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Crítica | As Pontes de Madison

por Rodrigo Pereira
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Nós sempre ouvimos falar sobre a importância dos detalhes. Eles possuem tanto o poder da ressignificação como do engrandecimento. Nos filmes, por exemplo, um detalhe não percebido em um primeiro instante pode acrescentar, em uma revisita, valor para uma personagem, uma cena ou até mesmo para a obra como um todo. Da mesma forma que seu conjunto é capaz de trazer um sentido diferente do que o inicialmente pensado. Clint Eastwood, com sua imensurável sensibilidade, compreende isso muito bem e usa dos detalhes como seu principal trunfo em As Pontes de Madison.

A trama gira em torno de Francesca Johnson (Meryl Streep), uma típica dona de casa estadunidense da década de 1960, mãe de dois adolescentes de 16 e 17 anos e casada com seu esposo Richard (Jim Haynie) há tanto tempo que precisa calcular nos dedos desde quando está nesta relação. Ela ficará quatro dias sozinha em seu lar, pois o resto da família participará de uma competição estadual de novilhos. É quando o fotógrafo da revista National Geographic, Robert Kincaid (Clint Eastwood) entra na história. Ele vai até o condado de Madison para fotografar as famosas pontes cobertas da região e estaciona na residência de Francesca para pedir orientações.

Desde o primeiro contato dos dois é visível a mudança no comportamento da dona de casa. Se até então havia demonstrado uma quietude muito grande, resultado de um ambiente familiar composto por relações mais frias, ela quase não consegue disfarçar o entusiasmo ao conversar com Robert, fruto tanto do fato novo em sua rotina que a visita dele representa quanto pelo recém despertado interesse nele. Ela aceitar, de forma quase instantânea, levá-lo até o local desejado é mais uma prova disso. Assim como a magistral atuação de Meryl Streep, com ênfase nos olhares curiosos, sorrisos envergonhados e gestos nervosos, concebendo uma personagem carregada daquela inocência de quem se apaixona pela primeira vez.

Após finalizar seu trabalho, Robert leva Francesca de volta para casa e é convidado a entrar para tomar um chá gelado. É aqui que os detalhes, que já marcavam importante presença desde o início da projeção, começam a ter um significado cada vez maior. A forma suave como Robert fecha a porta da cozinha, contrária à agressiva batida do marido e do filho que tanto incomodam Francesca. A insistente boa vontade dele em ajudá-la nas tarefas, algo que se acostumou a fazer individualmente. As longas conversas sobre os mais diversos assuntos e temas, absolutamente contrário ao silêncio de seu cotidiano (lembremos da cena do almoço familiar no início do filme). Francesca arrumando o colarinho de Robert, um gesto que demarca intimidade e afeto, originando, em seguida, o primeiro contato físico intenso entre ambos.

Todos esses detalhes começam a criar um ambiente único entre os dois, quase como um sonho ou um universo particular, algo muito bem pensado pelo diretor. Isso porque acompanhamos essa inesperada história de amor através das lentes das versões adultas de Caroline (Annie Corley) e Michael (Victor Slezak), os filhos de Francesca, que têm contato com os relatos deixados por sua recém falecida mãe em livros, onde ela confessa todos os detalhes daqueles dias. Toda vez que entramos na história de amor proibido de Francesca e Robert, é como se fôssemos transportados para um conto de fadas, um mundo onde nada além do desenrolar do relacionamento importa.

Conforme avançamos no filme vemos a influência que aquelas descobertas vão causando em Caroline e Michael. Com uma criação conservadora típica do interior estadunidense, os dois apresentam certa resistência e incredulidade com os fatos narrados (ele, principalmente), mas, aos poucos, compreendem os motivos de sua mãe e começam a ver reflexos em suas próprias vidas. Ela, uma pessoa muito ponderada, casada há muito anos e infeliz, uma situação semelhante à sua genitora; ele, um cristão fervoroso, vendo seu casamento muito próximo do fim, ainda que ame sua esposa, e suas crenças, religiosas ou não, cada vez mais questionadas. A maneira que Eastwood coloca esses acontecimentos permite enxergar a beleza do zelo materno mesmo após o final da passagem de Francesca pelo plano material. Assim como fez em vida, abdicando de sua própria felicidade pela família que, apesar de tudo, amava imensamente, ela continuava a cuidar dos seus mesmo fisicamente ausente.

O que nos leva de volta ao universo particular dela e de Robert. Já no final da obra, onde a famosa cena de Clint Eastwood na chuva se faz presente, temos a despedida, de fato, do casal impossível. Ela, ofegante na carona do carro com seu esposo, completamente dividida sobre o que fazer; ele, parado com sua camionete em frente aos dois no semáforo, coloca a corrente que ganhou dela no espelho retrovisor interno e espera, marcando o poder dos detalhes na película outra vez.

Ao escolher pela permanência, Francesca opta em garantir que sua família, principalmente seus filhos, sejam o mais feliz possível, mesmo que isso signifique abrir mão do amor de sua vida. Seu pedido final é ter suas cinzas jogadas na ponte que levou Robert tantas décadas atrás, onde as dele também estão. Seus filhos já estão convencidos. O casal pode, enfim, ficar junto.

As Pontes de Madison (The Bridges of Madison County) – EUA, 1995 
Direção: Clint Eastwood
Roteiro: Richard LaGravenese, Robert James Waller
Elenco: Meryl Streep, Clint Eastwood, Annie Corley, Victor Slezak, Jim Haynie, Sarah Kathryn Schmitt, Christopher Koon, Phyllis Lyons, Debra Monk, Richard Lage, Michelle Benes, Alison Wiegert
Duração: 135 min.

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