Nós aqui do Plano Crítico, seguindo a publicação das LISTAS DE FAVORITOS, resolvemos esquematizar desta vez os nossos livros favoritos. A proposta segue exatamente a mesma da lista anterior: os escolhidos são 10 FAVORITOS e não necessariamente melhores (perceba a diferença, por favor!).
NOTA: Esta é uma versão 2.0 da lista. A primeira publicação aconteceu em 2015, com uma estrutura completamente diferente (para começar, era um TOP 5 e não TOP 10, como agora) e com muita gente diferente na equipe. Hoje, cinco anos depois, trago a versão atualizada e acrescida de novos comentários e indicações! Vocês também vão notar que fiz uma marcação na seção de comentários, separando visualmente as participações feitas pré e pós a publicação desta segunda versão.
Não se esqueçam de comentar abaixo e deixar também a sua lista de 10! Divirtam-se!
.
RITTER FAN
Para começo de conversa, é importante lembrar que essa é uma lista de favoritos, não de melhores. Há uma diferença fundamental nessas duas categorias e que pode ser resumida da seguinte forma: se eu fosse exilado para uma ilha deserta e tivesse a escolha de 10 livros para levar, eu levaria meus 10 livros favoritos e não os 10 melhores livros que li na vida. Ou seja, Othello ficaria em casa, mas Duna viria comigo. O Apanhador no Campo de Centeio seria trocado por A Origem das Espécies e assim por diante. Ou, sendo mais Fahrenheit 451, esses 10 aqui embaixo seria os primeiros que eu salvaria em um incêndio!
.
Édipo Rei
Οἰδίπους Τύραννος | Sófocles | ?? 429 a.C.
A Origem das Espécies
On the Origin of Species | Charles Darwin | ?? 1859
Sempre tive um lado secreto de cientista. Apenas quando cresci um pouco é que reparei que era burro demais para estudar o necessário para ser um. Afinal, ficava no recreio de castigo fazendo tabuada de multiplicação, o que de cara descartou minha ambição de, um dia, descobrir o que raios significa E=MC2. Mas um familiar próximo é um cientista (diria até que maluco) e, uma vez, ainda quando eu tinha tenra idade, o que significa algo lá pela metade do século XX, ele me presenteou com uma bela edição ilustrada em papel de gramatura alta de A Origem das Espécies, de Charles Darwin. Claro que eu não fazia ideia da importância desse livro, mas as ilustrações me cativaram, além da tentativa desse meu familiar em me explicar a “moral da história”. Anos depois, sempre com esse livro em destaque em minha estante (para tirar onda, lógico), resolvi me enfronhar em seu conteúdo e, para minha surpresa, fiquei mais fascinado ainda com o trabalho de Darwin. O livro não é exatamente for dummies, mas eu já tinha neurônios suficientes para fazer as conexões necessárias e perceber o quão valioso era aquela obra que tinha em mãos. Mesmo hoje, apesar de ter enveredado por caminhos não científicos, eu consulto o livro e mostro para minhas filhas, especialmente com as discussões absurdas que ouço por aí sobre o “criacionismo”. Mas isso fica para uma outra história…
.
A Ilha do Tesouro
Treasure Island | Robert Louis Stevenson | ?? 1881/2
O Alienista
Machado de Assis | ?? 1882
Confesso que nunca fui muito fã de Machado de Assis e meu primeiro contato com O Alienista se deu por intermédio de uma peça de teatro que assisti em priscas eras. Não lembro de ter tido uma boa experiência no teatro, mas lembro vivamente de a apresentação ter plantado uma sementinha que, tempos depois, me fez catar esse “conto estendido” do autor e, ato contínuo, ser engolido pela incrível narrativa do Dr. Simão Bacamarte e sua Casa Verde. Inesquecível do começo ao fim. E atual. Muito atual!
.
It, A Coisa
It | Stephen King | ?? 1986
Seis Personagens à Procura de Um Autor
Sei Personaggi in Cerca D’autore | Luigi Pirandello | ?? 1921
Trata-se de uma peça de teatro do autor italiano Luigi Pirandello, escrita em 1921. Quando a li pela primeira vez, o fiz em inglês, como parte de um dos vários cursos de literatura que já fiz nessa língua. E, de todas as peças que li e reli, essa é a que mais tenho gravada em minha mente. Seja pela metalinguagem, seja pelos fascinantes personagens, essa história – que conta exatamente o que o título descreve – é um dos mais fantásticos exemplares do Teatro do Absurdo e merece um lugar de destaque na estante de todos.
.
O Velho e o Mar
The Old Man and the Sea | Ernest Hemingway | ???? 1952
Esse foi um dos livros favoritos de meu pai, que lia desde romances trash até obras consagradas. Meu primeiro contato foi na forma do “você tem que ler isso” o que, claro, me fez colocar o livro na estante e nunca mais abrir. Meu segundo contato – e terceiro, quarto e por aí vai – se deu com meu pai consistentemente insistindo que eu lesse. Mas, como os pais não sabem de nada, me recusei. Afinal, se ele gostava, devia ser chato pacas. Mas, claro, quando finalmente li, pude constatar como eu fui idiota. De toda forma, tudo bem. Talvez o livro exija muito do leitor que, se for muito jovem, pode não pescar (ahá!!!) todas as referências. Tente, pois esse Hemingway irá fisgá-lo (ahá novamente!!!).
