Hoje é muito comum vermos eventos que unem músicos dos mais diversos gêneros para apresentações filmadas e distribuídas via satélite para todo o mundo. Do mesmo modo, é mais fácil chamar a atenção da mídia e da crítica para a apresentação de novas tendências musicais, novos nomes, e tornar isso algo significativo para um determinado local ou para uma época – algo entre a Virada Cultural de São Paulo e o “fenômeno Adele” no mundo. Alguns eventos musicais dessa safra do século 21 chegam a ser comparados ao icônico Woodstock Music & Art Fair, salvo o anacronismo e as questões político-ideológicas que nos separam daquela explosão de paz, amor e música ocorrida em agosto de 1969 em Nova Iorque e retratada mais recentemente no filme de Ang Lee, Aconteceu em Woodstock (2009).
Hoje, independente do gênero musical ou das condições financeiras de publicidade massiva do artista, a era da informática e dos downloads criou a possibilidade de espectadores ao redor do mundo conhecerem o trabalho de artistas que de outra forma demorariam muito mais tempo para serem conhecidos. Da mesma forma, é muito mais fácil divulgar preferências, encontrar os que partilham do mesmo gosto e criar uma comunidade de interesses, objetivo máximo das redes sociais. Com isso, numa era de compartilhamento e multimeios de produção cultural, é de se estranhar o quão importante foi para a história da música e para a história de diversos artistas, festivais como o Newport Jazz Festival.
Criado em 1954 por George Wein e Elaine Lorillard, o Newport Jazz Festival contou com um desfile de estrelas de todos os gêneros ligados à música negra dos Estados Unidos, e representou um momento de excitação cultural em suas áureas edições. Em 1958, os diretores Aram Avakian e Bert Stern documentaram a edição do festival no filme Jazz on a Summer’s Day, um documentário musical que hoje é considerado pela National United States Film Registry um representante da cultura e da história local dos Estados Unidos. Com imagens alternadas entre as apresentações dos artistas e cenas da competição da Copa América regata de iatismo, o espectador é presenteado com uma das melhores representações de um festival desse porte.
Os diretores optaram por mostrar as principais apresentações na íntegra, prestigiando os primeiros planos dos artistas no palco em diversos ângulos. Paralelamente, vemos imagens da regata, do mar, e a reação da plateia em diversos momentos dos shows, bem como a preparação dos músicos. Ao fazer um recorte muito rico de música e imagem, a edição inteligente de Aram Avakian cosnegue abordar de maneira criativa, divertida e muito instigante toda a região em que o Festival acontece, e o mais interessante é que o documentário conta com algumas cenas visivelmente ensaiadas, o que torna tudo ainda mais louvável, pela brincadeira entre o que é realidade e o que é ficção em um filme sobre jazz e blues, numa época em que o gênero era considerado música do diabo nos Estados Unidos.
Muito mais que um excelente documentário musical, Jazz on a Summer’s Day é um retrato histórico de um acontecimento cultural. Um prato cheio para a micro-história, uma benção para os ouvidos, uma beleza para os olhos. O filme é imperdível. Quem puder assista-o!
Jazz on a Summer’s Day – EUA, 1959
Direção: Bert Stern
Roteiro: Albert D’Annibale, Arnold Perl
Elenco: Jimmy Giuffre, Thelonious Monk, Henry Grimes, Sonny Stitt, Sal Salvador, Anita O’ Day , George Shearing, Dinah Washington, Gerry Mulligan, Big Maybelle, Chuck Berry, Chico Hamilton, Louis Armstrong, Jack Teagarden, Mahalia Jack, Buck Clayton, Jo Jones, Armando Pareza