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Crítica | A Noite das Bruxas, de Agatha Christie

Crianças, maçãs e Dia das Bruxas.

por Luiz Santiago
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Livro da maturidade de Agatha Christie, A Noite das Bruxas foi originalmente publicado em novembro de 1969, e trazia, mais uma vez, o detetive Hercule Poirot em uma investigação macabra, envolvendo o assassinato de uma criança mentirosa, numa festa de Dia das Bruxas. Quem convence o belga a assumir o caso é sua velha amiga Ariadne Oliver, escritora de romances policiais que terá grande importância na festa. Sua presença chama a atenção de diversas pessoas (tanto adultos quanto adolescentes) e impulsiona Joyce Reynolds, uma garota de 13 anos, famosa por mentir bastante, a diz em alto e bom som que “já presenciou um assassinato“. Claro que ninguém acredita na afirmação, e a festa continua, mas tudo muda de figura quando, ao final do evento, o corpo de Joyce é descoberto na biblioteca da mansão de Rowena Drake, afogada em uma bacia cheia de água e maçãs, onde uma das brincadeiras da festa ocorrera.

O crime, aqui, traz uma reflexão interessante sobre a neurose de alguns indivíduos diante do belo, diante de algo que lhes desperta imensa paixão e fixação. Muitas dessas pessoas são capazes de cometer os mais hediondos crimes, simplesmente porque não concebem que algum obstáculo os impeça de alcançar aquilo que tanto desejam. Há, é claro, um certo tempero moral por parte da autora — inclusive no julgamento que ela faz das novas gerações, referindo-se às liberdades individuais e ao sexo sem compromisso –, mas esse aspecto filosófico do livro tem realmente muita força e faz o leitor pensar nas ações, relações e desejos humanos. O meu lamento é que esse olhar não é utilizado para construir com muito cuidado a persona responsável pelos assassinatos. Apenas nos últimos capítulos esse recorte ganha força, e quando a reflexão se torna a motivação, parece que perdemos alguma parte da narrativa que nos levou até ali.

Em dois blocos, porém, a autora conseguiu criar excelentes encaminhamentos do drama: um no capítulo cinco, durante a incrível conversa entre Hercule Poirot e seu amigo Spence; e outro entre os capítulos 23 e 25, quando Judith, Miranda e Ariadne estão em fuga. A primeira parte da construção do mistério e a grande tensão no momento anterior ao esclarecimento dos crimes, formam uma dupla de situações imbatíveis nesse livro, ganhando de momentos mais longos e, por um lado, até mais divertidos, como toda a preparação e todo o evento da festa de Halloween. O fato de termos crianças e adolescentes no centro do drama torna os crimes e as consequências mais impactantes, deixando o leitor incrédulo diante da banalidade e constância dos atos terríveis descortinados por Poirot.

A Noite das Bruxas é uma das produções em que Agatha Christie está interessada em versar sobre caráter, psicologia, temperamento e regras sociais, fazendo com que todos esses elementos contribuam para a nossa visão parcial do crime e nos afaste do verdadeiro culpado. A construção é bem feita, mas o seu momento de compensação é rápido, verborrágico e repetitivo, explicando em detalhes inúteis algo que já tinha sido esclarecido em pequenas doses pelo próprio Poirot. Eu tenho muitos problemas com diálogos ou parágrafos de contexto didático após o clímax de um livro, e é exatamente isso que temos aqui, com toda essa situação desembocando em um encerramento que traz um “segundo clímax“, servindo apenas para justificar umas páginas a mais no livro. A Noite das Bruxas é um drama bom de se ler, com ação frenética nos capítulos finais e uma conversa nas entrelinhas sobre uma ideia fixa na cabeça de um psicopata fascinado pela beleza. Uma leitura que vale a pena, mesmo não sendo brilhante.

A Noite das Bruxas (Hallowe’en Party) — Reino Unido, novembro de 1969
Autora: Agatha Christie
Edição lida para esta crítica: Harper Collins Brasil (2022)
Tradução: Bruna Beber
242 páginas

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