.
O Fim da Infância
Childhood’s End | Arthur C. Clarke | ?? 1953
Eu Sou a Lenda
I am Legend | Richard Matheson | ?? 1954
Duna
Dune | Frank Herbert | ?? 1965
Em 1984, assisti Duna, de David Lynch e não entendi patavinas. Fiquei encucado com as magníficas imagens e com a imaginação do roteiro, mas não muito mais do que isso. Até que um dia, na biblioteca do meu curso de inglês, descobri que havia a coleção quase completa dos livros de Frank Herbert em português. E foi aí que eu pude ver de onde aquela maluquice toda de Lynch tinha surgido e entender que Lynch, na verdade, tinha se segurado, pois a obra de Herbert é muito mais maluca ainda (sempre fico pensando o quão lisérgico teria sido o filme por Jodorowski). Não. Maluca não. Fenomenalmente inebriante. É, sem dúvida, uma das mais densas e imaginativas obras de ficção científica que já tive a oportunidade de ler. O grande problema é que ele é o primeiro de uma gigantesca série, com cinco continuações escritas pelo autor e que já li e mais um monte de outras continuações e prelúdios escritos por outro autor que nunca tive coragem – ou vontade – de ler.
LUIZ SANTIAGO
.
Ler sempre foi uma das minhas grandes paixões. Quando criança, adorava ler quadrinhos da Turma da Mônica e da Disney (era fanático pelas histórias com os três sobrinhos do Pato Donald) e tinha um livro chamado O Cuco que eu simplesmente não largava. Na adolescência, passei muito tempo lendo aqueles livros voluptuosos da Coleção Sabrina ou Júlia (não me julguem), até que descobri três autores nos quais eu me viciaria tremendamente e que passaria a adolescência quase toda lendo livros deles: Júlio Verne (comecei com Um Capitão de 15 Anos), Agatha Christie (comecei com O Homem do Terno Marrom) e Sidney Sheldon (comecei com O Outro Lado da Meia Noite — e sim, eu era adolescente. Nos anos 90. Pensem numa bibliografia que eu li quase toda…). Nesse meio tempo veio a saga Harry Potter (que chegou aqui em janeiro de 2000), que foi mais que um vício: foi uma fantasia de que aquilo ia acontecer comigo. Para mim, é um prazer enorme fazer uma lista com este tema. Tendo passado praticamente a vida toda lendo (eu aprendi a ler no finalzinho dos 4 anos), é bem interessante sentar e pensar dentre tantos livros, quais são os meus 10 favoritos.
.
Memórias Póstumas de Brás Cubas
Machado de Assis | ?? 1881
Minha paixão no meio de toda a apaixonante literatura de Machado de Assis! Esse aqui eu fui obrigado a ler na escola, e sentei emburrado para começar o livro, achando que ia odiar cada linha e que ia dormir antes de chegar à página dois. Nada disso. Memórias Póstumas e Capitães da Areia foram os livros do Colégio que eu li com o maior gosto da minha vida, amando a obra desde o começo. E este acabou se tornando o meu favorito! Uma história de vida, fracassos, amores, risos e veneno que me cativou imensamente.
.
O Mestre e Margarida
Мастер и Маргарита | Mikhail Bulgákov | ?? 1928 – 1941
A primeira vez que eu ouvir falar nesse livro e em seu autor foi em um fórum sobre séries de TV de várias partes do mundo. Um dos membros havia postado sobre a adaptação para a TV russa de “um certo livro escrito entre 1928 e 1941” e que misturava literatura, demônios, história de Jesus, críticas ao stalinismo, etc. Meu sensor de curiosidade foi ativado e eu tive a sorte de a obra ter sido, na época, recém (re)lançada no Brasil pela Alfaguara (isso foi em 2010) e não perdi a oportunidade. Ler O Mestre e Margarida é como ser surpreendido por praticamente tudo de bizarro, cômico e crítico que você possa imaginar em uma trama onde o próprio Satã e alguns amigos dele veem à Terra, mais precisamente à Rússia de Stálin. E a forma como o autor mistura elementos demoníacos com crítica social e à própria literatura é algo inacreditável. Para mim, um dos melhores livros de todo o século XX.
.
E Não Sobrou Nenhum
And Then There Were None | Agatha Christie | ?? 1939
A Rainha do Crime foi, como disse no texto introdutório, uma das minhas formadoras literárias da adolescência — e que no momento em que faço essa lista (março de 2020), estou numa maratona frouxa de releitura de alguns de seus livros (agora para escrever sobre) e leitura de livros dela que ainda não tinha lido. Este E Não Sobrou Nenhum foi um dos primeiros dela que eu peguei, há muitos anos. Um livro que me tirou o sono. Eu não o largava de jeito nenhum: queria saber quem (e como!) iria morrer a seguir! Uma obra que certamente foi a responsável pelo meu amor pela literatura policial hoje.
.
