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Cobertura | Curitiba, Até Breve: Notas Finais Sobre o 13º Olhar de Cinema

Mais uma cobertura de Festival no Plano Crítico!

por Frederico Franco
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Chega ao fim o 13º Olhar de Cinema de Curitiba e, com isso, a cobertura aqui no Plano Crítico. Foram sete dias bem intensos, com mais de vinte filmes assistidos – a maioria deles com críticas aqui mesmo no site. Em linhas gerais, realizar esse trabalho no festival foi um desafio um pouco diferente da experiência anterior a Gramado. Em Curitiba foi necessário abrir mão de alguns filmes para, eventualmente, conseguir assistir tudo aquilo que foi planejado. Como dito em outro texto, o foco foi direcionado especificamente para as Mostras Competitivas de Longas Brasileiros e Estrangeiros. Por isso, aqui no site, a esmagadora maioria das críticas são relacionadas à competição de longas-metragens. Parto, agora, para brevíssimos arremates a serem pontuados neste final de experiência.
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ROTINA: ENTRE CAMINHADAS E ANOTAÇÕES

Despertar relativamente cedo foi parte importante da rotina estabelecida ao longo do 13º Olhar de Cinema. Era necessário chegar cedo ao icônico Cine Passeio para fazer a retirada dos ingressos cuja disponibilidade estava sujeita à lotação da sala escolhida. No mesmo Cine Passeio, as manhãs foram dedicadas à escrita das críticas relativas aos filmes assistidos na noite passada. As sessões eram todas à tarde, a partir das 14h, nas duas salas do Passeio e em outras duas no Cinemark Mueller, cinema do Shopping Mueller no Centro de Curitiba. A grande maioria dos filmes vistos foram dadas entre as salas 1 e 2 do cinema do shopping – as mostras competitivas dos longas-metragens tinham essas salas como moradas. Por isso, depois do trabalho pela manhã, surgia uma rápida caminhada até o Cinemark Mueller; e rápidas mesmo, sem qualquer exagero, durando cerca de cinco minutos ao máximo. Méritos totais da produção do evento que conseguiu concentrar seus espaços mais importantes em um curtíssimo raio. Como sempre, o caminhar entre sessões e escritas teve um importante papel durante a estadia em Curitiba. Foi nas caminhadas que surgiram os principais momentos de descanso e respiro frente à justa rotina. Ali, mesmo que por quatro minutos, ajudada pela música nos fones de ouvido, a cabeça viaja para lugares longínquos, muitas vezes, inclusive, trazendo novas ideias para os textos.

Infelizmente, enquanto crítico, preciso dizer: minha memória é horrível. Tenho extrema dificuldade de lembrar de detalhes daquilo que assisto. Para isso, durante a assistência dos filmes, adotei uma prática que há muito tempo considerava nefasta: realizar anotações enquanto rola o filme. No escuro do cinema, a escrita não se torna nada precisa ou racional. Quase no breu total, surgem algumas frases soltas, apontamentos rápidos sobre detalhes facilmente esquecidos após o calor do momento. De modo errático, as anotações se confundem e muitas vezes até se sobrepondo, confundindo minha leitura. Muitas vezes, ler os tópicos se torna similar a tentar traduzir um texto escrito em línguas antigas, já extintas.

Ainda, cabe dizer que a escrita não se limitava apenas ao café do Cine Passeio. Após a exibição do primeiro filme da tarde, mais um turno dedicado à construção das críticas. Dessa vez, não surgia um texto exato, organizado em orações, frases e parágrafos, apenas tópicos para nortear a futura crítica a ser escrita. Aqui, agora, me vejo seguindo uma tônica já comentada durante a cobertura do Festival de Gramado: escrever quando pode, escrever quando dá. Todo e qualquer momento de aparente ócio se torna um instante em potencial a ser transformado em tempo útil. Qualquer anotação, por mais vaga possível, é importante ao longo desse processo de criação.
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SOBRE A CURADORIA DAS MOSTRAS COMPETITIVAS DE LONGAS

