Lançado em junho de 1932, Os Treze Problemas é uma coletânea de contos de Agatha Christie que segue mais ou menos o caráter de “romance episódico” adotado em Sócios no Crime (1929), com os detetives Tommy e Tuppence. O livro ficou bastante conhecido por ser a primeira vez que encontramos uma das personagens mais queridas da autora, a velhinha detetive de St. Mary Mead: Miss Marple.
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A Erva da Morte
The Herb of Death
- Originalmente publicado em março de 1930, na revista The Storty-Teller.
Achei bem chatinho o início dessa história, com todo o clube praticamente implorando para a Sra. Bantry se convencer a tomar a sua vez na contação de mistérios. Depois de muito doce e fingimento, ela relata (aos trancos e barrancos) como, juntamente com o marido, foi convidada de Sir Ambrose Bercy em Clodderham Court. Para o jantar desse encontro, folhas de sálvia foram colhidas no jardim, mas infelizmente outra erva estava crescendo entre a sálvia e também foi incluída no recheio para a refeição de pato. Todas as pessoas presentes no jantar passaram mal, mas uma delas, a pupila de Sir Ambrose, Sylvia Keene, morreu. O inquérito apurou que a morte se deveu a envenenamento por ingestão da tal “erva errada“. Um acidente, apenas. Só que não foi acidente.
A narrativa da Sra. Bantry é estranha. Ela não sabe (na minha opinião, apenas finge) contar uma história de maneira bem estruturada, fornecendo os detalhes necessários para a compreensão do todo, de modo que os presentes precisam fazer uma espécie de anamnese temática, a fim de entenderem quem eram os personagens envolvidos, seus interesses na morte da pupila do grupo e, claro, como o crime foi verdadeiramente cometido. Nesse último ponto, porém, não há muito mistério. Já o assassino e a motivação são realmente o grande questionamento do conto. A resolução da autora é bem organizada e sem trechos truncados, mas como toda a base da história vem de uma conversa e uma relação nada interessante entre a Sra. Bantry e os presentes, a trama acabou perdendo força, para mim.
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O Caso no Bangalô
The Affair at the Bungalow
- Originalmente publicado em maio de 1930, na revista The Storty-Teller.
Aqui, Agatha Christie coloca toda a sua ironia e opinião pessoal em relação a mulheres muito jovens, extremamente bonitas, mas absolutamente vazias e, acima de tudo, excepcionalmente inconsequentes. Este é o caso de Jane Helier, que narra essa trama. Não pude deixar de dar risada pela forma como a autora teceu comentários, nas entrelinhas, sobre a personagem. Sua figura, seus hábitos, seu egoísmo e o fato de olhar apenas para si e para seus desejos são os motivos de alfinetadas da autora, que, mesmo assim, não torna a personagem intragável. Apenas estúpida. Bobinha. Banal. Para mim, ela é muito melhor que a chatíssima da Sra. Bantry do conto anterior, que simplesmente não suporto.
O que eu destaco nesse conto é o seu desfecho. Acho o início mais ou menos parecido com a estrutura de A Erva da Morte, e talvez por isso acabei rejeitando um pouquinho a maneira como ele se ergue. No entanto, a forma como o crime de roubo aconteceu e as consequências para os envolvidos apareceram, meu sorriso foi aumentando cada vez mais. Foi a primeira vez, neste livro, que eu consegui encontrar o caminho mais próximo possível da resolução verdadeira. E que solução! O fato de estarmos diante de uma possibilidade e não de um crime realmente cometido é sensacional. E, melhor ainda, temos a ilustre lição de vida dada por Miss Marple à jovem e inconsequente atriz, numa demonstração de sororidade que deixou o final da história inesperadamente bonita.
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Morte Por Afogamento
Death by Drowning
- Publicado originalmente em 1931 na Pall Mall Magazine de Nash, e contém apenas quatro dos personagens do Clube das Terças-Feiras.
Baita conto legal para terminar a coletânea Os Treze Problemas! Aqui, temos a aventura “menos clube das terças-feiras” de todo o livro. Cronologicamente, sabemos que já se passou algum tempo desde que as seis pessoas das aventuras anteriores se conheceram na casa de Bantry. No momento presente, Sir Henry está novamente se hospedando na casa do amigo, quando, certa manhã, chega à casa a notícia de que uma garota chamada Rose Emmott foi encontrada afogada no rio, perto do moinho. A fofoca local afirmava que Rose estava grávida de um jovem chamado Rex Sandford, um arquiteto de Londres que não era bem visto ali em St Mary Mead. Inicialmente, supõe-se que a garota tenha se matado, por ter sido incapaz de enfrentar o pai com a verdade sobre a gravidez. Mas os hematomas em seus braços indicam que houve luta antes que ela caísse no rio e se afogasse. A partir de então, a investigação passa a olhar o caso como assassinato.
O leitor, porém, já sabia que o afogamento não tinha sido acidental. Ainda no primeiro ato do conto, vemos a entrada de Miss Marple em cena, procurando Sir Henry às escondidas e pedindo para que ele, com sua influência no meio da polícia, investigasse a morte de Rose por um ângulo muito específico… e dá ao antigo homem da lei um papel onde contém o nome da pessoa que ela diz que sabe que matou a jovem grávida. Eu estranhei o fato de que a figura de um assassino “definitivo” e “sugerido” estivesse posta já nos primeiros minutos. Essa sensação ainda ficou por muito tempo, até eu entender qual era o caminho que a autora escolheu para a investigação. Uma jornada muito interessante, com uma revelação inteligente e inesperada. Claro que o elemento mais mundano e passional torna a sequência de revelação um pouco menos marcante, mas não lhe tira o brilho por completo. Uma finalização muito bem feita para um livro de mistérios muito bom, com a estreia da maravilhosa Miss Marple na literatura.
Os Treze Problemas (The Thirteen Problems) — Reino Unido, junho de 1932
Autora: Agatha Christie
Edição original: William Collins & Sons (Collins Crime Club)
Edição lida para esta crítica: Harper Collins Brasil, 2022
Tradução: Petê Rissatti
258 páginas