Esperando Godot
En Attendant Godot / Waiting for Godot | Samuel Beckett | ?? 1949
Sabem aquelas promoções de feiras de livro em que você vai com uma mala para poder levar o máximo de barbadas que encontrar pela frente, sabendo que tem livros ali que você só vai ler uns três, quatro, cinco anos depois? Pois bem, para mim, Esperando Godot foi um deles. Eu conhecia a peça de ouvir falar sobre (o título, pelo menos), mas não sabia do conteúdo dela. Foi quando a encontrei com um preço ridículo (mesmo!) numa Feira do Livro da USP e meti o volume na mala. Três anos depois da compra foi que peguei a obra para ler e… cada diálogo que ia passando pelos meus olhos era um verdadeiro alumbramento para mim. As conversas aqui vão da maior burrice e insensatez possível à filosofia mais deliciosa de boteco que podemos pensar. Tudo isso numa simples, Universal e extremamente pessoal história que reflete a nossa realidade de vida: todos nós esperamos um Godot em nossa existência.
.
Grande Sertão: Veredas
Guimarães Rosa | ?? 1956
Antes de Grande Sertão eu só tinha lido Corpo de Baile, do Guimarães Rosa. Mas isso tinha sido muito tempo antes. Eu havia gostado muito da escrita inventiva, raiz, demasiadamente humana do autor, mas não procurei mais nada para ler, até que, por acaso, resolvi comprar uma edição do livro que encontrei em promoção numa livraria. É engraçado como a gente descobre alguns livros, como conhecemos as obras que, sem saber, serão as nossas favoritas. Lembro muito bem da minha reação nas primeiras páginas. Era uma confusão imensa, mas era um prazer enorme tudo aquilo. Aquele ambiente sertanejo, aqueles personagens que em uma página traziam tanta profundidade que eu mal podia acreditar. E eu praticamente devorei a obra a partir daí. E fiquei completamente apaixonado por ela quando terminei. É “O” meu livro favorito de todos os tempos. E Guimarães Rosa, como alguns já sabem, é o meu autor favorito de todos os tempos também.
.
O Mundo se Despedaça
Things Fall Apart | Chinua Achebe | ?? 1958
A mais recente inclusão desse lista, um livro que e li em 2019. Uma história de raízes, de uma cultura, de uma luta para a manutenção de um povo, de uma ideia. Essa obra me pegou de um jeito muito forte e seu apelo pessoal, histórico e crítico é simplesmente inesquecível.
.
Cem Anos de Solidão
Cien Años de Soledad | Gabriel García Márquez | ?? 1967
Quando eu terminei de ler Os Reis Malditos, de Maurice Druon, eu estava apaixonado pela ideia dos romances históricos, com seu desenvolvimento ao longo de um grande período de tempo e com abordagens culturais e sociais. Em conversa com um grande amigo, perguntei se ele conhecia alguma obra que tivesse o mesmo estilo, e ele me indicou Cem Anos de Solidão, o romance que eu demorei mais tempo para ler um toda a minha vida. A história aqui é arrebatadora e os pontos de fantasia misturados com política e diversos elementos históricos da América do Sul me encantaram de imediato. O grande problema aqui é a maldita árvore genealógica da família Buendía. Eu cheguei a comprar um caderninho para fazer anotações de quem era filho de quem (e com quem), porque senão era impossível seguir lendo. A obra é um verdadeiro exercício de memória, especialmente quando as gerações começam a se encontrar. Aí o bicho pega. Hoje existem edições com a árvore genealógica pronta, vejam que maravilha! Um convite a mais para quem não leu correr e ler essa maravilha!
.
Incidente em Antares
Érico Veríssimo | ?? 1971
É por causa dessa obra-prima da nossa literatura que até hoje eu olho com desconfiança para um coreto de praça. Eu ainda estava no colégio quando li esse livro, não me lembro direito se no 1º ou 2º ano do Ensino Médio. Peguei o volume na biblioteca da escola e comecei a ler meio tenso, esperando logo ser surpreendido, porque a indicação apaixonada de um crush da época foi muito convincente. Então a leitura inicialmente por um outro interesse virou uma febre. Eu não conseguia largar o livro e a cada página me deparava com uma loucura, situação que ficaria cada vez mais estranha à medida que o livro chegava ao fim. Um retrato de Brasil que ainda vemos estampado nas paredes da nação hoje em dia…
.
Viva o Povo Brasileiro
João Ubaldo Ribeiro | ?? 1984
Esse também foi parte da minha febre em busca de romances históricos, depois da saga Os Reis Malditos e de Cem Anos de Solidão. É uma saga verdadeiramente brasileira, narrada com todo o poder da bagaceira que tinha a escrita de João Ubaldo Ribeiro. Outro daqueles livros que você começa e não quer mais largar. E que ainda consegue ver muitos dos pensamentos e acontecimentos refigurados e envernizados no Brasil de nossos dias.
.
O Dia do Curinga
Kabalmysteriet | Jostein Gaarder | ?? 1990
Depois da comoção gerada por O Mundo de Sofia, Jostein Gaarder se tornou um autor acessível no Brasil, com basicamente toda sua obra publicada pela Cia. das Letras. Eu comecei em seu universo a partir do já dito Mundo de Sofia e depois segui com O Pássaro Raro, O Livro das Religiões, Vita Brevis e Maya. Então, depois de já passar por algumas de suas obras, cheguei a este que considero o seu melhor livro, um dos relatos mais incríveis sobre uma viagem de encontro à realidade, à filosofia e à fantasia. Eu me senti como o garoto Hans-Thomas, ao lado de seu pai, indo da Noruega à Grécia em busca de algo muito especial. Uma história de viagem que é uma grande lição de vida. E um afago na alma.
LEONARDO CAMPOS
.
