No momento, uso de minha restante força vital para escrever esse artigo. Após chegar em casa, morrer por inesperadas 6 horas e depois voltar a rotina, estou aqui escrevendo sobre o Lollapalooza para impedir que o castigo de 50 chibatadas do Imperador Ritter Fan se vire sobre mim.
Ah, e claro, me senti muito mais confortável pra escrever um Fora de Plano do que uma crítica. Isso porque o Lollapalooza é muito mais que um festival, mas uma experiência. Além do fato de que este que vos escreve não conseguiu ir na edição de sábado, o que dificulta comparações. Bem, partindo do princípio sobre o festival realizado em Interlagos: minha primeira edição presente (após várias tentativas frustradas, principalmente uma de ir na de Chicago em 2014) e o que posso dizer é que o evento foi brilhante, sua importância atual para a música brasileira é sem precedentes.
Falando em sua importância para a música nacional que adentrarei comentários a respeito das atrações. No segundo dia de atrações, quem estava com fome de música conseguiu entrar cedo, dar uma rápida conferida na estrutura do festival e já partir para o palco Skol conferir o Dingo Bells. A banda do Rio Grande do Sul foi elogiada por seu primeiro álbum, lançado em 2015 (que aliás, figurou entre nossos melhores do ano), Maravilhas do Mundo Moderno. E foi tocando seu álbum quase que na íntegra que se extendeu o fantástico show da banda. O público, mesmo que não fosse grande, notoriamente ficou impressionado. Uma MPB com fortes doses de Soul, letras contemporâneas e vocais melódicos garantiram uma execução deslumbrante que conquistou aqueles presentes. No fim, a banda agradeceu e levantou a bandeira das bandas independentes, que são de extrema importância em festivais como esse, para que sejam divulgadas. Destaque para as canções Fugiu do Dia e Dinossauros.
Em seguida, uma multidão ia em busca de Karol Conká no palco Axe, enquanto alguns rumavam para o palco Onix, onde tocava outra banda independente, Maglore. Mas muita gente indo por esse caminho acabou parando no pequenino palco kidlollapalloza, surpresos, onde se encontravam três garotas e dois meninos, todos na faixa de 14 anos tocando clássicos do metal. A destreza como aquelas crianças tocavam Metallica, Black Sabbath e Gun N’ Roses deixou muita gente ali de queixo caído. Juntos, eles formavam o grupo School Of Rock, no futuro ainda escutarão falar bastante deles (eu espero).
Acabou que fascinado pelo School Of Rock não consegui terminar minha trajetória até o Onix e voltei para conferir o Marrore no palco Skol, de longe a banda mais “pesada” do lineup do festival. E foi exatamente isso, a fúria no rosto do vocalista entrando no palco deixava claro a pedrada que o público ia receber. Cantando o repertório de seu único e homônimo álbum, o grupo fez uma ótima apresentação, como já era esperado. Sua sonoridade era explicada só de olhar as camisas dos integrantes: o baterista com uma do Black Sabbath e o vocalista com uma caveira que lembrava o logo do Misfits. O som do Marrore é isso, stoner rock/metal com doses pesadas de punk, sempre com excelentes guturais. O impressionante é que se tratava de um trio, no caso com apenas guitarra e bateria junto do vocal. Sim, era difícil acreditar que aquele groove, aquela sonzeira, era proveniente apenas daquele amplificador da guitarra. Pena que o público do Lolla era alternativo demais para abrir uma roda punk ao som do grupo…
Logo em seguida, aí sim, estava eu no Palco Onix, dessa vez para assistir ao Walk The Moon. O grupo originário de Cincinatti, Ohio, faz um indie pop bem interessante para os padrões atuais. O vocalista Nicholas Petricca, junto de seu teclado, comandou com energia imensa o público, arriscando até um portunhol. O destaque só veio mesmo nas duas últimas canções, grandes hits da banda, Anna Sun e Shut Up And Dance With Me, mas o grupo até que conseguiu segurar bem a barra na maior parte do show. Pena que tinha muita gente mais preocupada erguendo seus celulares para filmar o momento do que efetivamente aproveitá-lo.
