A peça La Venexiana (às vezes traduzida como A Mulher Veneziana ou Uma Comédia Veneziana) é uma peça em cinco atos, escrita por um autor anônimo entre os anos de 1535 e 1537 em dialeto veneziano, mas também incluindo representações nos dialetos da Toscana e de Bérgamo. Adaptada para a TV sueca por Bertil Bodén e Giacomo Oreglia, e dirigida por Ingmar Bergman, esta graciosa commedia dell’arte se apresenta como uma das muitas versões do amor, do desejo e da juventude que o mestre sueco assinou ao longo da carreira. Mas diferente de seus grandes projetos com estes temas, o pequeno filme não atinge a todas as expectativas, especialmente em sua parte final.
Julio (Folke Sundquist) é um nobre que está viajando e, em Veneza, é rapidamente levado em consideração (fazendo de tudo para isto) por duas senhoras locais, que morrendo de amores pelo belo rapaz, tentarão atrair sua atenção. A ação se passa ao longo de quatro dias e Julio irá garantir, com todos os seus galanteios, mentiras, mal-caratismo e libido à toda prova (cabendo também falsas promessas e interesses financeiros mal escondidos) que ele tenha o seu momento de intimidade com as duas mulheres venezianas interessadas, tentando arrancar delas não apenas o amor.
Fica bastante claro desde o início que Bergman dirigiu esta obra sem grandes pretensões técnicas ou estáticas. Com efeito, parece que sua direção dá um passo atrás no rigor de encadeamento, foco e disposição da câmera para adotar um padrão mais propício ao gênero adaptado (uma peça de teatro que, pelas confusões e pelas idas e vindas, lembra um pouquinho A Comédia dos Erros), padrão que assume inclusive na estrutura da película, com cenários montados à la teatro medieval, máscaras e instrumentos que nos levam para o século XVI. Este é o real ponto interessante do filme. O trabalho do diretor com ingredientes um pouco distintos do convencional para ele atrás das câmeras — é importante lembrar que Bergman já tinha uma larga e famosa experiência no teatro sueco e que já tinha adaptado uma peça para a TV um ano antes, a saber, A Chegada do Sr. Sleeman — se destaca como um experimento instigante, muito mais em conceito do que em execução.
No elenco, o destaque vai para Folke Sundquist, no papel de Julio e para Sture Lagerwall, no papel de Bernardo. As atrizes, tanto as que interpretam servas (Maud Hansson e Helena Reuterblad) quanto as nobres senhoras da cidade servem apenas como uma espécie estranho de fetiche e ponte social e romântica entre o desejo de Julio e a situação cômica de um amor interesseiro revestido de desejo sexual. Gunnel Lindblom é o maior destaque entre as mulheres, mas ainda assim não entrega uma de suas grandes interpretações aqui.
As canções entoadas e a divisão em tela para os atos traz um charme maior para A Mulher Veneziana, ligando-se bem às cenas em que aparecem e tornando mais harmônica a passagem entre um bloco dramático (os acontecimentos de um dia) e outro. É uma pena que a repetição do padrão de conquista e a adaptação que não dá mais ingredientes cômicos ou menos afetados para as mulheres emperrem o enredo, assim como a finalização que conclui algo sem ter, de fato, ingredientes para concluí-lo. Como disse antes, o filme vale muito pelo conceito do teatro adaptado para a tela por Bergman, um assunto que ele já aludira em O Sétimo Selo e que voltaria a visitar, com muito mais rigor e beleza, em sua filmografia futura.
A Mulher Veneziana (Venetianskan) — Suécia, 21 de fevereiro de 1958
Direção: Ingmar Bergman
Roteiro: Bertil Bodén, Giacomo Oreglia
Elenco: Folke Sundquist, Eva Stiberg, Maud Hansson, Gunnel Lindblom, Helena Reuterblad, Sture Lagerwall
Duração: 56 min.