Odisseia
Οδύσσεια | Homero | ?? século VIII a.C.
Epopeia que foi transferida para o suporte impresso depois de muitos anos de tradição oral. Ao assistir The Walking Dead, Cold Mountain, Percy Jackson, dentre outros tantos filmes e séries, percebemos a importância dessa obra. A saga do astuto Odisseu está na base da teoria da narrativa ocidental e é um dos relatos mais sensacionais sobre a trajetória do herói. A necessidade de tomar decisões, o perigoso canto das sereias, a fiel Penélope e o desmanche da sua colcha a cada noite, adiando a substituição de Odisseu. Enfim, um clássico obrigatório.
.
Ilíada
Ἰλιάς | Homero | ?? século VII a.C.
Antecipação da Odisseia, as aventuras da Ilíada são incríveis e envolventes como o retorno de Odisseu para Ítaca. Há, no poema em questão, conflitos, ideologias, questões políticas e muito combate, além, claro, das questões filosóficas que serviram de base para grande parte da nossa tradição narrativa até os dias atuais.
.
Moby Dick
Herman Melville | ?? 1851
Adentrar no universo de Moby Dick foi um deleite, haja vista meu interesse por narrativas com temas sobre os mistérios do mar. É mais uma obra literária lida depois de bastante exposição aos seus derivados intersemióticos, dos quadrinhos ao cinema. O desejo de vingança do protagonista, a racionalidade da baleia em seus ataques focados na autodefesa e as aventuras vividas em cada trecho do romance repleto de notas explicativas e passeios por reflexões biológicas tornaram Moby Dick um clássico instantâneo da minha prateleira. Os paralelos com Tubarão, de Benchley e Spielberg, também, são motivações para maior envolvimento com este volumoso clássico da literatura estadunidense.
.
Crime e Castigo
Преступление и наказание | Fiódor Dostoiévski | ?? 1866
Um marco na minha formação como leitor e professor de Literatura. A história de Raskólnikov envolve temas que me atraem, como o existencialismo e a religião. A cena do assassinato envolvendo os protagonistas e a agiota é um dos monumentos literários, em meu ponto de vista, mais cinematográficas que já li. O escritor russo não só “pinta” ou “fotografa” a cena, mas entrega uma página de roteiro cinematográfico de primeira linha. Um livro obrigatório e inesquecível. Não é a toa que já foi utilizado por nomes como Woody Allen, um dos melhores diretores da contemporaneidade..
.
O Primo Basílio
Eça de Queirós | ?? 1878
A escrita imersiva de Eça de Queirós é redundante em alguns trechos, mas não há como ficar incólume ao desenvolvimento crítico da história da protagonista Luísa, antecipação para os ideais de amor e paixão que o autor radiografou na virada do século XIX, mas sobrevivem ainda hoje, nos tempos hipermodernos. Os desdobramentos da tensão, o realismo em sua apresentação crua e dolorosa tornaram o romance uma das leituras mais envolventes em marcantes enquanto leitor e professor de Literatura.
.
Vidas Secas
Graciliano Ramos | ?? 1938
Inesquecível porque disseca um tema clichê, ou seja, a seca nordestina, com maestria. Os capítulos são como contos independentes e os personagens bem desenvolvidos. Vidas Secas é um dos poucos retratos que apontam os ícones nordestinos que surgiram em Os Sertões, de Euclides da Cunha, sem recorrer ao lugar comum e ao novelístico. Excelente radiografia da literatura e do contexto histórico brasileiro dos anos 1930.
.
A Vida Como Ela É
Nelson Rodrigues | ?? 1961
Contos que revelam o lado mais “obscuro” da mente humana. Traição, assassinato, suicídio, desejos sexuais e outros temas considerados tabus ainda na atualidade. Por conta da sua carreira como jornalista policial, Nelson Rodrigues registrou alguns casos no formato literário e nos fornece uma leitura abissal e assustadora da vida como ela realmente é..
.
Tubarão
Jaws | Peter Benchley | ?? 1975
A forma descritiva de Peter Benchley ao longo dos capítulos, do primeiro ao ataque ao desfecho hiperbólico, manteve Tubarão em minha lista das leituras mais envolventes. Conferido muitos anos depois da exposição excessiva ao filme de Spielberg e seus derivados, conhecer o desenvolvimento da história pelo ponto de partida foi uma contribuição incrível para minha formação intelectual. Há personagens com bom desenvolvimento, subtexto sexual latente e discussões políticas intrigantes, materiais que não foram todos levados para a famosa versão cinematográfica.
.
Candyman
The Forbidden | Clive Baker | ?? 1985
O conto de Clive Barker é uma narrativa assustadoramente convincente, mesmo se tratando de um enredo sobrenatural. É a saga de uma mulher obstinada que vê o seu tema de pesquisa se tornar o maior pesadelo de sua vida, tomada pelos horrores da lenda urbana em torno do “homem do gancho”. Ela perde a sua sanidade, prestígio acadêmico e se transforma numa lenda tão densa quanto a que pesquisava. É incrível a maneira como o narrador nos faz mergulhar nesta história de horror e melancolia.
.
O Silêncio dos Inocentes
The Silence of the Lambs | Thomas Harris | ?? 1988
Conheci primeiro todos os filmes da série. A leitura do romance foi recente. Empolgante, ultrajante e intensa. Thomas Harris descreve as situações, aproveita muito bem o clima e trava um dos maiores encontros de batalha psicológica de todos os tempos: Clarice Sterling e Hannibal Lecter. Suspense na medida certa, uso equilibrados de adjetivos e ação bem coordenada.
