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Crítica | Armadilha (2024)

Inimigo da sociedade.

por Felipe Oliveira
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Considerado o pai do suspense e das reviravoltas, para cada novo trabalho de M. Night Shyamalan, a fama para que o foi O Sexto Sentido reflete nas expectativas do público e crítica, enquanto que o cineasta insiste em ser resiliente e defender sua forma de contar histórias – até sua única trilogia (Corpo Fechado, Fragmentado e Vidro) é distinta por ter focado na particularidade dos personagens e seus universos. Depois dos últimos filmes lançados sob acordo com a Universal Pictures, Shyamalan provoca uma experiência diferente em Armadilha, thriller que se passa durante o show de um artista pop. Mesmo com a pressão, Shyamalan é feliz em articular uma lógica própria para seus filmes, ainda mais sabendo que o resultado não vai ser diferente do que tem sido: mantendo a parcela fiel de quem enxerga seu cinema como autoral e atraindo o hate da geração manjada em reviravoltas.

Embora a premissa de Trap não tenha sido disfarçada na divulgação – isto é, um serial killer que cai numa arapuca ao levar sua filha ao show de sua ídolo favorita –  a armadilha apontada no título se torna notória pela forma escrachada que Shyamalan inicia o filme. Se a expectativa fez imaginar uma dança de gato e rato no nível Tom Cruise e Hayley Atwell em Missão: Impossível 7 – Acerto de Contas: Parte Um enquanto se sabotavam e fugiam das autoridades num aeroporto, o que o diretor indiano faz é tratar as tentativas de fuga do assassino procurado com um cinismo ridículo, um pastelão que não tem vergonha de se assumir. Encontrar um suspense para chamar de clássico é apenas a isca que a audiência espera morder, mas se quiser, Shyamalan faz do thriller uma comédia com toques sobrenaturais e tiradas descabidas que só elevam a performance de Josh Hartnett.

É interessante como Shyamalan é direto ao deixar claro a dicotomia que há no personagem de Hartnett: de um lado, um pai cuidadoso que está realizando o desejo de sua filha em ir a um show, do outro, um psicopata. Essa dualidade, de um homem de família e um criminoso caçado, se choca ao se ver numa emboscada, e essa é a parte divertida de Armadilha. Explorar as possibilidades em um espaço limitado é algo frequente na filmografia do cineasta indiano, e é através da olhadas de Cooper para a câmera – o que entra a fotografia de Sayombhu Mukdeeprom – que a audiência é envolvida na claustrofobia por ter duas figuras – o procurado e a polícia – tendo que agir discretamente em um estádio cercado por mais de vinte mil pessoas. Ao contrário de usar o realismo da situação e explorar os absurdos disso, Shyamalan insere um humor sádico que aproveita várias nuances de Hartnett em cenários isolados, ao brincar com a tensão e as alternativas que tenta encontrar para fuga.

A experiência prometida no conceito sobre um serial killer que tem um show como cenário é cumprida, mas também se faz um meio de Shyamalan trazer o tema recorrente em seus filmes. Enquanto os recentes Tempo e Batem à Porta refletiam os temores do cineasta sobre sua família, em Trap, traduz o pavor íntimo de ser o cara que põe seus entes em perigo. Essa reflexão é nítida do terço final, quando a produção assume um tom de urgência e perigo que não era sentida com a mesma intensidade nas cenas do show. Claramente Shyamalan se diverte ao jogar em diferentes nuances, mas é na dualidade de Cooper que se encontra o coração do filme, ao refletir uma paternidade fajuta que aos poucos revela a psicopatia que camufla frente à responsabilidade.

Mesmo com a atuação de Harnett sendo tão precisa, o tom do filme sempre soa caricato, como se não quisesse levar a própria premissa a sério. É mais um filme de Shyamalan, mas também em um nível estranho, que se sustenta mais pelo nome principal do elenco do que as ideias que deixa na linha da sugestão – como a chefe da operação, liderando a polícia incompetente. A tensão do momento é logo quebrada pelos excessos e as obviedades das escolhas. A exemplo da cena que a artista pop toca piano, o que ao mesmo tempo é um artifício genérico para o gênero, mas que em Armadilha se mostra ridículo – o que é aceitável dentro da proposta do pai do suspense em oferecer, conscientemente, essa experiência para o público.

Armadilha (Trap – EUA, 2024)
Direção: M. Night Shyamalan
Roteiro: M. Night Shyamalan
Elenco: Josh Hartnett, Ariel Donoghue, Saleka Shyamalan, Alison Phill, Hayley Mills, Mark Bacolcol, Jonathan Langdon, Marnie McPhail, Kid Cudi
Duração: 105 min.

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