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Crítica | Assassino por Acaso (2024)

Finja até ser verdade.

por Felipe Oliveira
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Para quem conhece os trabalhos de Richard Linklater, chegar em Assassino por Acaso pode ser uma quebra de expectativa quase absurda, talvez por esperar algo parecido com The Killer estrelado por Michael Fassbender, visto as histórias dramáticas que já levou para às telonas. Embora o longa, em sua maior parte, seja um thriller misturado a comédia romântica, ainda consegue ser mais uma peça complexa na filmografia do cineasta norte-americano ao ter o desafio de adaptar – vagamente – a intrigante vida dupla do professor e assassino de aluguel Gary Johnsson, vivido aqui por Glen Powell. É interessante observar como Linklater inicia o filme com uma narração em primeira pessoa, trazendo citações a Nietzsche, o que provoca uma análise de personagem, mas ao mesmo tempo, oferece a sua visão ao tão revisitado tema de “matadores de aluguel” visto nas mais variados fitas – até o título original faz uma distinção do conhecido “Hitman: Agente 47″, colocando “Hit Man“. 

Até então, não há muito o que se falar da relação de Linklater e a comédia além Escola de Rock, e Jovens, Loucos e Rebeldes, mas o cineasta retorna ao gênero com uma espécie de sátira aos thrillers metódicos de matadores de aluguel pelo viés do humor. Por um momento, até pensei que a comédia entraria mais como um apelo popular de piadas no meio da ação, mas não é atoa que Linklater é um dos grandes nomes em Hollywood, e o roteiro de Hit Man, ao qual escreveu ao lado de Powell é articulado e ágil para brincar com várias vertentes, o que funciona como uma quebra a estrutura que conhecemos em  filmes do tipo. O uso do tema e de conceitos de psicanálise são apenas meios para como Linklater mergulha na ideia de representações e questionamentos existenciais. Notemos como Gary vai se afastando do perfil simples e pacato como um professor universitário de psicologia e filosofia e sua personalidade passa a se moldar por capricho aos seus contratantes.

Inicialmente, a transição entre várias caracterizações serve em função da comédia, mas também, é como o roteiro articula a subversão do imaginário que o cinema traz sobre matadores de aluguel, justamente por não se manter como um thriller – e é ótimo que só nesses trechos que o filme flerta com o noir, pela maneira que Powell encarna suas múltiplas facetas. Aliás, tê-lo no papel principal é interessante por ele estar rapidamente saindo do arquétipo de galã maromba de Hollywood para um lugar de carisma e mais protagonismo; e só aqui a sua performance canaliza as propostas do roteiro, não vai demorar vê os estúdio apostando em filmes originais e remakes para o novo astro em ascensão. E assim como as mudanças de figuras, Hit Man vai alternando entre gêneros seguindo uma estrutura que sempre mantém a trama empolgante pelo caminho seguindo. A preocupação não está em propor reviravoltas e sim nas resoluções simples que vai trazendo, mas ainda sim inteligentes, o que provam o controle de Powell e Linklater como roteiristas. Uma boa ilustração são nos minutos finais que tendem a soar quase que previsíveis, porém, a sacada está na agilidade do texto em ser urgente sem apelar para escolhas mirabolantes.

Enquanto o roteiro trata o tema pelo viés da comédia, vai também descontruindo ao transitar por outros gêneros. Fica nítido que, com a entrada de Adria Arjona, o filme se inclina para um lado mais sensual e romântico, e assim como Gary incorpora as personas que adota, o telespectador embarca na química que Powell e Arjona possuem em cena, podendo esquecer, mesmo que por um momento, que a história ainda é sobre um dos matadores mais procurados de Nova Orleans. Tudo isso serve como uma desconstrução ao universo calculado que o cinema apresentou sobre um assassino contratado, propondo aqui que nessa comédia da vida real, o papel pode ser bem diferente e que a métrica moral pode ser testada de outras formas.

Quem diria que, além do longa transitar sob alguns gêneros apresentaria seu personagem quase como um anti-herói, surgindo de alguém comum – um professor de aparência desleixada, que dirige um Honda Civic e possui gatos – que logo surpreende ao agir tão bem na pele de um assassino de aluguel – e não é à toa que ao se apaixonar e mudar de visual passar a ser visto como alguém mais atraente – que parecia ser parte da liberdade criativa do roteiro, mas que até o final prova realmente ter sido baseado em alguém real que foi tema de um artigo. No final das contas, Hit Man é a história de um matador, mas contada por uma ótica menos noir, e por vezes quente e açucarada que o convencional.

Assassino por Acaso (Hit Man – EUA, 2024)
Direção: Richard Linklater
Roteiro: Richard Linklater, Glen Powell
Elenco: Glen Powell, Adria Arjona, Austin Amelio, Retta, Sanjay Rao, Molly Bernard, Evan Holtzman, Gralen Bryant Banks
Duração: 115 min.

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