FREDERICO FRANCO
.
As Flores do Mal
Les Fleurs du Mal | Charles Baudelaire | ?? 1857
Censurado no ano de seu lançamento, o livro As Flores do Mal é a grande contribuição do francês Charles Baudelaire para a poesia simbolista. Considerada imoral pelo jornal Le Figaro, a obra de Baudelaire vai além das simples convenções poética-narrativas. Seus versos com métrica extremamente regrada não oprimem a qualidade simbólica e mística dos poemas do escritor francês. Diferente da poesia de Ginsberg, na qual a crueza da realidade é a protagonista, as construções em As Flores do Mal são abstratas e, sobretudo, sinestésicas. Neste, o leitor é conduzido ao dionisíaco universo de Charles Baudelaire.
.
Notas do Subsolo
Записки из подполья | Fiódor Dostoiévski | ?? 1864
“O homem é um déspota por natureza” diria o próprio Dostoiévski em O Jogador. Aqui, em Notas do Subsolo, o ser humano é analisado e, ao fim da análise, apresenta-se mais vil do que o esperado. Após receber uma grande herança, um ex-funcionário público de São Petersburgo se muda para os subúrbios da cidade. A partir disso, regurgita seu pensamentos mais viscerais a respeito do homem do século XIX – apontando este como um ser mesquinho e propositalmente prepotente. Narrado todo em primeira pessoa, o livro conduz a entender a falta de vontade de potência do protagonista perante a vida; ao mesmo tempo em que despeja ódio contra o outro, sente-se incapaz agir contra este. O personagem de Dostoiévski é, portanto, nada mais do que aqueles homens que tanto criticou por suas condutas torpes. E é apenas imerso em seu subsolo que expõe aquilo que na superfície sempre escondeu.
.
Esaú e Jacó
Machado de Assis | ?? 1904
É quase clichê afirmar que Machado de Assis é o grande nome da história literatura do Brasil. Com breves referências à história de Caim e Abel, Esaú e Jacó é uma grande alegoria política perante o tempo da proclamação da república. Dois irmãos gêmeos, Pedro e Paulo, são seguidos pelos narradores – dois narradores, marca registrada de Machado de Assis – durante diversos períodos de suas vidas; um simbolizando a monarquia, o outro a república. Com a maestria corriqueira, o autor cria personagens dúbios, que colocam suas opiniões políticas em jogo a todo instante. Ainda, na conclusão final, Machado de Assis confirma: espectros políticos que se assumem como opostos, nem sempre o são; às vezes, tudo se resume a um patético conflito de interesses.
.
Dublinenses
Dubliners | James Joyce | ?? 1914
Ler (e entender) James Joyce é, definitivamente, um dos maiores desafios da humanidade. Sempre retornando à sua amada Irlanda, no livro Dublinenses, o escritor presa por um realismo estilizado – tornando mágico cada momento da vida dos ilustres cidadãos de Dublin. Mesmo com esse caráter, Joyce não deixa de lado marcas de sua literatura moderna e revolucionária: o fluxo de consciência e o discurso indireto livre. Seu estilo de escrita despudorado, que renuncia regras como pontuação e parágrafos, foi de fundamental importância para o surgimento de outros gênios da literatura mundial, como Thomas Pynchon e Jack Kerouac.
.
O Lobo da Estepe
Der Steppenwolf | Hermann Hesse | ?? 1927
Vencedor do Prêmio Nobel em 1946, Hermann Hesse é considerado um dos mais celebrados autores alemães do século XX. Criado em um família cristã, Hesse, além de ser um total descrente no futuro da humanidade, foi adepto à filosofia budista – tendo, inclusive, escrito o romance Sidarta, inspirado na vida de Sidarta Gautama. Porém, é em O Lobo da Estepe que imprime suas principais ideias de vida. Contando a odisseia do deprimido Harry Haller, espécie de alter-ego de Hesse, o livro é uma jornada para o autoconhecimento do próprio autor. Ao beber da fonte da literatura romântica (excepcionalmente na obra de Goethe), Hesse constrói um universo bucólico, que expressa a decrépita mente de seu protagonista Harry. Explorando, também, elementos da psicanálise freudiana, O Lobo da Estepe é, sobretudo, uma alucinógena viagem pelo grande Teatro Mágico que é a cabeça de Hermann Hesse.
.
A Peste
La Peste | Albert Camus | ?? 1947
A modernidade literária é um movimento regido pelo pessimismo e críticas ao futuro da humanidade. Cioran, Sartre e, antes deles, o próprio Nietzsche, são pilares dessa vertente de pensamento. Contudo, Albert Camus e a filosofia do suicídio vão em além. Aqui, em A Peste, o autor deixa de lado o puro pessimismo e constrói uma elaborada crítica social contra as posições da França perante os horrores do holocausto na Segunda Guerra Mundial. Trabalhando essa ideia a partir de uma suposta peste negra na Argélia, Camus desenvolve um universo caótico e de histeria coletiva – repleto de ratos e política.
.
