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Crítica | Besouro Azul (Com Spoilers)

A aventura do herói latino.

por Felipe Oliveira
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É um pouco irônico – tanto quanto má sorte – que, ao mesmo tempo que a Warner (cheia de promessas) continua investindo no fracassado universo cinematográfico da DC, o momento coincide com o desinteresse do público com os filmes de super-heróis nas telonas. O que pode observar um fluxo interessante nesse cenário: enquanto a Marvel bebe de outras referências como se estivesse evoluindo as batidas recorrentes de sua extensão – a exemplo de Invasão Secreta encorpar elementos de tramas de espionagem -, a DC recorre para uma inocência no que diz respeito à concepção dos seus recentes filmes.

Não que indique um planejamento conceitual, porém, há evidências de que a DC Studios tem seguido um caminho oposto ao da companhia da Disney. Como ilustração, se compararmos o humor trabalhado em Shazam! Fúria dos Deuses com Quantumania, o filme do Capitão Marvel abraçou o ridículo do alter ego infantil do personagem e imprimiu a comédia do besteirol; já no terceiro longa do Homem Formiga, é o mesmo humor autoexplicativo do MCU, com personagens forçando a barra para serem engraçados. Há similaridades no quesito de fazer um filme com aspectos populares, porém, se a resposta do público foi a mesma para tais produções, o otimismo escondido passou a ser visto na recepção para o filme solo do Besouro Azul, o primeiro herói latino da DC.

Para um filme de origem, Blue Beetle é como qualquer outro que você já tenha visto, tanto que o besourinho compartilha semelhanças com a história do Amigo da Vizinhança, contudo, usando das tecnologias de Tony Stark. Concebido em 2006, Jaime Reyes é o terceiro a assumir a armadura do inseto, mas diferente do instrumento de magia que os heróis anteriores experimentaram, o escaravelho fornecia ao jovem latino capacidades alienígenas. Vivido por Xolo Maridueña, das páginas para as telas, é também a primeira vez que um latino protagoniza um longa mainstream de super-herói. O resultado dessa adaptação se revela nas várias intenções do roteiro de Gareth Dunnet-Alcocer de fazer Besouro Azul ser muitas coisas: um cômico coming of age, mas ainda um dramático blockbuster sobre família.

O arco sobre amadurecimento acompanha o protagonista, jovem comum que concluiu recentemente a faculdade e se vê na “responsabilidade” de arranjar um emprego para ajudar nas despesas da família. Isso seria um propulsor dramático interessante, porém, o que impede Blue Beetle de respirar as próprias ideias é por se apoiar mais na fórmula do que no desenvolvimento, e muito desse bloqueio vem da escolha de fazer um filme engraçado. Se tratando do humor, o texto de Dunnet-Alcocer funciona, tanto ao inserir referências que contextualizam com a conquista do filme – isso ao reconhecer a importância do herói mexicano atrapalho Chapolim Colorado – quanto da dinâmica desastrada dos Reyes. Boa parte do timing cômico vem do tio louco Rody, mas que ainda encontra espaço com a irmã sem papa nas línguas de Jaime, e sua avó; como um todo, há uma representação familiar gostosa ao ver um elenco carismático e eficiente, vivendo uma família de energia caótica, amorosa e constrangedora.

Colocando de lado que a comédia estereotipada funciona de maneira orgânica, é nítido como outros elementos foram sendo sacrificados pelo fraco desenvolvimento e como tudo girava mais em torno do humor. Por exemplo, a montagem da cena em que os Reyes perdem a casa e o pai de Jaime sofre um ataque cardíaco ao mesmo tempo que o herói não consegue fazer nada tem um peso dramático diferente do clímax emocional de que a direção de Angel Manuel Soto tenta atingir na cena em que todos se abraçam, na sequência pós comédia-de-ação – o que convence graças ao elenco. São momentos como esse que o filme cai num lugar novelesco e de tom melodramático brega, assim como na cena que Jenny (Bruna Marquezine) confronta a sua tia, a caricata vilã maniqueísta Victoria (Susan Sarandon), o que é semelhante ao primeiro capítulo extraído de uma novela com a protagonista ameaçando “arruinar os planos da tia megera” e em seguida conhecendo o Jaime, que claro, já se apaixonou… ainda que tenha a piada autoconsciente sobre a aproximação de Jaime e Jenny parecer coisa de Maria do Bairro não justifica a falta de inspiração de Manuel Soto em equilibrar o charme da comédia e dar mais seriedade nessas cenas.

