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Crítica | Abraço de Mãe

O horror cósmico das enchentes cariocas.

por Roberto Honorato
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Mesmo o cinema brasileiro sendo rico em todo tipo de narrativa, o cinema de gênero nem sempre é tão reconhecido quanto algo mais prestigioso, como o drama, o que não é específico do nosso cinema, mas por aqui temos uma frequência menor de obras que são assumidamente ficção científica, fantasia ou horror. Diretores como Adirley Queirós e Juliana Rojas têm feito excelentes trabalhos explorando temas diversos em narrativas mais específicas, como distopias, viagem no tempo, histórias de monstro e todo tipo de ideia criativa que você possa imaginar. Com Abraço de Mãe, o diretor argentino Cristian Ponce traz o horror cósmico para o ambiente do Rio de Janeiro. 

Com direção argentina e uma produção brasileira, Abraço de Mãe usa e abusa de tropos do horror sobrenatural para contar uma história sobre luto e aceitação protagonizada por Ana (Marjorie Estiano), uma bombeira que recebe o chamado para investigar uma casa de repouso com sérios danos estruturais e está prestes a desabar por conta de uma forte enchente. Para evitar que a residência colapse em cima dos residentes, Ana e sua equipe precisam evacuar o local, mas as pessoas não parecem interessadas em colaborar e eventos misteriosos complicam a missão da equipe de bombeiros, tudo isso enquanto Ana lida com traumas do passado que decidiram surgir na pior hora possível.

Infelizmente, o Rio de Janeiro tem um longo histórico de fortes enchentes que marcaram a história do estado. Abraço de Mãe é ambientado durante a enchente de 1996, que atingiu principalmente o bairro de Jacarepaguá, deixando pelo menos cinquenta vítimas soterradas, quase dois mil desabrigados e até uma epidemia de leptospirose. Esse pano de fundo ambienta a história de um jeito que funciona bem para construir aos poucos o aspecto do horror, ligado diretamente ao desastre ambiental; sem contar o drama da protagonista, que enfrenta seus próprios demônios do passado nesse cenário que a aprisiona por conta da chuva que a impede de sair e o mistério que faz com que seus colegas de trabalho precisem de sua ajuda.

O texto do longa não chega a ser tão interessante quanto a direção de Ponce e a excelente performance de Marjorie Estiano, que mais uma vez mostra ter enorme presença e passa mais complexidade através de sua atuação que mescla uma atitude de liderança naquele ambiente absurdo com a fragilidade do drama interno da protagonista, algo que o enredo está constantemente tentando te lembrar através de flashbacks e segmentos de alucinação que até são bem-vindos em uma trama de horror psicológico como essa, mas aqui são repetidos ao ponto de exaustão, tirando um pouco do peso de algumas cenas em que a intensidade da atuação de Estiano em interação com o lugar é interrompido pela materialização do trauma passado da protagonista, como um lembrete inconveniente de algo que já estava mais do que claro, porém o filme não parece confiar no espectador para lembrar do que é basicamente a principal característica da protagonista.

Mesmo com esse incômodo e alguns momentos em que o filme se apoia demais em tropos ao ponto de ser previsível e não apenas referência, a direção de Ponce também ajuda a manter a atenção do espectador com a construção de uma atmosfera assustadora e um sentimento de eterna claustrofobia, ainda que a casa de abrigo pareça quase labiríntica com a quantidade de corredores e cômodos com personagens misteriosos que criam seu próprio microcosmo. Abraço de Mãe está repleto de símbolos e os aproveita bem, ainda que os tropos de gênero, por mais interessante que sejam, distraem ou tornam a experiência um pouco menos divertida de assistir.

Abraço de Mãe – Brasil, 2024
Direção: Cristian Ponce
Roteiro: Gabriela Capello, André Pereira, Cristian Ponce
Elenco: Marjorie Estiano, Pablo Guisa Koestinger, Javier Drolas, Thelmo Fernandes, Reynaldo Machado, Chandelly Braz, Val Perré
Duração: 90 min.

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