A curadoria do 13º Olhar de Cinema merece um recorte à parte. Seja referente aos longas brasileiros ou aos estrangeiros. Em ambos os casos, estivemos diante de uma diversa seleção de filmes, abordando inúmeras temáticas pertinentes – sejam elas sociais, políticas ou até mesmo estética. Ao pegar o recorte internacional, somos apresentados a um road movie intimista, a uma torta sátira política e uma curioso retrato sobre os impactos de uma guerra na população de sua vila em Moçambique. Desde as escolhas estéticas até a temática, são filmes distintos, com abordagens completamente diferentes entre si: do íntimo ao distante. O mesmo movimento ocorre ao pensarmos na curadoria dos longas-metragens nacionais: uma comédia de costumes, um documentário padrão e um mistério kafkiano abrasileirado. Protagonistas em polos dramáticos completamente opostos e escolhas de mise en scène variando entre o cômico e o melodramático. Foi extremamente curioso entrar em contato com filmes tão distantes um do outro, mas ao mesmo tempo com propostas igualmente potentes.
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OLHARES CLÁSSICOS E FILME DE ENCERRAMENTO

Uma das mostras mais valorizadas do Olhar de Cinema é a Olhares Clássicos, responsável por trazer ao público filmes considerados clássicos do cinema. Contudo, como comentado em uma de suas sessões, trata-se de uma seleção que contempla dois tipos de clássicos: aqueles consagrados pela história do cinema e outros que merecem mais atenção dos espectadores enquanto agentes históricos. Os dois filmes da Olhares Clássicos contemplados são exemplos dessas duas distinções apontadas. O primeiro deles, o icônico Sherlock Jr., do mestre do cinema mudo Buster Keaton, filme síntese de sua carreira, reunindo tudo aquilo que tem de melhor em sua filmografia. Por outro lado, o filme nacional, curitibana, A Guerra do Pente, um documentário que dá conta de explorar um peculiar evento ocorrido em Curitiba após um mal-entendido entre um vendedor e um cliente que apenas queria um pente de cabelo. O que parecia um enfrentamento banal se tornou uma verdadeira batalha política ao melhor estilo maio de 68.

Outro ponto alto do 13º Olhar de Cinema foi o filme escolhido para encerrar o festival: Salão de Baile, de Juru e Vitã. O referido documentário dá conta de levar ao espectador as principais características da cultura do ballroom no Rio de Janeiro. Com fortes influências de Paris is Burning, a direção do filme faz uma curiosa viagem por entre as principais casas e personagens da cena no Brasil, explorando suas similaridades mas, mais importante, apresentando embates entre as organizações. Fica aqui um dado positivo da obra: saber explorar de modo magistral as diversas formas de shows e batalhas de ballroom na capital carioca. Com extremo alto astral, Salão de Baile foi uma boa forma de encerrar o 13º Olhar de Cinema.
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POSSÍVEIS LACUNAS: RETORNO EM 2025?

Como principal lacuna vivenciada ao longo do festival está a falta de variedade no que diz respeito a filmes assistidos, focando apenas nas mostras de longas. Faltou, penso eu, explorar um pouco mais outros horizontes – como os curtas-metragens em competição ou até mesmo a Mirada Paranaense. Além disso, com uma organização um pouco mais rígida, talvez fosse possível conciliar responsabilidades acertadas com o site e a assistência de filmes fora do circuito de competição. Não seria nada mal ter explorado um pouco mais o Olhar Retrospectivo referente a Hou Hsiao-hsien ou ter visto outros clássicos expostos para o público. Outro detalhe capaz de ter sido incluído na rotina são as entrevistas coletivas com equipe dos longas em competição. Enfim, não cabe ficar aqui apenas lamentando aquilo que passou. Que isso sirva de exemplo para que, nas próximas vezes, seja instituído um regime organizacional um pouco mais certeiro. Quem sabe, em 2025, eu consiga explorar aquilo que, em 2024, ficou para trás.
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TOP 5 FAVORITOS ASSISTIDOS

A lista de filmes favoritos dá conta de levar em consideração as mostras de longas brasileiros e estrangeiros. Seguem, agora, os cinco melhores filmes assistidos durante o 13º Olhar de Cinema:

5 – Greice: “O timing cômico da construção da encenação de Leonardo Mouramateus é impecável. Muito disso se dá por um trabalho de montagem criterioso e, sobretudo, cuidadoso. É a partir da ausência do corte que o cômico surge em Greice. Terminada uma ação corriqueira, ao invés de um corte em direção a outro plano, a câmera se mantém ali, inerte, apenas capturando a essência física dos atores. Esse alongamento da ação acaba com o possível naturalismo da mise en scène, dando-lhe um caráter cômico. Esses brevíssimos instantes, por mais triviais que pareçam, são elemento central para provocar o riso do espectador. O trabalho corporal dos atores, em tais momentos, é outro aspecto decisivo para a produção de comicidade nesses momentos. Se Greice possui tamanho apelo cômico, muito se dá pelo trabalho de Amandyra, que dá vida à irreverente protagonista”.