Bestiário
Bestiario | Julio Cortázar | ?? 1951
A Argentina é o berço dos grandes autores de ficção da América Latina, tendo Cortázar como grande destaque. Em Bestiário, o autor reúne seus mais intrigantes contos, como Carta à uma senhorita em Paris e Ônibus. Utilizando-se de seu gênero usual, o realismo fantástico, Cortázar abusa de simbolismos e, ainda mais, de seres e situações surrealistas. Explorando sempre o desconforto psicológico de seus personagens, o escritor argentino destaca-se por estudar tais condições por meio do surreal. No primeiro conto citado, o narrador, sufocado por coelhos que ele próprio vomitou, simboliza o abafamento da personalidade humana durante a modernidade da cidade de Buenos Aires durante a modernidade.
.
O Uivo
The Howl | Allen Ginsberg | ?? 1956
Se As Veias Abertas da América Latina é o livro síntese da história da América Latina, O Uivo é um grande escárnio sobre os Estados Unidos da América. Em sua épica coletânea de poemas, Allen Ginsberg aponta ao leitor tudo aquilo que o governo de seu país omite. Durante o macartismo, Ginsberg ousa em declamar publicamente poemas sobre nudez, drogas e homossexualidade. Sem buscar nenhum primor métrico em seus versos, o autor preocupa-se muito mais com seu acelerado ritmo e sua poderosa mensagem. Allen Ginsberg, como disse em uma entrevista à TV Globo, afirma em O Uivo e seus outros poemas, que sua arte é a vida; e sua vida é a própria arte. Por isso, surge, no livro, uma poesia contrária àquilo que prega o American Way of Life.
.
Um Parque de Diversões da Cabeça
A Coney Island to Mind | Lawrence Ferlinghetti | ?? 1958
O editor dos beatniks, Lawrence Ferlinghetti, é um sujeito ímpar na cultura estadunidense. A Coney Island to Mind é a grande coletânea de poemas do autor, reunindo suas obras primas. Descrevendo sua frenética vida, regida de jazz e benzedrina, Lawrence Ferlinghetti é capaz de transportar o leitor para os bares que frequentava e, também, para o topo do El. Não obstante, o livro ainda contém poemas que desafiavam as normas do período pós-guerra dos EUA – tendo sido considerado uma obra que ataca as grandes corporações. Hoje, Ferlinghetti beira os 100 anos e ainda é dono de sua livraria, City Lights Bookstore; mas sua poesia continua jovem e efervescente.
.
As Veias Abertas da América Latina
Las Venas Abiertas de América Latina| Eduardo Galeano | ?? 1971
A América Latina é um continente amaldiçoado; invadido por outros que, sem piedade, abriram suas veias e derramaram seu próprio sangue em sua terra. O ícone uruguaio Eduardo Galeano é o responsável por defender que nada neste continente surgiu sem o sangue de milhares de nativos. Em As Veias Abertas da América Latina, o escritor passa por toda a história do continente latinoamericano desde a colonização ao início do turbulento período ditatorial. Proclamando um discurso anti-capitalista – costumeiro na obra de Galeano, principalmente em O Teatro do Bem e do Mal – o autor descreve que, em se tratando de América Latina, o estrangeiro, de Pizarro aos Estados Unidos, é sempre um colonizador em busca de terras.
RODRIGO PEREIRA
.
O Jogador
Игрок | Fiódor Dostoiévski | ?? 1867
“Esse foi um que li e pensei ‘por que demorei tanto para ler algo do Dostoiévski?’”. Isso foi uma parte do que coloquei ao descrever minha experiência com o livro na postagem de melhores leituras de 2019 para o site. Não tenho muito mais o que acrescentar. O russo é um dos gigantes da literatura e não é por acaso.
.
Dom Casmurro
Machado de Assis | ?? 1899
Um dos maiores clássicos da literatura brasileira e considerado por muitos como a principal obra de Machado de Assis não fica de fora da minha lista de favoritos. Responsável por gerar intermináveis discussões acerca da traição de Capitu para com Bentinho, Dom Casmurro é encantador do início ao fim e é impossível largar o livro antes de terminar a leitura. E Capitu não traiu Bentinho.
.
A Metamorfose
Die Verwandlung | Franz Kafka | ???? 1915
Clássicos são clássicos. Eu, particularmente, tenho um interesse enorme por eles. Descobrir porque algo escrito às vezes mais de um ou dois séculos atrás continua relevante nos dias de hoje é algo que muito me interessa. Fora que a qualidade, quase sempre, é alta. A Metamorfose não é diferente. Após começar a leitura, devorei a história em pouquíssimo tempo, algo de poucas horas, e finalmente compreendi a razão pela qual Kafka teve seu sobrenome transformado em adjetivo.
.
O Hobbit
The Hobbit | J.R.R. Tolkien | ?? 1937
Como escrevi na publicação sobre os diretores favoritos aqui do Plano Crítico, mundos fantásticos me encantam, seja qual for o formato do conteúdo. Imaginem, então, o quanto fiquei encantado com as personagens e o universo criado por J.R.R. Tolkien ao ler O Hobbit. Assim como Futebol ao Sol e à Sombra e História da Sua Vida e Outros Contos, esse foi um livro que li no transporte público durante as idas e vindas do trabalho. Minha única decepção é a adaptação cinematográfica de Peter Jackson não chegar sequer vinte mil léguas próximo à qualidade da obra original.
.
