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Crítica | A Fotografia Oculta de Vivian Maier

por Ritter Fan
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estrelas 4

A Fotografia Oculta de Vivian Maier, título pomposo para algo simples como “Procurando Vivian Maier” em tradução direta do original em inglês é um fascinante documentário investigativo que merece ser conferido. E a grande razão para conferi-lo não é exatamente aprender sobre a mulher sujeito da investigação – ainda que valha a pena por isso também! – mas sim pelo inusitado que é, em pleno século XXI, algo assim acontecer.

O leitor deve estar pensando “esse crítico não disse nada com coisa nenhuma aí em cima”. E olha, é verdade. A questão é que quando menos o leitor souber sobre o documentário, mais irá apreciá-lo. Como disse, é um processo investigativo na linha de Procurando Sugar Man, que levou o Oscar de Melhor Documentário em 2013, mas com um resultado ainda mais satisfatório é redondo. Aliás, o mistério sobre Vivian Maier é tão palpitante que a BBC dedicou um documentário ao assunto também.

Portanto, a partir do parágrafo abaixo, considere-se em nossa de SPOILERS. E, se você quiser realmente se surpreender, não pesquise nada no Google também. Vá às cegas.

Eu avisei!

Um belo dia em 2007, John Maloof, um corretor de imóveis com hábito de participar de leilões, comprou, aleatoriamente, uma caixa repleta de negativos pertencente a uma tal de Vivian Maier. Ele pesquisou na internet e nada achou sobre ela o que, por si só, já é um fato raro. Algum tempo depois, tendo deixado a caixa de lado, ele voltou à procurar, dessa vez achando uma referência ao recente óbito de Vivian Maier. Vendo que as fotos de Maier não era fotos amadoras, ele resolveu se aprofundar no mistério e, então, provavelmente seu “transtorno obsessivo-compulsivo” alcançou patamares inacreditáveis, pois ele não só conseguiu achar os arrematantes de outras caixas semelhantes a que comprara, como, também, um depósito onde a misteriosa mulher guardara tudo que tinha, mas tudo mesmo, já que ela era uma “acumuladora”, daquelas que guardam todas as edições dos jornais por “poder precisar um dia”.

A curiosidade casada com o tino comercial de Maloof levaram à descoberta do trabalho de Vivian Maier, uma babá que tirava fotos. Sim, uma babá. E que tirava fotos com sua câmera ao redor do pescoço. Mas não eram fotos quaisquer. Mesmo para mim, um leigo no assunto, é fácil admirar a qualidade do material que é colocado no documentário para demonstrar esse fato. Mas acontece que, durante sua vida toda, Vivian Maier foi, apenas, uma levemente estranha babá que gostava de tirar fotos. Ela nunca divulgou seu trabalho. Nunca nem mesmo revelou as fotos!

Mesmo estando na “zona de spoilers”, não escreverei muito mais sobre o que Maloof acha em sua investigação. Basta apenas dizer que, com uma generosa dose de entrevistas, o rapaz desvela se não tudo, pelo menos grande parte da vida da babá-fotógrafa, de seu nascimento até sua morte, com direito até a algumas intrigantes surpresas.

Maloof co-escreveu e co-dirigiu o documentário também e, portanto, ele funciona ao mesmo tempo como a descoberta sobre quem foi Vivian Maier e, também, quem é John Maloof. Claro, ele vem ganhando provavelmente muito dinheiro com a venda das imagens tiradas por Maier, mas vejam pelo lado bom: o mundo nunca saberia dessa exímia fotógrafa não fosse a visão de Maloof. Portanto, no meu livro, ele merece todos os louros, mesmo quando, em determinado ponto, o documentário começa a parecer mais publicidade para seu próprio produto.

Engana-se, porém, quem achar que o documentário, por ser todo ele trabalhado por Maloof, é de baixa qualidade. Muito ao contrário, na verdade. Sua estrutura de “mistério a ser desvendado” é deliciosa, literalmente tornando impossível desviar o olhar da tela. É com ler um romance de Agatha Christie, com descobrir um novo sítio arqueológico. A escavação que Maloof faz da vida de Vivian Maier é deslumbrante. Ela própria gostaria do que Maloof fez? Certamente que não. Mas nós, espectadores e também os apreciadores de fotografia têm muito a agradecer ao rapaz. Por isso consigo perdoar um pouco essa invasão da privacidade de alguém já falecido e que provavelmente gostaria de permanecer desconhecido.

Usando-se das próprias imagens de Maier, além de uma fotografia inteligente, instigante, que muitas vezes tenta emular o ambiente limpo e asséptico de um laboratório de revelação fotográfica, a fita prende o espectador por cada um dos 83 minutos de sua duração. Muito dessa fascinação, claro, vem do mistério da vida dessa mulher, mas grande parte também do mundo em que hoje vivemos. Em pleno século XXI, todos parecem procurar uma coisa só: os chamados 15 minutos de fama. Assim, é quase completamente extraterrestre deparar-se com alguém que, muito ao contrário, passou a vida toda esquivando-se da fama. Vivian Maier tirava fotografias porque gostava de tirar fotografias. Ela não precisava que outros vissem o que ela produzia para ter estímulo. Ela representa a antítese do que hoje vivemos em que todos querem que tudo seja visto por todos.

Fascinante. Verdadeiramente fascinante.

A Fotografia Oculta de Vivian Maier (Finding Vivian Maier, EUA – 2013)
Direção: John Maloof, Charlie Siskel
Roteiro: John Maloof, Charlie Siskel
Com: John Maloof, Daniel Arnaud, Simon Amédé, Maren Baylaender, Eula Biss, Bindy Bitterman, Roger Carlson, Phil Donahue, Karen Frank, Dayanara Garcia, Howard Greenberg, Sylvain Jaussaud, Patrick Kennedy, Virginia Kennedy,  Vivian Maier
Duração: 83 min.

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