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Crítica | A Grande Ilusão (1949)

por Rodrigo Giordano
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Escrever, hoje, sobre um filme de 1949 é tarefa árdua. Por mais que leiamos e nos informamos sobre a época, é impossível reproduzirmos o contexto de seu lançamento e a relação deste com a experiência exercida no público. Toda crítica sobre filmes antigos é, portanto, inevitavelmente, um texto sobre o envelhecimento de tais obras, sobre o tipo de impacto que ainda são capazes de causar. As grandes produções, porém, sempre possuem algo que as mantém revigorantes.

Em A Grande Ilusão, essa potência rejuvenescedora está em seu enredo mais do que em sua forma. A história de um político honesto que se permite corromper pela máquina a fim de manter suas promessas e, consequentemente, o poder, segue colecionando casos similares ao longo do tempo. É exatamente essa universalidade, essa identificação com os acontecimentos cotidianos da vida real, o ponto chave da obra do diretor Robert Rossen.

Baseado no romance homônimo vencedor do Pullitzer de 1946, de Robert Penn Warren, A Grande Ilusão saiu da premiação do Oscar de 1950 com três estatuetas: Melhor Filme, Melhor Ator (Broderick Crawford) e Melhor Atriz Coadjuvante (Mercedes McCambridge). A interpretação de Crawford de fato é vigorosa, uma impressionante entrega ao personagem. Já o prêmio de McCambridge é um tanto simbólica, dado que é a única personagem do filme que foge de um estereótipo feminino de inocência e submissão.

Porque ele é honesto”. Essa é a resposta clara e simples que o jornalista Jack Burden recebe ao perguntar ao seu editor o que há de diferente no político do interior da cidade, o qual ele deverá cobrir. Burden se encanta por aquele homem simples e por sua devoção à sua família e ao povo da pequena cidade. Boicotado pelos donos do poder, é derrotado nas eleições, mas decide estudar Direito para estar preparado para a próxima corrida eleitoral. É preciso, porém, chamar atenção para um detalhe que tem a ver com o que foi exposto no primeiro parágrafo; a revisão de um filme tempos depois, nos permite dar conta de pormenores que talvez não tenham sido percebidos ou levados em conta pela fortuna crítica da época.

O protagonista Willie Stark normalmente aparece como um sujeito íntegro, despido de egoísmo, e que é corrompido pelo sistema ao chegar ao poder. No entanto, há algumas passagens no início da obra que desmentem esse senso comum. Em uma cena à mesa de jantar, sua mulher comenta com Burden sobre as humildes ambições do casal e que o objetivo de Stark é apenas dar uma vida melhor ao povo. Quando pede por uma confirmação, o futuro governador mecanicamente responde “É, é isso mesmo”, deixando no ar que havia outros interesses em jogo. É importante lembrar também que a chegada de Stark ao poder se dá a partir de uma tragédia que acarreta na morte de algumas crianças, da qual ele não pestaneja em se aproveitar.

Apesar de certa forma refazer o “discurso oficial”, esse novo olhar sobre o filme e seu personagem principal só o tornam mais rico e complexo. O diretor Robert Rossen soube muito bem construir esse sujeito que se coloca como a voz daqueles que não tem voz, e que não mede ações para manter suas aparências com o público, com o qual acaba criando uma imagem paternalista. Willie Stark é a representação do político que acredita que os fins justificam os meios.

Com uma montagem ágil, A Grande Ilusão talvez passe rápido demais pelo processo que transforma seu protagonista. Parte da época de ouro do cinema americano, foi um dos últimos “filmes de mensagem”, dado que estes foram desaparecendo com a guinada conservadora do país, o próprio Rossen fazendo parte de uma lista negra por suas ligações comunistas.

A Grande Ilusão (All The King’s Men, EUA, 1949)
Direção:
Robert Rossen
Roteiro: Robert Rossen (baseado na obra de Robert Penn Warren)
Elenco: Broderick Crawford, John Ireland, John Derek, Joanne Dru, Mercedes McCambridge, Shepperd Strudwick, Ralph Dumke, Anne Seymour, Katherine Warren, Raymond Greenleaf, Walter Burke.
Duração: 110 minutos.

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