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Crítica | Aliens: Bishop, de T.R. Napper

O retorno do sintético mais querido da franquia Alien.

por Ritter Fan
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  • spoilers apenas dos filmes Aliens, O Resgate e Alien 3, não do livro. Leiam, aqui, as críticas de todo o nosso material da franquia Alien.

É possível listar uma infinidade de problemas na franquia Alien depois do segundo longa, mas uma coisa é impressionantemente consistente em todos os filmes: a qualidade dos personagens sintéticos. Seja o assustador Ash, o empático Bishop, a misteriosa Call, o estoico e, depois, genocida David, o eficiente Walter ou o terno Andy, todos tiveram seus momentos e acrescentaram muito aos filmes em que apareceram. Bishop, vivido por Lance Henriksen em Aliens, o Resgate e Alien 3, é, provavelmente, um dos mais memoráveis de todos por subverter as expectativas que os espectadores tinham sobre androides com base no Ash de Ian Holm em Alien, o Oitavo Passageiro e, também, de certa maneira, por servir de semente para a ideia de transformar o T-800 de vilão em herói entre O Exterminador do Futuro e O Exterminador do Futuro 2: O Julgamento Final.

É por isso que, quando descobri sobre a existência do romance Aliens: Bishop, pelo autor australiano T.R. Napper, não tive dúvidas em conferi-lo, mesmo não sendo o maior consumidor de spin-offs literários de séries cinematográficas. Melhor ainda, trata-se de uma obra que bebe generosamente dos dois filmes em que o personagem apareceu e que oferece uma continuação deles, inclusive com a presença constante e importante de ninguém menos do que Michael Bishop, o humano que criou o androide à sua semelhança e nome e que dá as caras no final de Alien 3 para tentar persuadir Ripley de deixar que o embrião da rainha Alien seja extraído de seu corpo, o que reitera o caráter de sequência da obra e permite que conheçamos mais do criador de Bishop e de suas intenções com os xenomorfos que, no livro, não mais trabalha para a Weyland-Yutani.

Mas Napper não se limita a Bishop e nem mesmo aos xenomorfos. Aliás, para fins de assentamento de expectativas, é importante afirmar, logo de início, que os alienígenas com sangue ácido, apesar de presentes, são usados no pano de fundo apenas, com duas grandes sequências apenas com eles, uma aterrorizante e até macabra e a outra mais voltada à ação e pancadaria. O que quero dizer com isso é que o autor procura dar voz a diversos personagens em ambientes consideravelmente estanques, sem que um efetivamente se comunique com o outro na maior parte do tempo, ainda que, naturalmente, tudo convirja para um final movimentado que fecha as pontas da narrativa central, mas que, como é padrão hoje em dia – e, tenho certeza, exigência contratual -, deixa abertura para eventual continuação.

Dessa forma, temos os seguintes núcleos: (1) o de Bishop, que inclui o sintético em um corpo igual, mas mais poderoso e com uma mente ainda mais eficiente, Michael Bishop, seu criador que tenta obter informações de sua criação sobre os xenomorfos guardadas em local inacessível de sua programação e dois sintéticos que são conectados entre si para mais eficiência e que funcionam como guarda-costas de Michael; (2) o dos soldados coloniais, com foco no Capitão Marcel Apone, irmão mais novo do sargento Alexander Apone, vivido por Al Matthews no segundo filme, que lidera um pelotão em uma missão não sancionada por seus superiores para recuperar Bishop, na base de que “nenhum homem será deixado para trás” e em Kari, uma jovem soldada de origem australiana que somente se alistou para ter a chance de tirar sua família de um campo de refugiados e (3) o dos vietnamitas e chineses, o primeiro grupo formado de contrabandistas representados e o segundo por soldados em uma missão terrível. Napper não se faz de rogado e, no melhor estilo George R.R. Martin (eu poderia dizer, na verdade, melhor ainda do que Martin, mas não quero criar polêmicas…), pula de ponto de vista em ponto de vista sem o menor pudor, por meio de capítulos curtos que conseguem criar uma excelente visão do que está acontecendo, ao mesmo tempo em que mantém a tensão quando necessário, mesmo quando o leitor basicamente sabe o que acontecerá em seguida.

Mas, talvez até naturalmente, Napper escreve como se estivesse escrevendo o roteiro de um filme, mantendo tudo na superfície, sem maiores detalhamentos dos personagens, talvez com exceção de Kari que ganha um passado lacrimoso em uma Austrália subjugada por uma tirania que ceifa a vida de seu pai. Digo “naturalmente”, pois essa forma de escrever tem sido cada vez mais comum, em um mundo em que um número significativo de obras literárias nascem justamente na esperança de que elas sejam “descobertas” por produtores desejos de adaptá-las como filmes ou séries em um mercado audiovisual cada vez mais voraz. E isso é particularmente verdade em casos como este aqui, em que Napper escreve sobre uma propriedade preexistente. A boa notícia é que o autor já tem uma carreira como escritor de obras próprias e ele sabe impor seu estilo e seu ritmo, ainda que, no frigir dos ovos, o que ele escreve permanece naquele nível bem confortável de leitura, sem exigir maiores esforços do leitor.

Tenho reticências quando as linhas narrativas finalmente convergem, pois, a partir desse ponto, tudo passa a ser uma correria enorme que quebra um pouco a imersão que vinha sendo construída compassadamente nos capítulos anteriores. Há, diria, um desequilíbrio de desenvolvimento, com muito espaço dedicado à construção dos novos personagens e das sequências de ação pré-convergência, o que eu acho ótimo, mas espaço de menos dedicado justamente ao momento em que tudo o que foi visto antes passa a ser uma história só. É quase como se Napper tivesse entregue uma versão mais longa ao seu editor que, então, sugeriu (exigiu, na verdade), uma redução grande no número de páginas, o que levou o autor a escolher cortar mais no terço final. Fica aquela sensação de que faltou calma, faltou um real aproveitamento do material que o autor tinha em mãos.

Mesmo assim, Aliens: Bishop é uma leitura prazerosa e consideravelmente rápida, por ser difícil de parar. Mais uma vez, os sintéticos da franquia Alien não desapontam e Bishop ganha uma bem-vinda – e perfeitamente lógica – sobrevida nesse fascinante universo. Será que um dia o personagem retornará às telonas mesmo considerando que Henriksen já é um senhor de idade? Eu sei que eu gostaria de vê-lo retornar a esse papel, mesmo que com ajuda de CGI, o o romance de T.R. Napper é inegavelmente uma boa maneira de trabalhar o sintético!

Aliens: Bishop (Idem – EUA, 2023)
Autoria: T.R. Napper
Editora: Titan Books
Data original de publicação: 05 de dezembro de 2023
Páginas: 496

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