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Crítica | Dente por Dente

por Guilherme Coral
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estrelas 2,5

Após nos chocar com Moebius, exibido no Festival do Rio 2013, Kim Ki-Duk, opta por um filme mais comportado, mas imprimindo nele suas características marcas. Assim como sua obra anterior, Dente por Dente trabalha a fundo a psique humana, um estudo da sociedade sul-coreana, que se estende para qualquer outro país capitalista.

A projeção já começa nos deixando na beirada da cadeira ao exibir, nos minutos iniciais, a cena de um assassinato de uma jovem estudante. O corte, então, nos leva para um restaurante, onde um casal discute sobre os valores pessoais de cada um. Você cumpriria ordens mesmo que estas vão de encontro às suas crenças? Ao deixar a namorada em casa, o jovem – bem vestido – é sequestrado por um grupo das forças especiais. Levado para uma sala mal-cuidada, o homem é torturado até assinar um papel confessando o assassinato da estudante.

Kim ki-Duk, então, nos mostra os envolvidos no crime serem, um por um, abduzidos e torturados de diferentes maneiras até confessarem. Intercalando tais cenas, o diretor nos mostra um trecho da vida de cada um dos sequestradores, nos revelando o porquê de cada um estar envolvido naquele esquema obscuro. A obra ainda utiliza o interessante recurso de repetir o mesmo ator, Kim Young Min, em diferentes sequências. Ele interpreta o primeiro sequestrado e está presente nas cenas individuais de cada um dos membros da suposta força especial, como o indivíduo que traz a miséria para a vida destes.

Essa simples escolha deixa claro a forma como cada um dos sequestradores enxergam suas vítimas, tornando todo aquele esquema algo pessoal e não para tornar o mundo um lugar melhor como, muitas vezes, repetem para si mesmos. Esse caráter de vingança que a obra adota é deixada ainda mais clara pela retratação do líder dos abdutores, com Don-Seok Ma no papel. De fato, aqui temos o personagem mais interessante do longa, que apresenta diálogos existenciais questionando a injustiça da sociedade sul-coreana. Até quando eles, mais pobres, devem se sujeitar aos caprichos da classe alta? Essa luta de classes é ainda ironizada pela representação das forças atuais, que mais de uma vez grita “acabar com o comunismo!”.

As diferenças entre ambos os grupos, porém, vão minguando com o passar da projeção e os próprios envolvidos enxergam isso. Kim Ki-Duk, então, refuta a Lei de Talião. Utilizando a violência das torturas (que não são tão perturbadoras quanto seu filme anterior), o diretor procura mostrar o incessante ciclo de agressão que a vingança gera. A justiça que o líder dos sequestradores tanto almeja está sendo jogada fora por ele e estamos ali para comprovar.

Através do trabalho fotográfico e de edição do próprio Ki-Duk, somos transportados diretamente para dentro da narrativa. Com uma câmera em constantes e discretos movimentos, temos a nítida impressão de atuarmos como mais um personagem ali dentro, um que apenas observa. A montagem, por sua vez, falha criando uma enorme confusão em diversos trechos e acaba por revelar os problemas do roteiro, que carece de uma maior coesão. Esse fator enfraquece significativamente o argumento central da obra, tornando-o superficial e, em última análise, artificial.

Por mais que Dente por Dente consiga estabelecer um clima constante de tensão e agonia, seu lado filosófico soa simples demais, com pontos que jamais se concretizam. Kim Ki-Duk não consegue repetir com precisão o que alcançara em Moebius ou até mesmo atingir a qualidade de Pietá. O que temos é um filme que entretém, mas que conta com um potencial mal-utilizado.

Dente por Dente (Il-dae-il – Coréia do Sul, 2014)
Direção:
Kim Ki-Duk
Roteiro: Kim Ki-Duk
Elenco: Dong Seok-Ma, Young-Min Kim, Yi-Kyeong Lee, Dong-in Jo
Duração: 122 min.

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