Avaliação da minissérie:
(não é uma média)
- Há spoilers.
WandaVision foi a primeira e, para mim, ainda a melhor série criada dentro do Universo Cinematográfico Marvel (não estou contando, portanto, com as séries que foram absorvidas a posteriori pelo UCM, como Demolidor) e ela gerou uma das maiores surpresas de uma fase mais mornamente recebida no infinito projeto de universo compartilhado de Kevin Feige. Agatha desde Sempre faz uso da excelente Agatha Harkness, vilã de WandaVision vivida sensacionalmente por Kathryn Hahn, para mergulhar de verdade no cantinho das bruxarias dos estúdios Marvel, sob controle, mais uma vez, de Jac Schaeffer.
E o que a showrunner faz de melhor é usar muito bem quase todo seu cuidadosamente escolhido elenco, por vezes até reduzindo o espaço da protagonista para que Joe Locke, Patti LuPone, Debra Jo Rupp, Sasheer Zamata, Aubrey Plaza e Ali Ahn possam realmente subir ao palco, ainda que os destaques fiquem mesmo com os três primeiros, com Zamata e Plaza ficando em uma espécie de segundo escalão e Ahn seja completamente subutilizada. O objetivo da minissérie é múltiplo e todos eles são alcançados, mesmo que em graus diferentes. Agatha Harkness ganha seu desenvolvimento próprio e, ao final, é mantida mais como vilão do que qualquer outra coisa, ganhando reposicionamento no UCM como um espírito guia; Wiccano, filho de Wanda Maximoff é triunfalmente introduzido no UCM; Morte dá as caras; Mephisto é oficialmente citado; todo um lado puro de bruxaria é abordado de certa forma em oposição ao lado da magia que podemos ver na subfranquia do Doutor Estranho; Jennifer Kale é posicionada para potencialmente fazer parte dos Filhos da Meia-Noite, e, finalmente, as portas ficam escancaradas para a busca por Célere (Tommy), irmão de Wiccano, o que pode levar diretamente à minissérie Vision Quest, outro spin-off de WandaVision e, também, à formação dos Novos Vingadores.
E o melhor é que Schaeffer consegue inserir Agatha desde Sempre no UCM tanto como um degrau de algo muito maior, como, também, uma minissérie substancialmente autocontida, encontrando um equilíbrio exemplar que deveria ser o padrão da Marvel Television de agora em diante, de forma que permita o desenvolvimento do macro sem que se perca o micro de vista (nada contra também que as séries sejam só sobre o micro vale dizer; o que não pode, para mim, é que elas sejam descaradamente feitas só para o macro). Claro que alguns sacrifícios tiveram que ser feitos, os mais evidentes deles tendo sido o desperdício de Ali Ahn e o relativo pouco aproveitamento de Sasheer Zamata e Aubrey Plaza. Além disso, todo o contexto que leva Agatha a ser uma serial killer de bruxas ao longo dos séculos ficou no ar, sem uma lógica clara, ou seja, sem responder se ela fazia aquilo simplesmente porque era (é) malvada ou se havia motivos ulteriores.
A bruxaria de Agatha ajudou o UCM a recuperar um pouco de sua credibilidade e isso pode pavimentar o caminho para novas séries semelhantes, menores, mais íntimas, sem muita “batalha de luzinhas”, que foquem em personagens pouco aproveitados até mesmo nos quadrinhos. Aliás, não duvidaria de uma segunda temporada de Agatha desde Sempre. Seja como for, uma coisa é certa: a Marvel simplesmente não pode desperdiçar o talento de Jac Schaeffer no comando de suas séries. Ah, e eu não ficaria nada triste se Aubrey Plaza ganhasse mais destaque, seja em uma série própria, seja em séries de outros personagens, ou até mesmo em uma transposição para a tela grande.
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Como fazemos em toda série ou minissérie que analisamos semanalmente, preparamos nosso tradicional ranking dos episódios para podermos debater com vocês, lembrando que os textos abaixo são apenas trechos das críticas completas que podem ser acessadas ao clicar nos títulos dos capítulos. Qual foi seu preferido? E o pior? Mandem suas listas e comentários!
