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Crítica | O Dia do Chacal, de Frederick Forsyth

O manual do assassinato político.

por Ritter Fan
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Frederick Forsyth começou sua carreira profissional como jornalista e uma de suas mais importantes coberturas foi como correspondente diplomático da BBC escrevendo sobre a Guerra Civil da Nigéria, o que resultou em sua primeira incursão na literatura, em 1969, com seu livro jornalístico A História de Biafra. De acordo com seu próprio relato, seu caminho pela ficção, que começou com O Dia do Chacal, em 1971, deu-se por necessidades financeiras, já que seu primeiro livro fora um fracasso de vendas, deixando-o em uma situação difícil já que, antes, ele havia saído da BBC. E, quase que da noite para o dia, seu thriller político e investigativo tornou-se um dos mais importantes e influentes em seu gênero na literatura moderna, servindo como base ou inspiração para um sem-número de outras obras, filmes e séries, além de seu realismo quase sem paralelo ter sido cultuado até mesmo por outro assassinos famosos, como por exemplo Yigal Amir, o israelense que matou Yitzhak Rabin em 1995.

Forsyth deliberadamente utilizou método jornalístico para escrever O Dia do Chacal, que conta a história fictícia de um assassino britânico alto, loiro e de olhos opacos cinzas que, em 1963, é contratado pela OAS (Organisation Armée Secrète ou Organização Armada Secreta) para matar o presidente francês Charles de Gaulle. Dividido em três grandes e famosamente intituladas partes – Anatomia de uma Trama, Anatomia de uma Caçada e Anatomia de um Assassinato – o romance transita de fatos reais para a ficção de maneira brilhante, com Forsyth começando sua história contando com muitos detalhes o atentado da OAS ao presidente francês em 22 de agosto de 1962, conhecido como o Ataque Petit-Clamart e partindo de seu fracasso para introduzir uma dissidência na organização paramilitar clandestina responsável por atos terroristas e atentados na Argélia e na França em razão da descolonização capitaneada por De Gaulle que, em um pequeno comitê de três membros presidido por Tenente Coronel Marc Rodin que decide contratar um assassino profissional, desconhecido das autoridades francesas, para planejar e executar um novo atentado.

Quase toda a abordagem de Forsyth é eminentemente de cunho jornalístico, ou seja, trabalhando ficção como fato e usando linguagem tão objetiva quanto possível, o que por vezes cria uma atmosfera curiosa de “Manual de Assassinato de Figura Pública”, certamente algo que atraiu a atenção de assassinos reais pelo mundo, algo que pode ser mais diretamente exemplificado pelo método que o Chacal, apelido que o assassino sem nome se dá para fins dos mínimos contatos com a OAS, emprega para obter um passaporte britânico falso a partir de uma pessoa falecida há anos que teria mais ou menos a mesma idade que ele se tivesse vivido. A questão é que esse método não só funcionava, como permaneceu como um “furo de segurança” até 2007 no Reino Unido. Como o autor não esconde que seu livro não é de História Alternativa, ou seja, não leva a eventos de monta que mudariam o cenário mundial como seria a efetivação do assassinato de Charles de Gaulle (que foi alvo, na vida real, de seis atentados pela OAS e, dizem a lenda, pelo menos 30 em toda sua carreira política), explicitamente citando que o presidente morreria de causas naturais anos depois, o que de fato aconteceu, já que ele faleceu já aposentado, em 1970, ao 79 anos, em sua casa de campo em Colombey-les-Deux-Églises, seu foco está nos detalhes dos métodos, seja na criação do plano da OAS que resulta na contratação do Chacal que vê essa missão como sua última, no detalhamento do plano do assassino que não só falsifica documentos, como altera sua aparência e contrata serviços de um armeiro para criar um rifle desmontável de acordo suas precisas especificações e, também na investigação e caçada capitaneadas pelo Comissário-Adjunto Claude Lebel, que precisa agir sem revelar o que está fazendo por ordens expressas do presidente francês.

Forsyth não tem pressa e ele também não segue as “regras” clássicas de romances em geral, não se furtando em apresentar novos personagens já quando sua história está acabando e sem necessariamente trabalhar arcos narrativos ou aprofundar na psiquê de seus personagens, tudo na lógica de que o que ele escreve está na seara de um relato mais objetivo, mais direto, ainda que muito detalhado, sobre todo o processo. Com isso, é possível argumentar que O Dia do Chacal é um livro frio, distante, que não toma partido seja de um lado, seja de outro, deixando o espectador tomar suas decisões. E, de fato, existe um inegável distanciamento entre o leitor e os personagens, especialmente o Chacal que age quase que completamente sozinho, o que impede que o contato humano abra portas sobre ele, com sua motivação sendo uma só: cumprir a missão para ter dinheiro suficiente para se aposentar. Somente quando Lebel é introduzido que uma abordagem um pouco mais calorosa é introduzida, ainda que Forsyth faça do trabalho detetivesco que ele encabeça um trabalho essencialmente “de escrivaninha”, ou seja, sem que o comissário saia de sua sala, apenas usando o telefone para acionar seus colegas em países de três continentes para tentar descobrir primeiro a identidade do Chacal, algo que é quase impossível dada a completa ausência de informações que inicialmente se tem sobre o assassino de aluguel. Com isso, o autor “extrai” o glamour que se espera de uma caçada desse tipo, reenquadrando-a como algo que muito provavelmente espelha o cotidiano de muitos detetives: pesquisas, telefonemas e reuniões.

No entanto, mesmo distante e de certa forma frio e substancialmente na forma de relato jornalístico, O Dia do Chacal funciona muito bem como um thriller de fazer o leitor não só não parar de virar as páginas, como começar – ou intensificar – a roer as unhas, especialmente quando a convergência das metódicas investigações de Lebel e os cada vez mais improvisados atos do Chacal começa a efetivamente acontecer, levando a momentos que são tão excitantes quanto frustrantes, dependendo do lado que o leitor torça. Frederick Forsyth não poderia ter tido um começo melhor em sua prolífica carreira de escritor de romances de ficção que geraria uma série de outros clássicos thrillers que, porém, arrisco dizer, não teriam o mesmo tipo de destaque que sua obra de estreia merecidamente amealhou.

O Dia do Chacal (The Day of the Jackal – Reino Unido, 1971)
Autoria: Frederick Forsyth
Editora original: Hutchinson & Co
Data original de publicação: 07 de junho de 1971
Editora no Brasil: Abril Cultural
Data de publicação no Brasil: 1980
Páginas: 465

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