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Crítica | A Caminho da Lua

por Ritter Fan
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Hollywood sempre foi aonde o dinheiro está e, no momento, ele está com a China. O crescimento das co-produções chinesas ou filmes feitos para agradar o público chinês vem acontecendo a olhos vistos e é natural que o começo seja conturbado, cheio de adequações. A Caminho da Lua é uma animação que tenta apertar em todos os botões já cientificamente comprovados que realmente funcionam pela Disney, mas sem o mesmo finesse da Casa do Camundongo ou, para ser justo, com o mesmo finesse das criações menos inspiradas do estúdio americano.

Usando como pano de fundo a reimaginação da lenda da deusa chinesa da Lua, Chang’e, somos apresentados à pequena Fei Fei (Bryce Taylor Hall quando menor e Cathy Ang quando maior) que vive alegremente com seus pais até que sua mãe falece e seu pai, alguns anos depois, resolve casar novamente. Todo esse terno, mas triste começo lembra, com boa vontade, o excelente início de Up – Altas Aventuras e acaba realmente sendo o trecho mais memorável do longa que logo descamba para uma aventura multicolorida na Lua em que Fei Fei e Chin (Robert G Chiu), filho da namorada de seu pai, precisam ajudar Chag’e (Phillipa Soo) a conectar-se com o amor de sua vida.

Toda a delicadeza do início é defenestrada e substituída por números musicais e pelo uso maciço de bichinhos fofos – uma coelhinha que depois vira parente distante do Pikachu, uma lebre verde, um sapo e um pangolim que mais parece uma luz de conforto de quarto de criança e uma infinidade de outros – em uma narrativa estilo montanha-russa que muda de cenário a cada cinco minutos e que não apresenta nenhuma tentativa de lógica interna. Em outras palavras, depois que a situação base é apresentada com solenidade, estabelecendo a dificuldade que Fei Fei tem de seguir adiante mesmo anos depois da morte de sua mãe, a animação entra no “modo burocrático” feito exclusivamente para os bem pequenos ficarem hipnotizados pela tela pelo efeito Teletubbies.

E se seu pequeno adorou A Caminho da Lua e “por isso o filme é bom”, posso dizer por experiência própria que criança gosta de basicamente qualquer coisa (vide Teletubbies), pelo que isso não é medida para nada. Além disso, quantas animações para crianças pequenas conseguem ir além do banal, das luzes piscantes e dos bichinhos fofos? Oras, mesmo o já citado Up, decididamente uma obra que não é “feita” para crianças pequenas, consegue agradá-las na mesma proporção que encanta os adultos e eu poderia citar outras várias, inclusive basicamente todas do Estúdio Ghibli. Ou seja, as animações que se prezam deveriam tentar ir além de seu público-alvo e não aquém como quase é o caso de A Caminho da Lua.

O que segura a animação na linha do razoável é a beleza da direção de arte que captura e extrai muita beleza da cultura chinesa, juntamente com o design de personagens, notadamente as duas crianças, Fei Fei e Chin, com trabalhos originais de voz que emprestam personalidade a elas. Fei Fei com seu ar sonhador, mas entristecido, convence como uma criança que, naturalmente, tem dificuldade de deixar o passado ser passado, especialmente quando Chin entra em cena com uma caracterização elétrica e hilária, como se estivesse constantemente ligado nos proverbiais 220 volts.

Mas o roteiro que Audrey Wells escreveu com as sugestões de Jennifer Yee McDevitt e Alice Wu é didatismo puro em que tudo precisa ser repetido pelo menos umas três vezes para ser sedimentado na mente dos pequenos (eu já falei dos Teletubbies?). Na verdade, no lugar de atiçar a imaginação, o texto cansativo a substitui, explicando a lição e basicamente ditando como os espectadores de todas as idades devem se sentir. E o mesmo vale para as canções que nada mais são do que repetições dos diálogos em forma musical.

A Caminho da Lua não consegue fazer muito com sua premissa ou com o dinheiro chinês que a alimenta, resultando em uma animação cansada, repleta de clichês mal utilizados e textos expositivos que acabam nivelando por baixo um material que até poderia resultar em algo realmente bom em mãos mais talentosas. Vale por seu começo, mas tem pouco fôlego para justificar sua duração.

A Caminho da Lua (Over the Moon – EUA/China, 2020)
Direção: Glen Keane, John Kahrs
Roteiro: Audrey Wells, Jennifer Yee McDevitt, Alice Wu
Elenco (vozes originais): Cathy Ang, Bryce Taylor Hall, Robert G Chiu, Phillipa Soo, Ken Jeong, John Cho, Ruthie Ann Miles, Margaret Cho, Sandra Oh, Kimiko Glenn
Duração: 95 min.

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