resumido a autoaceitação ao meio de traumas infantis, chegando em um resultado final que soa mais como uma terapia cara para Williams do que necessariamente uma cinebiografia marcante. Além dos temas batidos e familiares, falta na narrativa um coração, uma pessoalidade e uma personalidade que vá além de colocar chamarizes visuais em um conteúdo pobre e básico que serve unicamente para gerar um sentimento esquecível de entretenimento.

Não vou negar, porém: Better Man entretém e tem lampejos de um espetáculo visual muito particular e que surpreendentemente sabe utilizar sua escolha ousada com algum nível de sentido e organicidade narrativa, principalmente quando pensamos na personalidade do biografado e na estética em torno do mesmo. De várias formas, o filme é apropriado para a carreira musical de Williams, cheia de excentricidades e exageros, mais ego do que qualidade artística e gritos por atenção em performances bizarras que razoavelmente divertem, mas que mascaram a falta de substância do seu trabalho musical. Pelo menos Williams, Gracey e a produção como um todo são sinceros sobre essas limitações (sem o macaco e as escolhas visuais do cineasta, nem sei se o projeto sairia do papel), entendendo que o personagem ganha mais pontos por ser atrevido do que por ser original.

Better Man – A História de Robbie Williams (Better Man) — EUA, Austrália, 2024
Direção: Michael Gracey
Roteiro: Simon Gleeson, Oliver Cole, Michael Gracey
Elenco: Robbie Williams, Jonno Davies, Steve Pemberton, Alison Steadman, Kate Mulvany, Damon Herriman, Raechelle Banno, Jake Simmance, Liam Head, Jesse Hyde, Chase Vollenweider, Tom Budge, Leo Harvey-Elledge, Chris Gun, Anthony Hayes, John O’May
Duração: 135 min.

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