9º Lugar:
Por Provações Irá Passar
1X03
Apesar de compreender perfeitamente e até gostar da escala menor de Agatha desde Sempre, falta algo à minissérie, algo que a torne urgente, que efetivamente crie perigo e que dê significado à jornada das bruxas por uma Oz que parece ter saído da cabeça de Tim Burton e que, já adianto, merece ser elogiada pela direção de arte. E não, não estou sendo afobado querendo mais informações ou mais ação. Meu ponto é que diálogos como o de Jennifer Kale (Sasheer Zamata) com o Jovem (Joe Locke) em que ela não muito sub-repticiamente indica que ele seria o filho que Agatha trocou pelo livro de magia sombria parece algo que só existe para criar discussões entre espectadores e fãs sobre a verdadeira identidade do misterioso personagem, já que a expectativa é que ele seja… CENSURADO. É como se o roteiro já estivesse todo pronto, mas alguém se lembrasse, na hora da filmagem, que era necessário engrossar o caldo do mistério, o que detrai do todo que, aqui, é a interação entre as bruxas e uma Agatha lutando contras seus instintos de autopreservação e sendo obrigada a jogar em equipe.
8º Lugar:
Ache o Caminho
1X01
Vivida por uma atriz que “se parece demais” com Kathryn Hahn, Agnes existe em uma sátira direta da recente e sensacional minissérie Mare of Easttown (Easttown, Westview…) em que Kate Winslet encarna uma detetive semelhante, sacada genial de Schaeffer que, com uma cajadada só, faz o tal autoplágio (ou, talvez, auto-homenagem) de forma que suas duas séries “conversem” diretamente e uma piscadela para uma minissérie de qualidade “do concorrente”, além da reunião de todos os clichês policiais possíveis em um pacote esperto, mas não particularmente especial. Claro que ver Hahn viver Agatha vivendo Agnes como Winslet viveu sua policial é sempre um prazer, algo que é amplificado pela presença de Aubrey Plaza como a bruxa Rio Vidal que chega para despertar Agatha do feitiço de Wanda Maximoff, em que é inadvertidamente ajudada por um jovem sem nome (Joe Locke) que os leitores de quadrinhos sabem muito bem quem é se, claro, sua identidade não for alterada para a minissérie, mas esse início é um tanto quanto cansado, com a novidade que essa estrutura representava em WandaVision perdendo seu impacto aqui.
7º Lugar:
Laços Vão Fazer a Porta Aparecer
1X02
Mas o bom é que Schaeffer não insiste e Agatha já é Agatha – menos seus poderes – ao final do primeiro episódio, partindo, no segundo, com o jovem à tiracolo, para reunir um novo coven (conventículo ou conciliábulo também servem!) de forma que ela possa abrir um portal para o Caminho das Bruxas e recuperar suas habilidades mágicas. Laços Vão Fazer a Porta Aparecer é, para todos os efeitos práticos, o real primeiro episódio da minissérie, já que é nele que vemos como deve ser a estrutura dos sete episódios seguintes e as personagens que acompanharão Agatha nessa jornada, além de uma visão rápida das Sete de Salem que não parecem gostar muito da protagonista. Ver a reutilização de Debra Jo Rupp, da série original, desta vez como uma bruxa que sequer sabe que é uma bruxa e a apresentação das personagens de Patti LuPone, Sasheer Zamata e Ali Ahn, todas bruxas desapoderadas e quase falidas em sucessão é algo que acaba fazendo o segundo episódio funcionar marginalmente melhor do que o primeiro, ainda que o personagem de Locke esteja “sobrando” na história.
6º Lugar:
Bruxa, Mãe e Algoz
1X09
O flashback para a “origem de Agatha Harkness” me fez levantar a sobrancelha em desconfiança sobre a inserção dessa história no último episódio da minissérie, mas, na medida em que vemos The Ballad of the Witches’ Road sendo composta por mãe e filho como uma brincadeira e, depois, usada como uma forma de atrair bruxas para Agatha sugar os poderes, literalmente revelando que o Caminho das Bruxas é uma invenção da dupla, tudo fica bem mais interessante. O retorno ao século XVIII ganha sentido e importância, encaixando-se como uma reviravolta a mais em cima da reviravolta do final do episódio anterior em que vimos Billy perceber que ele, manipulando a realidade, materializou magicamente aquilo que Agatha e Nicholas criaram centenas de anos antes, na prática fazendo de Agatha desde Sempre uma efetiva – e boa de seu próprio jeito – recriação de WandaVision ou, como disse na crítica anterior, BillyVision.
