Embora aponte para um caminho imprevisível que deseja seguir – algo que o marketing também já antecipou – Acompanhante Perfeita tenta se manter na linha de um suspense subversivo que explode para os amantes do gênero. Melhor do que ser comparado a um derivado de M3GAN, Drew Hancock prefere imaginar seu filme como algo extraído de Ex_Machina, mesmo que se encaixe como um episódio menos inspirado de Black Mirror para falar das relações entre pessoas e a inteligência artificial, partindo da simples premissa que inverte os papéis: a pessoa mais empática, sentimental e humana é uma robô. Antes de revelar sua principal reviravolta para quem foi conferir o longa às cegas, o estreante cineasta americano flerta com a possibilidade de ser um terror psicótico como a série Você ou whodunit entre casais na casa de um bilionário, mas se contenta em fazer do seu debut uma grande quebra de expectativas.
Não é preciso ir muito longe para entender que Hancock utiliza o plano de fundo sobre IA e humanos para falar sobre relacionamentos tóxicos através de Iris (Sophie Tatcher) e Josh (Jack Quaid) e para isso o cineasta transita entre várias escolhas familiares do gênero a fim de aplicar a invertida premissa da “robô mais humana” que atrai a empatia do público, o que dá para reconhecer a típica trajetória traçada por uma final girl em um terror de sobrevivência. Mesmo com a ideia de esteja brincando esses cenários num período em que a trama sobre IA está em alta, falta aqui a urgência na direção de Hancock ao brincar com as possibilidades. Um exemplo disso é quando a personagem de Tatcher ganha a vantagem de assumir o controle da situação e o quão divertido seria ver o arquétipo da garota sobrevivente pelo ponto de vista de uma robô, agora, indo contra o seu dono mas isso se trata mais de um vislumbre do que uma ideia que o cineasta gostaria de explorar.
Ignorando as escolhas óbvias do gênero que Hancock recorre – como a polícia inútil, a ambientação isolada – Companion funciona bem mais do ponto de vista de um término de relacionamento durante um final de semana que deu errado, ao revelar as facetas por trás dessa relação. E por mais que o Quaid pareça interpretar sempre os mesmos personagens, é graças a dinâmica da trama que o filme se torna divertido, mesmo com o desfecho podendo ser antecipado, o que faz a audiência torcer pelo típico encerramento de um survival horror nessa história protagonizada por uma IA. E embora Hancock não assuma suas inspirações – como se misturar comédia com o que conhece do terror e seus subgêneros fizesse disso algo original – Acompanhante Perfeita compartilha ares de A Garota Ideal encontra Black Mirror, Exterminador do Futuro e M3GAN, num resultado semelhante também a Submissão, estrelado por Megan Fox.
Ainda que a indústria tenha M3GAN para chamar de ícone pop do terror nesse cenário atual entre o horror e inteligência artificial, Companion oferece um visual interessante para seus robôs, algo que remete a tramas de possessão, além da paleta de cores claras e tons quentes. É curioso perceber que, graças ao uso se tons claros nas roupas de Iris, como isso a colocasse num lugar de mulher ideal, essa caracterização passa a ser desfeita quando ela recebe os traços de uma final girl – ou boneca final? – : a roupa suja, os pés descalços, as tentativas de fuga que fazem, em vários momentos, esquecer que estamos diante de uma trama com uma IA querendo sobreviver – e é ótimo quando o roteiro brinca com as possibilidades, sempre apontando para a ideia de domínio e controle que discute.
O resultado está longe de ser uma trama envolvente embora com um final que possa ser visualizado – como em Ex_Machina –, mas Companion é divertido ao que se propõe: contar uma história de terror diferente para o dia dos namorados americano, nem que para isso tenha que acreditar que sim, o filme é subversivo e imprevisível e, ainda assim, consegue imaginar como seria se um homem frustrado adquirisse uma IA que pudesse satisfazer seus caprichos nessa recente safra de misturar ficção científica e outros gêneros para falar de inteligência artificial, mesmo sem querer, de fato, se apoiar na temática do momento.
Acompanhante Perfeita (Companion – EUA, 2025)
Direção: Drew Hancock
Roteiro: Drew Hancock
Elenco: Sophie Tatcher, Jack Quaid, Lukas Cage, Megan Suri, Harvey Guillén, Rupert Friend, Marc Menchaca, Jaboukie Young-White, Matt McCarthy
Duração: 97 min