Home FilmesCríticas Crítica | Algo-Rhythm (2020)

Crítica | Algo-Rhythm (2020)

por Michel Gutwilen
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A partir de seu próprio título, percebe-se que a essência de AlgoRhythm reside numa ressignificação do termo “algoritmo” a partir de uma dialética entre esses dois novos termos que emergem a partir de sua separação: “algo” e “rhytmin”. Da primeira, um prefixo grego que remete a dor. Já o segundo, obviamente, fala de ritmo. A diretora Manu Luksch primeiro destrói o significante (a palavra tangível “algoritmo”), para depois acrescentar um significado (ideia) associado a este mesmo vocábulo. É a partir deste choque que se encontra este curta-metragem. 

Então, neste filme, “algoritmo” significará tanto o seu uso comum e moderno, no que se refere a um um modelo computacional que molda gostos e cria bolhas no mundo virtual, quanto também um ritmo (fluxo) gerado a partir da dor (deformação) da própria imagem. De outro modo, curiosamente, essa nova palavra que surge, “algo”, também se encaixaria no nosso significado em português, proveniente do latim, para se referir àquilo que não é determinado. O texto a seguir se baseará, portanto, numa leitura fílmica a partir de todas essas ideias. 

Não só em seu título, mas a dialética aparece na própria classificação genérica desta obra, que coexiste numa linha muito tênue entre um (longo) clipe musical e um (curto) filme cinematográfico. Retomando a ideia anterior, Algo-Rhythm não é algo exatamente definido, pois há uma quebra das fronteiras, indo de encontro a esta própria ideia de uma colisão entre  mundo real e virtual (que será falado adiante). 

Agora, há de se pensar na escolha do rap como integrante da própria narrativa desta obra. Como música, o hip hop contemporâneo é um dos gêneros musicais que mais se adequa numa concepção de sociedade ultra moderna, com suas palavras proferidas em um ritmo fora do normal que se adequa a ultra velocidade a partir dos fluxos de informação e pessoas, sendo o veículo perfeito para complementar a grande ideia do filme. Dito isso, o hip hop também não deixa de habitar uma zona cinzenta entre o falado e o cantado, sendo mais uma escolha que reforça a atmosfera híbrida da obra. 

De outro modo, há ainda o hip hop como ferramenta política. Em outros projetos como Ponto Cego e Street Flow, a narrativa de tom realista é interrompida por um protagonista negro que, diante da câmera, usa a música como forma de denúncia. Assim como Algo-Rhythm, são dois filmes sobre a luta contra a homogeneidade do sistema, sendo o rap é justamente um estilo cujo conteúdo está marcado por palavras de resistência, além de ser cantado por muitas pessoas periféricas e negras, que são marginalizados e prejudicados. 

Dentro do filme de Luksch, pode-se pensar em sua aplicação tanto numa contraposição tanto do negro contra o algoritmo (que obviamente privilegia o branco), mas como também do próprio indivíduo humano contra um sistema padronizado, uma vez que está na essência do rap a criatividade e a improvisação, palavras que não fazem parte de um dicionário computadorizado. Logo, será a partir do sonoro que Luksch estabelecerá o ritmo de sua montagem, ao mesmo tempo em que as imagens também estão em constante fluxo (seja a partir de movimento de câmera ou do próprio objeto móvel). 

Indo de encontro agora uma percepção imagética de Algo-Rhythm, se a questão do “ritmo” já foi analisada em parágrafos anteriores, pensemos no uso do “algo” e sua polissemia apresentada. O uso de de efeitos especiais trabalha com uma deformação do real, transformando o corpo e o espaço em um estado indefinido de matéria, saindo do sólido para uma espécie de presença fantasmagórica e híbrida entre o tangível e o intangível. Trata-se aqui de uma óbvia colisão entre o mundo real e o virtual, que dá lugar a este 3º mundo feito de bugs e glitches. No mesmo sentido, a diretora muitas vezes decupa uma cena a partir de close-ups que evidenciam essa dialética entre o ser humano, em 1º plano, e o mundo virtual, no fundo da tela.  

Aliás, para um filme feito totalmente na base da dialética — a narrativa em formato de debate político não poderia deixar mais claro —, não deixa de ser curioso constatar que ele é uma co-produção entre Áustria, Reino Unido e Senegal, assim sendo, entre o primeiro e o terceiro mundo; sendo também feito por uma diretora branca para falar sobre representatividade negra. Ou seja, Algo-Rhythm é literalmente sobre choques e aquilo que surge a partir deles. 

Algo-Rhythm — Senegal, Áustria, Reino Unido, 2020
Direção: Manu Luksch
Roteiro: Manu Luksch, Mukul Patel
Elenco: Gunman Xuman, Lady Zee, MC Mo
Duração: 13 min.

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