A próxima atração do palco Onix era a fantástica Alabama Shakes. Bem próximo do palco, consegui aproveitar aquela que, em minha opinião, foi a melhor apresentação do festival naquele domingo. Provavelmente qualquer um presente naquele show ficou apaixonado por Brittany Howard, a líder e alma do grupo. Quando junto de sua guitarra, era uma instrumentista excepcional e facilmente uma das maiores representantes femininas no rock atual. Nos momentos em que se ausentava da guitarra, entregava performances de Soul emocionalmente memoráveis. Falar de sua capacidade vocal é chover no molhado, o que mais chamou atenção foi sua forma de interpretar cada canção. Brittany parecia se abrir com o público, cantava como se conversasse conosco. Suas qualidades artísticas nos permitem chamá-la de a Aretha Franklin e Nina Simone da nova geração. Um show que foi do entusiasmo das guitarras de Future People e The Greatest à emoção de Over My Head e Gimme All Your Love. Brilhante, brilhante…
Cinco minutos depois já era a vez de Noel Gallagher’s High Flying Birds no palco Skol. O show do ex-Oasis e seus grandes pássaros voadores foi o que se esperava: Noel e sua banda são diretos, não abrem intimidades, entram para tocar e tentam fazer você ter a melhor experiência sonora possível. Revezando em um setlist de canções do primeiro e segundo discos e clássicos do Oasis, o que se viu foi algo tocante. Poucas bandas atuais possuem instrumentistas tão bons e criam arranjos tão belos quanto o Noel Gallagher’s High Flying Birds. Salvos alguns problemas no som dos metais das primeiras canções, o show foi perfeito. AKA What A Life com performance emblemática do tecladista, Don’t Look Back In Anger e Wonderwall cantadas em coro pelo público; The Mexican, Riverman e tantas outras faixas do excelente Chasing Yesterday garantiram um dos melhores momentos do festival.
O Lollapalloza já entrava em sua reta final com o show do Jack U, dupla de DJs formada por Skrillex e Diplo. Por mais ressalvas que Skrillex sempre me obrigou a fazer nos últimos anos, o resultado já era o que eu esperava: um grande espetáculo de luzes e efeitos, além de uma aula de música eletrônica. Ele é um cara diferenciado na EDM, isso garante sempre boas apresentações, algo que junto de Diplo – uma das cabeças do Major Lazer – cresceu ainda mais, permitindo a criação de uma parceria de grande química. Os dois dominaram a noite do Lolla trazendo a tona até mesmo celebridades e memes da internet, vide Safadão e MC Bin Laden.
A tarefa de fechar o festival no palco principal ficou com Florence + The Machine. Se os fãs brincam que a britânica é uma forma de divindade, a interpretação da cantora só ajuda ainda mais nessa afirmação. Florence rouba a cena com suas performances. Corria de um lado a outro, fazia discursos, dançava como uma entidade divina, trocava carinhos e ganhava presentes do público, deixando os seguranças loucos correndo atrás dela. Mas preciso dizer que foi o show que mais me desapontou. Não só pela escolha do setlist, que poderia contar com mais canções do disco de estreia, Lungs, mas porque o grupo é Florence + THE MACHINE. Não basta apenas a cantora estar fantástica, muita coisa depende da banda. Soando tão bem como ela soa em estúdio – principalmente em How Big, How Blue, How Beautiful – o que se espera é algo similar ao vivo. E não foi bem isso que aconteceu. A voz da cantora tinha muito mais destaque, o som dos instrumentistas soava baixo, não se percebia a riqueza dos arranjos. Isso facilmente pode ser um problema apenas técnico visto que, felizmente, algo foi corrigido na segunda metade da apresentação, muito mais vívida. Os destaques ficaram com o hino Dog Days Are Over, o belo teatro de How Big How Blue How Beautiful, e a bateria dramática de Drumming Song, que fechou o evento.
E o Lollapalooza 2016 se encerrou com uma leve chuva que acompanhava o cansado, mas extremamente satisfeito, público que voltava pra casa. Sem dúvidas uma experiência musical sem tamanho.