Lançado em junho de 1932, Os Treze Problemas é uma coletânea de contos de Agatha Christie que segue mais ou menos o caráter de “romance episódico” adotado em Sócios no Crime (1929), com os detetives Tommy e Tuppence. O livro ficou bastante conhecido por ser a primeira vez que encontramos uma das personagens mais queridas da autora, a velhinha detetive de St. Mary Mead: Miss Marple.
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A Calçada Manchada de Sangue
The Blood-Stained Pavement
- Publicado originalmente na Royal Magazine do Reino Unido em 1928, e nos Estados Unidos no mesmo ano, com o título Drip! Drip!.
Aqui temos a apresentação da história da artista plástica Joyce, uma das integrantes mais sonhadoras do clube das terças-feiras. É outra história que se passa na Cornualha (como Os Lingotes de Ouro, da mesma coletânea), mais especificamente na pitoresca e pacata vila de Rathole. Por se passar num ambiente litorâneo, a trama carrega uma certa despreocupação, uma leveza que brevemente se revelará falsa, uma vez que existe um crime sendo cometido de forma bastante astuta. Eu gosto muito da apresentação dos casais dessa história e da aura macabra em torno deles. Nós não sabemos qual desses indivíduos (ou qual das duplas) estará no centro da investigação, então uma forte tensão se arma e fica cada vez mais forte à medida que percebemos que existe algo muito errado, mas não conseguimos identificar o que é… até que o crime se revela e nós não entendemos como ele foi executado (esta é a verdadeira graça da história, por sinal). Fiquei um pouco frustrado pela resolução, ao final. Isso não significa que é uma entrega de resposta ruim, mas a apresentação e desenvolvimento do crime foram tão misteriosas e tão interessantes, que o caráter mais ou menos banal do resultado me trouxe uma dose inesperada insatisfação.
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Motivo X Oportunidade
Motive v. Opportunity
- Publicado originalmente na Royal Magazine do Reino Unido, em 1928, e nos Estados Unidos no mesmo ano, com o título Where’s the Catch?.
Motivo X Oportunidade é uma história relativamente burocrática, mas não no sentido negativo dessa afirmação. Por ser narrada por um advogado, o Sr. Petherick, há todo um contexto de detalhamento e de processo de apresentação em camadas que tornam a trama consideravelmente diferente das outras, com um resultado ótimo, por sinal. É a história de um homem de muitas posses (que ele chama de “Simon Clode” para preservar a identidade do cliente) e que deixa um testamento inesperado. À primeira vista, o leitor pensa que estará diante de uma aventura comum, de pessoa que morre e que alguém matou apenas para ficar com os bens. A autora, no entanto, aborda outros aspectos da problemática, fazendo do próprio testamento o mistério a ser resolvido pelos leitores. A maneira como Miss Marple chega à conclusão é “mais do mesmo” em termos de processo e explicação geral, mas todo o contexto — e mesmo a linha final de entrega do resultado — são tão interessantes que mantém a qualidade do conto lá em cima.
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O Gerânio Azul
The Blue Geranium
- Publicado originalmente em dezembro de 1929 em The Christmas Story Teller.
Quando falamos de temporalidade, este é o conto que mais se distancia dos outros, na continuidade dos eventos do livro. Um ano depois do último encontro do clube das terças-feiras, Miss Marple é convidada por Sir Henry Clithering para uma recepção na casa do Coronel Arthur Bantry e sua esposa, em St. Mary Mead. Gosto da maneira como Agatha Christie colocou um pouco mais da opinião das pessoas sobre Miss Marple aqui. A autora fez isso constantemente com Poirot, mas aqui em Os Treze Problemas, até o momento, essa opinião tinha sido mais indireta, mais amigável, apenas dita entre pessoas do clube que, de fato, deixavam claro o quanto estranhavam a postura observadora da velhinha detetive, mas não lhe eram hostis. Agora, porém, vemos uma outra camada disso em cena, o que é sempre muito interessante.
O Gerânio Azul é um daqueles poucos contos com elementos supostamente místicos ou sobrenaturais na obra da autora — e vale dizer que já tivemos outro desses nessa mesma coletânea, em A Casa do Ídolo de Astarte. No presente caso, uma mulher constantemente doente (hipocondríaca ou realmente frágil?) é a vítima. Ela tem uma queda especial por videntes e acaba lutando contra o cumprimento de uma “profecia” ligada a um gerânio azul, como diz o título. É uma história realmente muito bem escrita, a partir do momento em que Sir Henry passa a narrar os temores da pobre Sra. Pritchard e de uma tal vidente chamada Zarida. Outra vez, não consegui desvendar os caminhos que levariam à resposta para o crime.
Os Treze Problemas (The Thirteen Problems) — Reino Unido, junho de 1932
Autora: Agatha Christie
Edição original: William Collins & Sons (Collins Crime Club)
Edição lida para esta crítica: Harper Collins Brasil, 2022
Tradução: Petê Rissatti
258 páginas