Com a ambição de revitalizar um personagem da Ala B dos quadrinhos de Mauricio de Sousa, a série animada Astronauta (2024) adapta para o público adulto uma parte do projeto de Danilo Beyruth para o selo Graphic MSP, iniciado em 2012, com Magnetar. A produção tenta alinhar uma estética chamativa ao estilo conceitualmente diplomático e psicológico de ficção científica, mas encontra dificuldades em traduzir sua premissa numa experiência de maior sentido para o público. Desde o primeiro episódio, o espectador se vê imerso em uma explosão constante de cores — brancos etéreos, amarelos solares e vermelhos intensos –, que funcionam como transições de ambiente e como uma assinatura visual agressiva, que, por ser repetitiva, cansa e banaliza a ideia de mudança impactante.
A trama principal, que explora o resgate de astronautas desaparecidos na Lua e a busca pessoal de Pereira/Astronauta por respostas sobre sua abdução alienígena, é prejudicada por uma edição mais frustrante do que cativante. A narrativa recorre a cortes abruptos em momentos de grande expectativa, uma escolha que, se aplicada com cuidado, poderia intensificar o suspense. No entanto, o uso pouco criterioso dilui o impacto da técnica, conectando de forma descuidada alguns eventos paralelos à trama central, que envolve as disputas de poder na agência BRASA e um sombrio enredo sobre uma espécie com intenções sinistras para a Terra. Esse recurso insistente — mais um entre os problemas da série — evidencia um vício estético comum na Maurício de Sousa Produções, já notado e lamentado em Turma da Mônica: Origens, também lançada em 2024.
Apesar de prometer densidade ao explorar questões de identidade, amizade, empatia, memória e sobrevivência, o roteiro aqui se revela desconexo e fragmentado. Fatos como a abdução de Pereira, sua relação com a nave e as interações com seus colegas de trabalho parecem apenas tangenciar algo que demora muito ou nunca se concretiza. Essa superficialidade compromete o lado emocional que a série tenta alcançar, especialmente em momentos que deveriam ser catárticos, pensados para demarcar as relações entre os personagens. Essa decisão de abraçar diversas subtramas, sem expandi-las ou resolvê-las satisfatoriamente, deixou uma quantidade enorme de coisas interessantes de lado para ficar explodindo luz na tela e perdendo tempo com ceninhas de pseudo-terror e enrolação política que não chegam a lugar algum.
Gosto das performances de Marco Pigossi (Pereira/Astronauta), Mel Lisboa (Ritinha) e Francisco Júnior (General), embora elas sejam prejudicadas pelo material limitado e pela questionável mixagem de som, que apresenta uma estrutura desequilibrada, com diálogos excessivamente baixos e trilha sonora exageradamente alta, forçando o espectador a ajustar o volume constantemente — uma experiência frustrante, especialmente em momentos de maior tensão. A dinâmica entre Pereira e seus colegas de missão, que poderia trazer maior tensão e camaradagem à narrativa principal, é desperdiçada em diálogos reticentes e interações que parecem apenas preencher tempo de tela, evocando brigas do passado e outras relações pessoais (especialmente amorosas) que se perdem no meio de um enredo com foco bem mais profundo e genuinamente sci-fi. Para fechar, a ausência de um time forte de exploradores do espaço compromete a criação de um senso de urgência e perigo para todos, algo essencial para uma história de sobrevivência espacial ou similares.
Astronauta combina um visual vibrante — embora exagerado, com muitas explosões de contrastes –, uma direção promissora, mas frequentemente descompassada, e um roteiro que deixa mais perguntas do que respostas, alcançando poucos marcos significativos: o Astronauta finalmente obtém posse plena do traje e da nave, enquanto o restante do drama se perde em situações que não servem de muita coisa. Visualmente, há o que ser elogiado aqui, é verdade. Mas a produção deixa a sensação de que, por trás de toda essa pompa visual e chamativa, o Astronauta ainda está à deriva, aguardando um roteiro que o leve, de fato, a uma boa história.
Astronauta – 1ª Temporada (Brasil, 18 de outubro de 2024)
Criação: Roger Keesse
Direção: Roger Keesse
Roteiro: Roger Keesse
Elenco: Marco Pigossi, Mel Lisboa, Carol Crespo, Julia Ribas, Francisco Júnior, Marco França, Ricardo Sawaya, Nara Kelly, Francisco Freitas
Duração: 6 episódios de 23 min.