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Crítica | Dexter: Pecado Original – 1X09: Doação de Sangue

O retorno de Brian Moser.

por Ritter Fan
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  • spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos demais episódios e de todo o nosso material da franquia.

Espertamente usando uma campanha de doação de sangue na delegacia de polícia em razão do tiro que o detetive Bobby Watt levou na operação desastrosa deflagrada pelo capitão Aaron Spencer, o roteiro escrito por Scott Reynolds consegue ao mesmo tempo dar importância à quase tragédia que ocorreu, como lidar com o quanto isso afetou todos por ali, sem deixar de fazer com que a narrativa central, bifurcada em duas, continuasse caminhando a passos largos. No entanto, Doação de Sangue é um daqueles raros episódios cujo “julgamento final” justo e sincero precisa aguardar o próximo e derradeiro, já que não só ele não me parece deixar a minissérie (ou seria temporada?) no ponto ideal para ela ser encerrada em apenas mais um capítulo, como ele revela dificuldade em encontrar seu tom, revertendo a problemas de seu começo, ao mesmo tempo em que efetivamente reintroduz um personagem importante apenas em seu final.

E quando me refiro a problemas do início da série, falo especificamente do Código de Harry, peça fundamental da mitologia do protagonista, ser atropelado por um Dexter afobado. Pecado Original não nos apresenta à origem do código. Ele já existe quando a série começa e o que vemos é Dexter usá-lo pela primeira vez, com a benção do pai, para matar sua primeira vítima, a enfermeira homicida que trata Harry. Vimos, também, ele desobedecer o código em Só um Arranhãozinho, o que consigo aceitar como parte de sua evolução. Mas isso acontecer agora novamente e com ninguém menos do que com o chefe da divisão de homicídios da polícia de Miami – e amigo de longa data do pai de Dexter – me parece um exemplo clássico de involução narrativa, verdadeira preguiça do roteiro. Nós sabemos que Aaron é culpado, mas as provas que Dexter tem sobre a culpabilidade do capitão são no máximo, com boa vontade, circunstancias, especialmente porque ele é o pai da criança sequestrada. Uma desconfiança sem substância técnica alguma, sem algo mais contundente do que o saco plástico de uma loja passando de mãos e, especialmente, sem que  houvesse uma conversa entre filho e pai antes, em que o primeiro apresenta com calma seu caso ao segundo, é como esgarçar ao ponto de arrebentar toda a suspensão da descrença.

E, como se isso não bastasse, qual era mesmo o plano de Dexter? Assustar Aaron com seus preparativos para o ritual de assassinato a ponto de ele revelar onde está o garoto e, depois, matá-lo? Fazer o que ele fez, de “sem querer” cortar o plástico para o policial fugir e Dexter poder segui-lo? Seja qual for a resposta, em qualquer caso ela é errada. Fundamentalmente errada. Dexter não tinha as provas que precisava e era condição sine qua non descobrir o paradeiro da criança, pelo que a única solução razoável, se ele realmente não quisesse insistir no assunto com o pai, era seguir Aaron por todos os lugares até que ele inevitavelmente o levasse até o esconderijo. Notem que eu não estou reclamando que o episódio tem desenvolvimento que não segue aquilo que eu acho que deveria seguir. Eu apenas queria algo que se encaixasse na lógica do Código de Harry aplicado a uma situação de altíssimo risco como a que vemos aqui. Novamente, Dexter não estava diante de um vilão da semana qualquer, que ele poderia despachar sem consequências. Era o capitão de polícia, era seu chefe, era um dos grandes amigos de seu pai. E, claro, havia uma criança em jogo. E sim, ele precisava cumprir as regras do Código de Harry. Nada disso foi feito e tudo o que vi, aqui, foi uma linha narrativa no mínimo estranha, canhestra, tentando forçar uma situação inverossímil dentro da lógica da própria série.

