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Crítica | 1923 – 1ª Temporada

Mais uma geração dos Dutton.

por Kevin Rick
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Depois do lançamento da minissérie 1883, que acompanha a família Dutton durante a grande migração ocidental americana e seu estabelecimento em Montana, o criador Taylor Sheridan decidiu visitar outra época da linhagem familiar, nos levando para o ano de 1923, durante o período da Lei Seca e os estágios iniciais da Grande Depressão. Acompanhamos uma geração liderada por Jacob Dutton (Harrison Ford) e Cara Dutton (Helen Mirren), um casal de idosos que comanda Yellowstone com a ajuda de Jack Dutton (Darren Mann). Depois que o rancho é ameaçado por disputas com fazendeiros locais, principalmente o malévolo Banner Creighton (Jerome Flynn), o magnata Donald Whitfield (Timothy Dalton) decide se aproveitar da situação para tentar adquirir o terreno dos Dutton, momento em que Cara pede a ajuda de seu sobrinho Spencer Dutton (Brandon Sklenar), que desbandou para a África após retornar da guerra.

Se 1883 é uma série com muitas diferenças narrativas de Yellowstone, produzindo uma trama sobre a grande jornada ao oeste com tons épicos em sua expedição histórica, o mais novo spin-off tem uma abordagem mais similar à “série-mãe”, efetivamente nos apresentando um ranch story com disputas de territórios e a dificuldade da vida de fazendeiro no núcleo principal de Jacob e Cara. As lendas da atuação que interpretam o casal estão bem confortáveis em cena, emprestando uma boa dose de ternura e aflição para uma dupla de octogenários que precisam enfrentar uma nova batalha, com Mirren carregando uma força feminina e grandes cenas de liderança matriarcal, e Ford trazendo seu carisma rabugento e humor seco para um personagem que parece ter mais rugas do que vigor.

Temas como mortalidade, velhice, arrependimento, persistência e principalmente legado vêm naturalmente à tona nesse tipo de história, ainda mais para Sheridan que adora articular diálogos sobre conservadorismo, sobre o velho x futuro e sobre o homem do campo vs o capitalismo selvagem, personificado aqui na figura antagonista do personagem de Timothy Dalton, em mais um empresário unidimensional do universo. Inclusive, o conflito entre diferentes tipos de fazendeiros, com diferentes níveis de poder, gera um drama interessante a ser abordado, por mais que o palco de disputa territorial esteja desgastado nas obras da franquia.

É uma pena, porém, que a trama acabe sendo pouco desenvolvida por ter que lutar com os outros dois núcleos da temporada: o retorno de Spencer para Montana, passando pela África, o Oceano Atlântico e a Europa; e o bloco de Teonna Rainwater (Aminah Nieves), uma nativa americana que está fugindo da violência de uma escola católica. O núcleo de Spencer até tem algumas características interessantes de aventura global e expansão de universo, inclusive com lindas sequências de grandes paisagens, mas a trama progride dentro de um envelope melodramático muito ruim com o romance do Dutton com a riquinha Alexandra (Julia Schlaepfer) e algumas das piores representações críticas de colonialismo que já assisti. O núcleo de Teonna também contém algumas boas ideias e comentários históricos, num certo revisionismo que Sheridan tem feito da cultura nativo-americana no audiovisual de faroestes, mas a trama se envereda para um ciclo interminável de violência e sadismo sem muita substância dramática ou representativa.

Mais do que isso, a divisão quase hermética entre as três tramas cria um sentido narrativo desengonçado, com os núcleos se tornando muito isolados e espaçados na falta de convergência narrativa ou até mesmo tonal da temporada, já que a abordagem da direção e do roteiro muda bastante de um bloco pro outro, com exceção talvez do exagero e da gratuidade da produção com cenas de sexo, violência e sadismo – a sequência de Whitfield batendo nas prostitutas, por exemplo, não justifica sua existência e é totalmente deslocada. A distribuição de tempo e a montagem também têm dificuldades, com a história ficando um tanto superficial em todas as tramas, como o desperdício do contexto histórico da Lei Seca ou a falta de desenvolvimento de elementos culturais, algo normalmente tão caro para Sheridan em Yellowstone e as representações da vida caubói ou o mundo das reservas.

1923 tem três núcleos bem distintos e interessantes, mas que terminam por se atrapalharem na temporada, seja por serem muito isolados, seja pela forma que cada um é menos aprofundado do que deveria, com a narrativa caindo numa impressão geral de falta de progressão e ritmo lento. Notem, por exemplo, como a disputa territorial do rancho é estagnada depois do confronto violento no início da série, marinando enquanto Spencer volta para casa. Com a renovação para um segundo ano e a provável convergência dos núcleos, a série tem potencial para explorar melhor seus temas, personagens e contextos históricos em uma narrativa mais envolvente, mas, até aqui, vimos a obra menos interessante e mais chata do universo televisivo de Sheridan.

1923 — EUA, 2023
Criação: Taylor Sheridan
Direção: Guy Ferland, Ben Richardson
Roteiro: Taylor Sheridan
Elenco: Helen Mirren, Harrison Ford, Brandon Sklenar, Julia Schlaepfer, Jerome Flynn, Darren Mann, Isabel May, Brian Geraghty, Aminah Nieves, Michelle Randolph, Timothy Dalton
Duração: 08 episódios de aprox. 60 min.

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