A escolha do humor e do recorte familiar é óbvia pois, além da estrutura convencional, são fatores que criam uma ponte relacionável com o público. Nessa ótica, Besouro Azul é apenas mais um filme seguindo os elementos esperados que irão integrar uma produção do tipo, tanto que não há esforço criativo, e sim a aplicação máxima de uma fórmula com resoluções comuns e caricaturas de vilões vividos por atores consagrados. Porém, quando digo que a DC Studios tem seguido um caminho “inocente” nos seus projetos, este parece ser o exemplo que mais causa simpatia porque é um filme que não nega ser totalmente genérico e que abraça isso como seu maior atributo.

Ao contrário de ser um filme com grande impacto em seu discurso ou em adotar uma origem mais sombria pro herói – ainda que tenha um flerte sobre essa possibilidade já que Jaime luta para manter seu caráter intacto enquanto a tecnologia alienígena demonstra inclinações assassinas – Blue Beetle se contenta em remeter a um estilo de aventura clássica da origem do super-herói, a exemplo do primeiro contato de Jaime com a simbiose causando estragos pela cidade, o que não deixa mais uma vez de relembrar Homem-Aranha, mas também, a outras narrativas paralelas do herói descobrindo seus poderes, se apaixonando e salvando o dia. O que, no caso de Jaime, se torna uma batalha pessoal para salvar sua família e espaço.

Embora o filme não seja tão efetivo ao acenar para arcos sobre amadurecimento e autodescoberta – o que se desenvolve entre Jaime e Jenny – Manuel Soto soube entregar cenas empolgantes de ação explorando as possibilidades de tecnologia alienígena, o que entram as escolhas para as cenas noturnas que conseguem ter mais aproveitamento dos efeitos especiais, assim como os detalhes do traje de Raimi. Em outros momentos, a inspiração do diretor remete – tanto na estética e coreografia das lutas – ao estilo oriental tokusatsu, animes e até o jogo RPG Final Fantasy VII como esquecer o conceito da icônica Buster Sword? – com a transformação dos músculos de Raoul Max Trujillo numa grande armadura sendo um bom exemplo visual disso. Ainda que não se tenha uma cena memorável, Soto soube trabalhar o ritmo da ação dentro da trama, o que combina com as referências sugeridas nas movimentações dos personagens e manifestações de suas habilidades.

Com um desencanto do público para os filmes de super-heróis, Besouro Azul encerra o seu pontapé inicial de forma contagiante, fazendo de sua carga genérica um triunfo, como um digno clichê de origem dos anos 2000. Junto da promessa de um retorno, veremos o herói latino ser um dos personagens a encabeçar a difícil missão de James Gunn de tornar a categoria atraente para ser vista nos cinemas e principalmente, injetar criatividade o universo cinematográfico da DC que agora tem muito mais de Jenny, do carisma de Bruna Marquezine para entregar.

Besouro Azul (Blue Beetle) – EUA, 17 de agosto de 2023
Direção: Ángel Manuel Soto
Roteiro: Gareth Dunnet-Alcocer
Elenco: Xolo Maridueña, Bruna Marquezine, Damián Alcázar, George Lopez, Adriana Barraza, Belissa Escobedo, Elpidia Carrillo, Susan Sarandon, Raoul Max Trujillo, Harvey Guillén, Becky G
Duração: 127 min.

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