Vidas Secas
Graciliano Ramos | ?? 1938
O quanto fiquei encantado com a escrita de Graciliano Ramos quando li Vidas Secas é imensurável. A forma como ele conduz a história, além de sua descrição dos fatos e acontecimentos, faz com que quase consigamos sentir o calor do sertão e depois a chuva torrencial que lava tudo pela frente. É uma obra dura e que retrata uma difícil realidade, mas igualmente encantadora e bela.
.
Crônica de Uma Morte Anunciada
Crónica de una Muerte Anunciada | Gabriel García Márquez | ?? 1981
Se bem me lembro, esse foi o primeiro livro que li por conta de uma matéria na universidade. A matéria era sobre língua portuguesa e faríamos uma prova sobre essa obra de Gárcia Márquez. Agradeço à minha professora até hoje por possibilitar esse primeiro contato com a bibliografia de Gabo. Sua escrita leve faz com que a história, meio tragicômica, nos prenda do início ao fim e nos desperte a curiosidade não por um final mirabolante (já que o título entrega o maior acontecimento), mas para descobrir as razões que levaram até essa morte e porque ninguém tentou impedi-la. Simplesmente maravilhoso.
.
O Conto da Aia
The Handmaid’s Tale | Margaret Atwood | ?? 1985
Assim como alguns outros livros dessa lista, O Conto da Aia foi uma leitura recente, de 2019, e que entrou para a minha seção de favoritos automaticamente após a leitura. Os 35 anos que separam o nosso tempo do ano de publicação da obra de Atwood parece ter sido o tempo quase necessário para alcançarmos o futuro distópico idealizado pela autora. Claro, não vivemos tempos exatamente iguais ao do livro, mas é possível identificarmos vários pontos em comum entre nosso mundo real e a ficção da canadense. De qualquer forma, é uma história incrível.
.
Futebol ao Sol e à Sombra
El Fútbol a Sol y Sombra | Eduardo Galeano | ?? 1995
Esse livro me acompanhou durante algumas viagens de idas e vindas para o trabalho alguns anos atrás. O primeiro que li de Eduardo Galeano é também um de seus mais famosos escritos, talvez somente atrás de As Veias Aberta da América Latina, e é uma das obras literárias que mais me identifico até hoje. Toda a sua visão romântica e nostálgica sobre o futebol, algo cada vez mais raro nos dias dos super atletas e cumpridores de função sem grande capacidade cognitiva, é um deleite completo para qualquer um que ame o esporte.
.
História da Sua Vida e Outros Contos
Stories of Your Life and Others | Ted Chiang | ?? 2002
Essa coletânea de oito textos do autor possui o conto que originou A Chegada, meu filme favorito da vida, e somente por isso merece figurar entre meus livros preferidos. No entanto, a obra é muito mais, contendo histórias tão incríveis e maravilhosas que, enquanto me deliciava com a leitura, pensava: Denis Villeneuve, adapte para o cinema tudo o que está aqui, por favor. É um prato cheio para quem gosta de ficção científica.
.
Hibisco Roxo
Purple Hibiscus | Chimamanda Ngozi Adichie | ?? 2003
Outro livro que foi leitura recente e entrou para minha lista de favoritos. Chimamanda era uma autora que há muito desejava conhecer. Depois de ler seu Sejamos Todos Feministas, minha vontade de ler mais suas obras só aumentou. Dentre suas aclamadas obras, Hibisco Roxo foi uma recomendação de uma conhecida que falou tão bem do livro que fui obrigado a ir atrás. Zero arrependimento. Uma história cheia de contradições, intolerâncias e ódio, mas também de amor, felicidade e crescimento. .
PEDRO PINHO
.
Crime e Castigo
Преступление и наказание | Fiódor Dostoiévski | ?? 1866
Estou positivamente convencido de que esse é o maior livro de todos os tempos. Maior no sentido de que revela maior complexidade todas as vezes em que volta a minha cabeça. E Crime e castigo volta a minha cabeça mais do que qualquer outro resultado da criatividade humana, seja em filosofia, literatura ou cinema. Assisto a um filme, isso é Dostoiévski! Leio um livro, isso é Dostoiévski! A literatura russa do final do século XIX foi algo sem igual, e continua sendo até então.
.
Um Inimigo do Povo
En Folkefiende | Henrik Ibsen | ?? 1882
Não só o melhor Ibsen que já li (apesar de não ter lido muitos), bem como a melhor peça teatral também. É engraçado, enervante e incrivelmente a frente de seu tempo. Ibsen institui aqui um debate que se tornaria, ele mal imaginava, incrivelmente mais complexo, entretanto que já encontrava aí as suas raízes fundamentais. É sobre preservação ambiental, mas também é sobre anarquia, democracia e as dificuldades da ciência em atingir a sociedade.
.
A Morte de Ivan Ilitch
Смерть Ивана Ильича | Liev Tolstói | ?? 1886
Recentemente eu li Anna Karenina, um romance de suas intimidadoras oitocentas páginas e que, porém, é apenas tão profundo quanto essa novela modesta que Tolstoi escreveu após terminar seus livros mais amplamente celebrados como cânones da literatura ocidental. É sucinto, mas ao mesmo tempo angustiante. Sua relação entre brevidade e força narrativa, conquistada principalmente pela sua brilhante abordagem da morte, são alvos de inspiração para escritores até os dias de hoje. Ele me incentivou a mergulhar ainda mais profundamente na literatura russa, um universo que hoje me sinto simultaneamente confortável e hesitante: afinal, Ivan Ilitch surpreende a qualquer desavisado que vá esperando uma novela prosaica, inclusive a mim.
