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Crítica | A Odisseia de Asterix

por Ritter Fan
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Depois de errar feio com O Grande Fosso, seu primeiro roteiro para a série de álbuns de Asterix, Albert Uderzo parece que teve tempo de reorganizar seus pensamentos e, com isso, entrar mais no espírito de seu parceiro de longa data René Goscinny, que falecera ainda muito novo em 1977. A Odisseia de Asterix, o 26º álbum canônico dos irredutíveis gauleses, primeiro a sair pela Les Éditions Albert René, editora criada por Uderzo para esse fim e o segundo integralmente feito por Uderzo, apesar de não chegar ao nível dos melhores trabalhos de Goscinny – o que, convenhamos, não é uma tarefa das mais fáceis – cumpre sua tarefa de entregar satisfatoriamente uma divertida aventura.

Usando uma estrutura infalível de “agente do caos enviado por Roma” testada por Goscinny em A Cizânia, O Domínio dos Deuses e Obelix & Companhia, a história de Uderzo tem como gatilho Júlio César e sua sana de dominação total na Gália que acaba levando-o a mandar o druida-espião ZeroZeroSix para descobrir a fórmula da poção mágica de Panoramix. No entanto, o personagem que, como não poderia deixar de ser, tem a fisionomia de Sean Connery e faz uso dos mais variados gadgets, inclusive uma maleta que se transforma em uma biga cheia de apetrechos, chega em uma hora em que Panoramix está desesperado atrás de “óleo de rocha” (petróleo), componente essencial de sua poção que o mercador fenício Epidemicus (que havia sido introduzido em Asterix Gladiador) esqueceu-se de trazer para ele. O resultado é óbvio: Asterix, Obelix e Ideiafix, acompanhados pelo traiçoeiro ZeroZeroSix, partem para a Mesopotâmia no navio fenício para achar “óleo de rocha”.

Como o druida-espião tem uma mosca treinada – e que é apaixonada por ele – a seu dispor, ele manda uma mensagem para Roma de forma que as legiões possam impedir que os gauleses completem a viagem, começando, então, a odisseia do título que inclui a destruição de um sem-número de navios romanos (mas não dos piratas!) e uma passeio pelo Oriente Médio com encontros com Josué (ou um Josué…), lamentações em um muro, pernoites em uma certa manjedoura em Belém, “mergulho” no Mar Morto, travessias no deserto, encontros com os vários povos da região que guerreiam entre si, descoberta de petróleo (e o primeiro derramamento dele no mar…) e mais uma infinidade de momentos divertidos que reúnem diversos momentos históricos diferentes em uma narrativa só que funciona substancialmente bem.

É óbvio que falta o refinamento de Goscinny nas piadas e nas referências, que Uderzo tende a tornar óbvias e didáticas, mas a narrativa é variada, tem boa lógica interna e faz bom uso dos personagens coadjuvantes, inclusive com uma das raras vezes em que vemos Asterix e Obelix usarem roupas diferentes das tradicionais, ao se disfarçarem de hebreus. O maior problema em termos de roteiro, por incrível que pareça, é a mosca treinada que ZeroZeroSix usa para mandar suas mensagens. Ela simplesmente não funciona e, incrivelmente, o texto dedica enorme tempo ao inseto de diversas maneiras diferentes, inclusive com uma “greve” que parece cair de paraquedas. Além disso, ainda que ZeroZeroSix cumpra bem sua função até metade da história, sua presença não exerce mais função alguma na narrativa depois que Obelix o esmurra no futuro Muro das Lamentações e a dupla automaticamente deduz que ele é mesmo um espião sem que haja elementos concretos para isso.

Outro elemento que Uderzo corrigem em relação ao álbum anterior é a arte. O desleixo aparente de O Grande Fosso desaparece por completo aqui e o artista volta à forma total, com belíssimas recriações de Tiro (hoje no Líbano) e Jerusalém (hoje em Israel), além de batalhas navais detalhadas, com traços cuidadosos que oferecem aquela riqueza que aprendemos a esperar dele.

A Odisseia de Asterix é uma obra que permite que leitores da série respirem mais tranquilos, vendo que Uderzo, mesmo que ainda longe da qualidade dos textos de Goscinny, consegue entregar uma obra digna dos mais queridos gauleses da Nona Arte. É sem dúvida um álbum com problemas, mas é sem dúvida também um álbum que caminha na direção certa.

A Odisseia de Asterix (L’Odyssée d’Astérix, França – 1981)
Roteiro: Albert Uderzo (baseado em criação de René Goscinny e Albert Uderzo)
Arte: Albert Uderzo
Editora original: Les Éditions Albert René
Editora no Brasil: Editora Record
Páginas: 48

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