Por outro lado, a inserção de um Brian Moser adulto na série depois de ele ter uma participação relâmpago em Um Garoto Numa Loja de Doces só teve um real problema, que foi o quão tardiamente isso ocorreu, quase parecendo que Pecado Original tinha esse objetivo e não podia explicitá-lo antes para guardar segredo ou algo do gênero. Entendo essa escolha, mas não gosto muito. Felizmente, porém, adorei a maneira como, esquecendo a questão da temporalidade, a presença de Brian no episódio foi trabalhada e isso tanto nos flashbacks quanto no presente. Se já havia ficado claro que o pequenino Brian já era bastante perturbado em tenra idade, algo que Harry percebera, mas nunca realmente se envolvera, por razões óbvias, o “incidente” com a Deb bebê que é quase sufocada por Brian é uma maneira inteligente de explicar a lógica por trás da separação dos irmãos. No presente, somos apresentados a um Brian que só teve sua psicopatia amplificada pela separação de Dexter depois de ver sua mãe ser esquartejada por serra elétrica (aliás, foi uma cena para lá de gráfica o interior do contêiner, mas uma que eu achava realmente importante ser mostrada como foi) e que, ao que tudo indica, parece estar liquidando todos aqueles que, de uma maneira ou de outra, fizeram mal a ele em sua percepção enviesada.

Roby Attal, no papel, foi uma escalação inspirada, assim como foi Patrick Gibson como Dexter. O Brian que ele constrói no razoavelmente pouco tempo de tela que tem é perfeitamente lógico, misturando uma espécie de rancor adocicado com momentos em que só vemos o “louco furioso” que ele na verdade é. Ver o crescendo da realização de Harry sobre o retorno de Brian à sua vida, agora como um serial killer, é também muito interessante e eu me peguei perguntando se as mortes de Doris Morgan e do próprio Harry teriam algum dedo de Brian, mesmo que, canonicamente, Doris tenha falecido de câncer (Harry é outra história, pois ele faleceu por overdose proposital – suicídio – de sua medicação de coração, mas isso poderia, em tese, ser causado por terceiros em um retcon esperto). Outro aspecto que me causou dúvida é o porquê do intervalo entre os eventos que vemos acontecer agora e o segundo retorno de Brian Moser, agora como o Assassino do Caminhão de Gelo, algo como 15 anos depois, em tese a primeira efetiva vez em que ele e Dexter se reúnem. Será que haverá tempo para que isso ganhe desenvolvimento sem que haja necessidade de uma segunda temporada, algo que espero que não esteja nos planos da Showtime/Paramount?

Entre um evento atabalhoado e outro bem trabalhado, tivemos espaço, ainda, para ver a primeira semente de seguir a profissão de policial ser plantada na mente de Deb, que é a segunda vez em que a personagem de Sarah Michelle Gellar contribui para as “perguntas que ninguém nunca fez” sobre o Dexter que conhecemos na série original (a primeira foi o tranquilizante para cavalo em F de Fodeu). Além disso, vemos um pouco mais da continuação da cumplicidade de Dexter com o policial Clark Sanders (Aaron Jennings) ao redor do fato de ele ser gay, mas não ter elegido contar a seus pares, em um momento interessante, de cunho sério, que funcionou muito bem como um instante humano fora da caixinha usual de fingimento do protagonista, por assim dizer, com direito até mesmo a uma conclusão cômica, com Mazuka insistindo que Dexter tirasse mais sangue sem saber que ele acabara de fazer isso.

Doação de Sangue, portanto, é um episódio complicado de avaliar. Ele acerta em muita coisa, mas tropeça completamente na forma como a investigação de Aaron por Dexter é desenvolvida, com um elemento extra, que é Aaron dizer que fez o que fez só para se vingar da ex-esposa, que eu espero com todas as minhas forças que ganhe recontextualizaçao no último episódio, pois não é possível que seja apenas isso. Só nos resta, agora, aguardar para ver como tudo será amarrado em um último episódio que carrega enorme responsabilidade narrativa e que eu temo que não consiga chegar ao fim sem uma corrida desabalada cheia de reviravoltas ou, pior ainda, armando situações para serem resolvidas em uma segunda temporada.

Dexter: Pecado Original – 1X09: Doação de Sangue (Dexter: Original Sin – 1X09: Blood Drive – EUA, 07 de fevereiro de 2025)
Desenvolvimento: Clyde Phillips (baseado na série desenvolvida por James Manos Jr. e na obra de Jeff Lindsay)
Direção: Michael Lehmann
Roteiro: Scott Reynolds
Elenco: Patrick Gibson, Christian Slater, Molly Brown, Christina Milian, James Martinez, Alex Shimizu, Reno Wilson, Patrick Dempsey, Michael C. Hall, Sarah Michelle Gellar, Sarah Kinsey, Isaac Gonzalez Rossi, Jasper Lewis, Roby Attal, Aaron Jennings
Duração: 52 min.

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