.
Contos de Imaginação e Mistério
Tales of Mistery and Imagination | Edgar Allan Poe | ?? 1919
Poe foi responsável por me apresentar a literatura. Acho que a maioria das pessoas lembra do momento em que começou a trilhar seu caminho pelos livros de maneira autônoma. No meu caso, foi o momento em que li esse livro. Cheguei em Poe por sua notoriedade como mestre do horror e da fantasia, e continuei a revisita-lo com o passar do tempo pela sua profunda dimensão humana.
.
Ficções
Ficciones | Jorge Luis Borges | ?? 1944
Até hoje minha referência máxima de um livro de contos. É claro, não só por isso que Borges é grandioso, mas principalmente por que, de fato, não há nada formalmente semelhante às coisas que esse argentino escreveu. As curtas narrativas que compõem Ficções e outros de seus livros são as histórias mais citáveis dentro da literatura: são simples, breves e sobretudo fantásticas, no entanto, incrivelmente associáveis. Além de tudo, é a mais rica imaginação dentro do realismo fantástico latino-americano, composta por autores que também significam muito pra mim, o que demonstra seu poder como escritor, assim como de Ficções, sua Magnum opus.
.
O Complexo de Portnoy
Portnoy’s Complaint | Philip Roth | ?? 1969
A literatura norte-americana produziu muitos clássicos que protagonizam jornadas de crescimento/amadurecimento. Tom Sawyer e Huckleberry Finn são verdadeiros patrimônios culturais. Mas nenhum deles consegue combinar erudição e entretenimento como consegue Philip Roth no que eu diria ser seu livro mais autoral. É o livro mais engraçado que já li, ao mesmo tempo em que é o mais cru apresentando os problemas da juventude de quem não consegue se encaixar. Sem nunca apelar, importante dizer, para qualquer sombra de vulgaridade formal, como o faz alguns dos romances que se identificam por essa proposta.
.
As Cidades Invisíveis
Le Città Invisibili | Italo Calvino | ?? 1972
Talvez o livro mais único dessa lista. Nunca voltei a encontrar algo semelhante, nem na própria obra de seu autor – o que não é algo necessariamente bom. Marco Polo, o famoso viajante veneziano, relata e descreve suas visitas às inacabáveis cidades do império tártaro, para o próprio imperador Kublain Khan. A premissa não promete muita coisa, contudo, a prosa de Calvino a engradece com uma abordagem incomum. A sua construção narrativa intermitente, serena, sem qualquer pretensão de arco dramático ou coisa que o valha, estabelece aos poucos analogias extremamente significativas: as cidades são aqui símbolos complexos e inesgotáveis da existência humana.
.
Ruído Branco
White Noise | Don DeLillo | ?? 1985
Ao escrever essa lista, quis adotar como critério livros que me marcaram pontualmente em determinados aspectos. Seja uma escrita única e inovadora, uma história bem estruturada, não-ficções que apresentam informações de maneira orgânica, etc. Em Ruído Branco, encontrei o protagonista exemplar. Todos os aspectos de sua vida refletem o tema da história. E o tema principal de Delillo, não só nesse livro como em sua obra em geral, é a morte e o medo de morrer. É importante saber o mínimo sobre esse romance – recomendo que nem ao menos leiam a sinopse. Mas posso dizer que se identificar com Jack é um caminho sem volta de autorreflexão.
.
História do Cinema: Dos Clássicos Mudos
ao Cinema Moderno
The story of Film – From Silent Classics to Modern Movies | Mark Cousins | ?? 2004
Esse é uma joia rara! A coisa mais fácil de encontrar atualmente são cursos e livros sobre a história do cinema que, ou são enciclopédicos demais para possuírem uma visão propositiva e apresentarem algo significativo, ou são apenas comentários esparsos sobre o encontro dessa arte com a sociedade, com a política, etc. Mark Cousins vai muito além disso, e escolhe o liame ideal para se contar a história de uma arte: suas inovações através do tempo. Não é só um livro de história, é também uma aula de linguagem cinematográfica, orquestrada através da sua desconstrução total – Cousins nos leva conscientemente até a data em que os fundamentos do cinema ainda não existiam. Todo mundo deveria ler esse livro logo que começa a se interessar por cinema, e eu dei a sorte de ter feito isso.
.
Em Busca do Real Perdido
À la Recherche du Reél Perdu | Alain Badiou | ?? 2015
O manifesto não oficial do que se poderia chamar atualmente de uma new left. Ao escrever sobre a busca pelo real na política, Badiou acaba por sintetizar o ethos da atual geração de intelectuais de esquerda: as influências de Jacques Lacan, o legado do materialismo histórico, as indispensáveis críticas ao capitalismo, etc. A multidisciplinariedade não fica apenas no título (uma óbvia alusão a Proust), passeia também por toda a prosa do autor, principalmente em seus exemplos didáticos que tornam o raciocínio claro e pedagógico, e ainda sim não menos complexo. Para mim, foi um importante norteador para as principais discussões da nossa época, assim como um essencial convite para me aprofundar nas diferentes abordagens possíveis. A forma como toma, no último capítulo, o poema de Pasolini emprestado é algo de gênio.