Eu sou de uma geração que cresceu lendo Turma da Mônica e outros personagens de Mauricio de Souza. Não era a única leitura mas era a mais acessível, mais barata e uma das mais divertidas – tinha também os quadrinhos da Disney, e eu tenho ótimas lembranças de personagens como Pateta e Tio Patinhas, mas a maior parte do tempo reinavam os tão queridos personagens brasileiros.
Já na adolescência meu foco de leitura mudou completamente, e mesmo que não tivesse abandonado a Turma, ela não tinha mais minha total atenção. Mas sabe como é, encanto de infância é uma outra história, e essas personagens sempre estiveram em alta conta para mim. A despeito das críticas que hoje eu possa fazer ao tipo de exercício ideológico, de publicação e engessamento artístico que esses quadrinhos possam ter contribuído ou erguido no Brasil, devo dizer que a Turminha sempre esteve entre as minhas HQs favoritas.
Mas aí veio a TM Jovem e minha negação foi quase imediata. Como disse nas críticas de Tesouro Verde e Bullying, meu interesse nessa nova fase da TM é bem específico, só confiro edições que tratam de temas que considero interessantes, como nos exemplos citados acima.
Foi por isso que quando eu soube da reformulação do Chico Bento, fiquei com os dois pés atrás, e muito relutante, comprei a 1ª revista.
E não me arrependi.
A história não traz a ensandecida característica da TMJ, e o Chico Bento permaneceu com sua inocência característica, seu ar matuto, seu sotaque (administrado com menos sucesso que o Cebola da TMJ) e seu amor pelo campo. Na edição nº1 ele está indo para a faculdade, e mesmo que seja uma revista introdutória a esse novo universo do Chico, o roteiro de Flávio T. De Jesus consegue um resultado fenomenal, contanto os últimos dias e momento do protagonista em Vila Abobrinha e sua ida para a cidade de Nova Esperança, onde vai estudar Engenharia Agrônoma.
Se estivesse avaliando apenas a edição nº1, certamente a nota seria 4,5/5. Isso porque a estreia de Chico Bento Moço equilibrou bem os momentos familiares, emotivos, amorosos e ainda deu uma base satisfatória para a história que se desenvolveria a partir dali. A paixão de Chico por Rosinha, a eterna paz campesina de Zé Lelé, as ótimas aparições de Hiro, Zé da Roça e da Dona Marocas, agora diretora do Colégio de Vila Abobrinha e a pessoa que divide com Chico Bento um dos momentos mais emocionantes da revista… É uma edição de despedida, mas ao mesmo tempo é uma edição que aponta novos horizontes para cada uma das “crianças” da roça.
Na edição nº2, com roteiro de Petra Leão, temos os primeiros dias de Chico Bento na cidade de Nova Esperança e o seu desespero para se adaptar a esse novo e diferente mundo. O tema da saudade volta, mas não com a delicadeza que tivemos na revista anterior – e acredito que não caberia aquele ar quase lírico nessa nova realidade –. Chico está numa república e divide apartamento com três garotos de personalidades completamente diferentes. Quem já morou, conhece ou visitou repúblicas universitárias sabe que Petra Leão conseguiu criar um ótimo ambiente (porém “bem comportado”) para os estudantes. Acredito que sendo uma revista do Chico Bento, até faz sentido essa visão de bom-mocismo que a edição tem, mesmo que trabalhe com situações nada agradáveis para quem tem que dividir apartamento com outras pessoas.
Chico Bento Moço é uma revista que merece ser conhecida. Embora a segunda edição não tenha a qualidade literária da primeira, ainda é uma boa revista e não trai o que foi levantado anteriormente. Dessas reformulações feitas por Mauricio de Souza em seus personagens, Chico Bento foi o que mais manteve suas características originais, mesmo que ele seja um rapaz bonitão e musculoso (como podemos ver na primeira revista), os dentinhos salientes permanecem lá e a alma matuta da personagem também. É o mesmo Chico que conhecemos, só que no corpo de um rapaz de 18 anos. Vale a pena conhecer.
Chico Bento Moço #1 e 2 – Brasil, 2013
Roteiro: Flávio T. De Jesus e Petra Leão
Arte: José Aparecido Cavalcante
Arte-final: Cristina H. Ando, Jaime Podavin, Rosana G. Valim, Tatiana M. Santos, Wellington Dias
Editoras: Mauricio de Souza, Panini Comics e Planet Manga
Páginas: 98 (cada número)