4 – Ivo: Ivo apresenta uma protagonista homônima que, devido ao seu trabalho, convive diariamente com uma espécie de pulsão de morte: trata-se de uma enfermeira voltada para cuidados paliativos. Seus pacientes, portanto, são pessoas extremamente próximas da morte, muitas vezes estando mais próximas do lado de lá do que de cá. Ivo é quem concede àqueles sob seus cuidados uma transição lenta, suave, em direção ao fim que os espera logo adiante. A protagonista, dessa forma, é um agente cuja principal capacidade é transitar entre vida e morte; lhe é concedido esse poder quase espiritual de conseguir conectar ambas etapas da vida humana. Ivo atua como o barqueiro Caronte, conduzindo aos poucos seus enfermos com sutileza ao mundo dos mortos. É como se nela existisse uma capacidade inata de dançar com a morte. Ivo é uma das poucas pessoas com a habilidade de aprender a difícil coreografia proposta pelo ceifador. Por isso, com devido esmero, a protagonista pega na mão de seus pacientes e, pouco a pouco, ensina-os os principais passos da derradeira dança.”

3 – Caminhos Cruzados: “Paralelamente à odisseia de Lia e Achi, Levan Akin apresenta a figura de Evrim, uma advogada e ativista transsexual que luta para conseguir seu documento de identidade enquanto mulher. O diretor domina essa personagem tão bem ao ponto de manipular o espectador com maestria: durante boa parte da obra, parece implícito que, na verdade, Evrim trata-se da sobrinha perdida de Lia após trocar seu nome. O olhar otimista do diretor também se estende à esfera da nova personagem. Existe, aqui, uma personagem livre, que afronta o sistema e seu preconceito com bravura quase indômita. Além disso, após acompanharmos uma desilusão amorosa de Evrim, logo em seguida é apresentada uma situação de ternura, amor. A mulher finalmente conhece alguém que, além de valorizá-la, também não apresenta vergonha alguma de se relacionar com uma pessoa trans. Evrim é só sorrisos, uma pessoa também muito marcada por uma moral baseada na coletividade; ela, entre seus problemas pessoais, também dá conta de cuidar de um pequeno órfão que transita pelas vielas de Istambul.”

2 – A Mensageira: “Cega por esse ideal de justiça, Iris pouco percebe sua essência humana, visceral, ir desaparecendo aos poucos. Sua distância da religião parece colaborar com essa frieza. Seu universo é marcado por uma espécie de apatia geral. Desde a primeira cena de despejo a protagonista já não é construída por uma atuação naturalista ou realista. Vemos uma personagem robótica, fria, calada. Sua relação com os outros segue essa tônica: poucas palavras, gestos contidos, olhar perdido. Muitas vezes Iris parece fugir da câmera, como se rejeitasse o protagonismo a ela concedido. Os diálogos, beirando o artificial, são um mérito da direção para a construção da personagem. As cenas supostamente intimistas como, por exemplo, o sexo com o amante, não possuem nada de confortável, parecendo encenado, sem vida.”

1 – Eu não sou tudo aquilo que quero ser: “As fotografias, em termos gerais, são recortes amadores, sem pretensão de embelezar ou disfarçar o cotidiano – seja ele eufórico ou melancólico. Os registros estão ali e isso que importa. A vida é capturada com todas suas nuances. Desde festas em Tokyo até a solidão na Berlim capitalista: Jarcovjakova modula seus olhares a partir das dinâmicas sentimentais que regem seus instantes. Ao mesmo tempo em que entristece ver o olhar opaco diante da melancolia da incerteza no mundo capitalista, também é reconfortante observar a protagonista esboçar sorrisos entre amigos. O primor técnico desaparece, mas não faz falta: a ruptura é mais interessante, mais expressiva. De que serve uma composição perfeita se nada nela desperta algo naquele que vê? O amadorismo expressivo de Jarcovjakova é a abordagem perfeita para produzir no espectador aquilo que ela sentiu ao realizar o recorte fotográfico.”

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