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Crítica | A Parasita, de Arthur Conan Doyle

Um conto extenso sobre as tensões do vampirismo psíquico.

por Leonardo Campos
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Na seara do vampirismo, não são apenas os monstros com dentes afiados que sugam as energias vitais de suas vítimas. Drácula, de Bram Stoker, é um dos exemplos definidores da mitologia destas criaturas da noite, precedido pelo vampiro de John William Polidori e pela sedutora vampira de Sheridan Le Fanu.  Há, no entanto, e podemos considerar uma boa base de estudos e entendimento, a coletânea Herdeiros de Drácula, organizada por Richard Dalby, um painel extenso de outros seres malignos que colocam em xeque a vitalidade alheia. Phil Robinson traz isso no assustador A Árvore Assassina, um digno exemplar do subgênero horror ecológico sobre uma planta aniquiladora de qualquer coisa que passe por perto de seu território e Arthur Conan Doyle, em A Parasita, reflete as tensões de personagens diante do vampirismo psíquico. Médico e escritor britânico, o autor insere em sua narrativa a ação dos depredadores de energia, um tópico temático debatido sem base científica, debatido no campo do ocultismo na época e, ainda nos dias de hoje, em determinados segmentos religiosos.

No conto, ceticismo e ocultismo entram em conflito para estabelecer um longo fio de incertezas e reviravoltas na trajetória de Arthur Gilroy.  Relações entre a matéria e a mente deixam dúvidas para aqueles que se dizem céticos, isto é, voltados exclusivamente para o lado científico das coisas, como é o caso do protagonista, personagem que lembra bastante Jonathan Harker, de Drácula, haja vista as mesmas características e posicionamento na narrativa. Estudante de fisiologia e um investigador nato das coisas que gravitam em torno de sua existência, Gilroy é apresentado à esposa de um professor que pesquisa obsessivamente o ocultismo. Segundo o docente, ela possui poderes psíquicos, sendo capaz de entrar na mente das pessoas, limar as suas energias ou, até mesmo, guiar as suas ações, que podem ser boas ou más.

Noivo de Agatha, o contido Gilroy começa a ser desafiado depois que a tal mulher, alvo de sua análise durante vários momentos do conto, inicia um processo para demonstrar o seu potencial vampírico, em perspectiva psíquica, tendo em vista não apenas mostrar que o cientista está errado em suas convicções, mas também agir para desestabilizar os cenários pelo qual todos os personagens de destaque aparecem. O ponto principal da ação é a noiva do pesquisador, moça que começa a se comportar de forma estranha, distante, como se também repelisse o companheiro, seu futuro esposo. A vampira, logo mais, começa o seu processo de ampliação de poder, sugando a vitalidade do protagonista, o colocando numa situação bastante complicada. Ele batalha com todas as forças, promete vingança e uma guerra é travada ao longo do conto, com resultados surpreendentes. Entre transes hipnóticos, o melhor e o pior de Gilroy vêm à tona.

Com poder se entrar no sistema alheio para controlar as suas vítimas, esta misteriosa mulher derruba as teses do protagonista e estabelece o sobrenatural diante do científico. É uma abordagem interessante para pensar o contexto histórico e social do século XIX, uma era de muitas novidades e incertezas, de mudanças vertiginosas, ressoantes na literatura, pois muitos textos do período refletiam os impactos dos estudos científicos na sociedade por meio da ficção. Nesta trama, Arthur Conan Doyle, autor curiosamente entrevistado numa ocasião por Bram Stoker, além de ter sido um assíduo frequentador do teatro de Henry Irving, gerenciado pelo escritor irlandês, traz para o texto a ação dos vampiros psíquicos, conhecidos por alimentar-se da energia alheia, num conto interessante que permite diálogos com a teoria da Sombra, parte da psicanálise de Carl Jung. Não podemos afirmar, mas se Stoker manteve contato com Doyle fora do âmbito de sua escrita, por qual motivo não teria se inspirado em algum aspecto do conto para desenvolver o conde definidor da mitologia vampírica.

Algo para nos questionarmos e, claro, compararmos.

A Parasita (The Parasite – Reino Unido, 1894)
Autor: Arthur Conan Doyle
Editora: Harper Collins Brasil
Tradução: Mariana Kohnert, Flora Pinheiro
Páginas: 37

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