Home TVEpisódio Crítica | Duna: A Profecia – 1X03: Irmandade Acima de Tudo

Crítica | Duna: A Profecia – 1X03: Irmandade Acima de Tudo

Fazendo jus ao nome Harkonnen.

por Ritter Fan
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  • spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos demais episódios.

Agora sim podemos realmente dizer que Duna: A Profecia começou de verdade. Não que o que aconteceu em A Mão Oculta e Duas Lobas não tenha sido interessante, mas é na história pregressa – de origem, como queiram – das irmãs Valya e Tula Harkonnen que a série comandada por Diane Ademu-John e Alison Schapker mostra seus dentes e cria o tipo de universo que agarra o espectador pela gola e o arremessa lá para dentro sem dó, nem piedade. Tenho consciência, por outro lado, que dedicar um episódio quase inteiro para flashbacks em uma série de apenas seis talvez seja muito, mas o roteiro de Monica Owusu-Breen e Jordan Goldberg, conduzido pela direção de Richard J. Lewis, sabe como poucos trabalhar o passado para polinizar o presente, entregando motivações de décadas atrás que dão coesão a praticamente tudo, fincando a narrativa profundamente na relação entre as irmãs.

Curiosamente, Irmandade Acima de Tudo tem um outro efeito, que podemos chamar tanto de colateral quanto de planejado, pois tudo aquilo que vislumbramos do “passado antes do passado”, ou seja, tudo aquilo que o roteiro nos conta, mas não mostra, consegue ser mais instigante do que tudo até agora, inclusive a origem das irmãs. Falo especificamente da queda da Casa Harkonnen, da ascensão da Casa Atreides e as ações de Vorian Atreides até o assassinato – que não temos nenhum detalhe e só sabemos pela narração obviamente não confiável de que foi um Atreides o responsável – de Griffin Harkonnen, irmão mais velho de Valya e Tula. Sim, o prólogo do episódio inaugural também abordou parte do assunto, mas tudo era pouco palpável por lá e, aqui, a narrativa ganha peso e relevância tanto quando vemos a degradação dos Harkonnens em Lankiveil, um planeta gelado em que a carne e a pele de baleia peluda é tudo que há para ser oferecido tanto para comércio local quanto exterior, como quando toda a construção da história leva a uma jovem Valya (Jessica Barden arrasando com uma intensidade assustadora no papel) a tornar-se uma fria máquina de vingança contra aqueles que ela considera culpados pela derrocada de sua família e pela morte de seu amado irmão.

Mas, como eu disse, criar interesse pelo universo expandido de Duna em passado ainda mais remoto é, também, não tenho dúvida, mais do que só um efeito colateral que em tese pode esvaziar um pouco o interesse pela série, pois, como tudo hoje em dia é franquia, Duna: A Profecia é, também, a porta de entrada para outras séries tanto na forma de prelúdios quanto de continuações. Há mais de 100 anos de história antes e nada menos do que 10 mil anos de história depois dos eventos que estamos vendo agora, o que naturalmente abre os olhos repletos de cifrões dos executivos dos estúdios, especialmente considerando que Brian Herbert, filho de Frank, ao lado de Kevin J. Anderson, já explorou boa parte desse lapso temporal na série de livros que os dois escreveram ao longo de décadas, inclusive Irmandade de Duna que serve de base para Duna: A Profecia.

