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Crítica | Verão Violento

por Luiz Santiago
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O amor frustrado e a melancolia estão entre os temas centrais da filmografia de Valerio Zurlini. Diretor de documentários antes de estrear nas ficções em 1954, Zurlini foi eclipsado pelo trabalho de outros grandes realizadores de seu país (Fellini, Antonioni, Visconti, Rossellini), em atividade no mesmo período que ele. Chamado de “poeta da melancolia”, Zurlini renegou sua primeira película, Quando o Amor é Mentira (1954), e cinco anos depois dirigiu o que seria uma remissão para consigo mesmo, Verão Violento, uma história de amor ambientada em 1943, período crítico da Itália em meio à Segunda Guerra Mundial.

De orientação política esquerdista, mesmo sendo de família rica (assim como Visconti), Zurlini conseguiu trazer um pouco do horror da guerra e a dor de um amor impossível para Verão Violento, cujo cenário litorâneo da primeira parte esboça uma realidade quase próspera e muito alienada de um grupo de jovens burgueses empenhados em esquecer que havia uma guerra em marcha. Em um pequeno espaço de tempo, porém, a escassez de alimentos e os ataques aéreos tomam o lugar das festas em meio à guerra “que não estava lá”, e é quando essa ideia se constrói que Zurlini deixa a crítica social de lado e parte para dar atenção aos dilemas humanos.

O amor entre Carlo e Roberta é o típico “amor de guerra”, difícil de se concretizar e permanecer por muito tempo. Em interpretação louvável de Jean-Louis Trintignant, Carlo Caremoli é a personificação do jovem antibelicista que por um evento significativo abandona o amor de sua vida para pegar em armas e ir à guerra. Essa modificação política acontece apenas em campo muito pequeno e pessoal. Daí podemos observar que tanto as personagens quanto as histórias de Zurlini são claustrofóbicas, raramente exprimem seus sentimentos, e quando o fazem, é de maneira comedida e amedrontada. O desejo que arde em Carlo e Roberta é quase doloroso para o espectador, porque o casal sofre e raramente se dispõe a viver um único momento de prazer e alegria a sós.

A posição social das personagens e a cartilha de convenções que supostamente precisam seguir são obstáculos morais. A maioria deles sofre por alguma coisa, e em uma análise psicanalítica, encontraríamos motivos de sobre para justificar muitos traços característicos desses indivíduos. Há uma diferença muito grande entre a falsa alegria da primeira parte do filme e a obsessão melancólica da parte final. De alguma forma, essa passagem não é bem arquitetada, falta-nos elementos para juntar as peças, e talvez aí resida a fraqueza do filme. Fraqueza recompensada pela belíssima fotografia, com destaque para a noite na mansão de Carlo, em que ele e seus amigos dançam ao som da música Temptation. Outros destaques fotográficos são as sequências no circo; a angustiante sequência em que Carlo encontra Roberta na noite da manifestação antifascista; e por fim, a sequência do bombardeio aéreo, já no final da película. A música de Mario Nascimebene (que voltaria a trabalhar com Zurlini em A Primeira Noite de Tranquilidade) é de grande beleza, especialmente o tema do filme, uma peça militar caótica e perturbadora.

Verão Violento é um drama intenso sobre um amor impossível, a guerra, e indivíduos afetados pelo destino e por forças sociais imperdoáveis. Sendo um grande amante da arte, Zurlini levaria para o seu cinema uma perfeita imagem estética, algo que se tornaria muito mais evidente em seus filmes seguintes. Embora Verão Violento não seja uma obra prima, é um filme absolutamente bem realizado e intrigante. Se hoje sua trama parece enredo de novelas, o tratamento dado por Zurlini em nada se assemelha ao ridículo da teledramaturgia; vai além, indica uma posição política, uma classe social, um cinema profundo e triste. Se o diretor não é conhecido por ter inovado ou militado na ala das vanguardas do cinema italiano, ele encerra sobre si uma obra de egos feridos, de beleza estética angustiante e de desesperança, ou seja, um reflexo do espírito humano em tempos de mortandade, onde qualquer escolha é uma grande renúncia.

Verão Violento (Estate Violenta, Itália, França, 1959)
Direção: Valerio Zurlini
Roteiro: Valerio Zurlini, Suso Cecchi D’Amico e Giorgio Prosperi
Elenco: Eleonora Rossi Drago, Jean-Louis Trintignant, Lilla Brignone, Raf Mattioli, Cathia Caro, Giampiero Littera, Bruno Carotenuto, Tina Gloriani, Enrico Maria Salerno, Jacqueline Sassard
Duração: 100min.

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