E todo esse passado de Valya e Tula é muito bem explorado. Valya é a vingança encarnada e tudo o que ela faz, seja no passado ou no presente, tem como objetivo deliciar-se com aquilo que todo mundo sabe que fica melhor servido frio. Seu jogo de xadrez no presente para reaproximar-se da Casa Corrino depois de ser expulsa de lá por Desmond Hart envolve retornar à sua família, como vemos no final, o que pode começar a criar a escada para um conflito de larga escala para que os Harkonnens possam reerguer-se perante o Imperador. Do lado de Tula (Emma Canning também muito bem no papel), nós a vemos ser a marionete da vingança de Valya na longa e muito bem construída sequência em que ela extermina um clã Atreides, deixando apenas um menino vivo, menino esse que muito provavelmente é Keiran Atreides. Quando o touro salusano – símbolo da Casa Atreides – aparece ao final para Tula, o simbolismo fica evidente considerando o que ela explica sobre como ele só é atraído por um odor pútrido de uma glândula venenosa de um pequeno animal. Para todos os efeitos, Tula deixou-se corromper pela irmã e metaforicamente exala o odor que atrai o touro e talvez seja por isso que ela desafia o que Valya talvez determinasse sobre o destino da jovem Lila e, no lugar de matá-la, perdendo mais outro amor, ela a conserva em um tanque de especiaria muito semelhante ao que é usado pelos Navegadores Espaciais, permitindo-nos o primeiro vislumbre de que Raquella empregou a tecnologia proibida da máquinas pensantes para criar seu banco de dados de DNA humano espalhado pela galáxia.

É particularmente interessante como Valya se recusa a colocar a irmandade à frente de sua família e de si própria, assim como é intrigante notar que a Voz vem originalmente dela em circunstâncias que não são explicadas para além de um vago “desenvolvimento da espécie humana” à que Raquella alude. Isso posiciona Valya como um instrumento essencial para as Bene Gesserit que, ao mesmo tempo, macula profundamente a irmandade. Afinal, a segunda grande líder da organização e que potencialmente a levará à grandeza imaginada pela finada primeira líder, tem como razão base de existir a vingança contra os Atreides, sua raiva profunda inclusive materializando-se como uma arma letal que ela controla e ensina às suas acólitas.

Com esse “começo tardio” da temporada, já em sua metade, e considerando o quanto de informações novas nos foram apresentadas, eu redobro meu receio que expus em minha crítica anterior sobre como a temporada (ou será uma minissérie?) conseguirá chegar a algum fim, pelo menos de um arco, sem deixar todas as pontas soltas para resoluções futuras, o que seria muito ruim. No entanto, parafraseando Calvin Candie, Duna: A Profecia tinha minha curiosidade, mas, agora, a série tem minha completa atenção. Resta agora esperar que as showrunners não nos desapontem!

P.s.: Pode ser que seja só eu, mas não consigo ver o Cone do Silêncio sem me lembrar imediatamente do mesmo aparato, só que um “tantinho” menos tecnológico, da inesquecível série Agente 86 e abrir um sorriso daqueles de me fazer desconcentrar da história. E o mais interessante é que Duna, o romance de Frank Herbert que começou tudo e que menciona o Cone do Silêncio, foi lançado em 1965, mais precisamente um mês antes da estreia de Agente 86 na televisão americana cujo primeiro episódio conta com o cone. No entanto, uma versão telepática dele foi criada bem antes ainda, em 1956, por Arthur C. Clarke, em A Cidade e as Estrelas, sendo que vale lembrar que Duna foi originalmente publicado de forma serializada entre 1963 e 1965, ainda que eu não tenha certeza se, nessa versão, havia menção ao cone.

Duna: A Profecia – 1X03: Irmandade Acima de Tudo (Dune: Prophecy – 1X03: Sisterhood Above All  – EUA, 1º de dezembro de 2024)
Desenvolvimento: Diane Ademu-John, Alison Schapker
Direção: Richard J. Lewis
Roteiro: Monica Owusu-Breen, Jordan Goldberg
Elenco: Emily Watson, Jessica Barden, Olivia Williams, Emma Canning, Jodhi May, Sarah-Sofie Boussnina, Chloe Lea, Chris Mason, Shalom Brune-Franklin, Mark Strong, Travis Fimmel, Jade Anouka, Edward Davis, Josh Heuston, Faoileann Cunningham, Aoife Hinds, Camilla Beeput, Cathy Tyson, Brendan Cowell, Laura Howard, Tessa Bonham Jones
Duração: 62 min.

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