5º Lugar:
Nesse Ritual, a Glória É o Final
1X08
E, mesmo que o episódio anterior continue, até este ponto, vitorioso em meu ranking mental (que em breve será materializado, obviamente), Nesse Ritual, a Glória É o Final é um sucessor digno, mantendo a qualidade de tudo o que veio antes na minissérie. Afinal, mesmo que a primeira parte do episódio pareça simples, ele é, na verdade, um jogo em que vemos Agatha manobrar os peões para, primeiro, tirar Jen do tabuleiro e, depois, iniciar seu plano para entregar Billy para Morte, conforme ela prometera logo antes. O que vale, nessa metade, é como Agatha usa suas palavras aparentemente contra ela mesma para revelar o segredo de quem desapoderou Jen, facilitando a recuperação das habilidades e o fim do jogo para a bruxa das poções e, em seguida, para ensinar Billy a guiar a “alma mágica” (ou seja lá o nome disso) de Tommy para um jovem recém morto, exatamente como ele fez consigo mesmo ao possuir o falecido William.
4º Lugar:
Um Ser Familiar
1X06
Episódios que “quebram” uma temporada de série ou uma minissérie para voltar ao passado e contar a origem de algum personagem ou lidar com algum assunto de outra forma importante para a obra normalmente me cansam e já me fazem iniciar a empreitada com uma certa má vontade. E, mesmo que completamente esperado e necessário para Agatha desde Sempre, Um Ser Familiar não foi uma exceção para mim, e minha sensação de “afff, mais uma história de origem” foi amplificada pela constatação de que era a minutagem mais avantajada até agora, em direta oposição ao episódio anterior, que foi o mais curto. No entanto, para minha surpresa, o roteiro de Jason Rostovsky soube equilibrar bem explicação e ação, trazendo até uma grande surpresa, enquanto que a direção da brasileira-americana Gandja Monteiro (que já comandou episódios de Wandinha, The Witcher e The Walking Dead: Dead City), não deixou a história esmorecer e deu a Joe Locke o espaço e o tempo que ele precisava para realmente atuar e não só fazer figuração de luxo.
3º Lugar:
Algo Oculto e Impuro
1X05
Sim, tudo poderia andar mais devagar, com mais explicações, mais tempo para pensar (em que exatamente eu não sei, porém) e, principalmente, mais espaço para as atrizes brilharem. Eu entendo tudo isso, mas não reputo como problema, ainda que eu reconheça o último ponto que listei anteriormente como o único realmente válido, já que ver mais do elenco é sempre melhor, especialmente se for Kathryn Hahn personificando Debra Jo Rupp para zoar com o grupo. Seja como for, prefiro muito mais algo ligeiro e eficiente do que algo lento e cansativo, especialmente na seara de adaptações de quadrinhos, em que filmes de pelo menos duas horas mortalmente repetitivas inexplicavelmente tornaram-se comuns mesmo nos casos em que muito claramente não há material para tanto tempo assim, como foi recentemente a situação do interminável Deadpool & Wolverine. Não é comum Hollywood aceitar que menos é mais, mas as séries da Marvel em geral e as de Jac Schaeffer em particular conciliam bem tempo e história.
2º Lugar:
Eu Não Te Vejo, Mas Te Protejo
1X04
Usando A Balada do Caminho da Bruxa tocada ao contrário para trazer à vida um demônio relacionado com a família de Alice e, de quebra, aquelas teorias de conspiração que giram ao redor de ritos satânicos na indústria da música, a segunda provação mostra-se muito mais orgânica e muito mais habilmente conduzida por Rachel Goldberg, já que tudo o que é necessário fazer é que as bruxas formem uma banda e cantem a mesma canção – só que na ordem normal e na versão rock de Lorna Wu, mãe de Alice -, inegavelmente o ponto alto da minissérie até agora. Afinal ver a performance de Hahn nos vocais, como também pelos pequenos detalhes dessa formação, desde a revelação do objetivo primordial da balada, passando pela distribuição dos instrumentos, com Rio inevitavelmente ficando na bateria e com direito a Patti LuPone nos comicamente diminutos “metais” e uma posição de backing vocal, ironia e ao mesmo tempo homenagem pelo fato de ela ser uma lenda do teatro musical dos EUA, já tendo ganhado nada menos do que dois prêmios Tony, dois prêmios Olivier e dois prêmios Grammy.
1º Lugar:
Se a Morte Me Encontrar
1X07
É interessante e até corajoso notar como a própria Kathryn Hahn fica em segundo plano no episódio, mesmo que seus histrionismos que imitam perfeitamente a imortal composição dramática de Margaret Hamilton, no clássico longa de 1939, tenham destaque no início. Hahn, muito apropriadamente, abre espaço para a premiada LuPone subir no palco da minissérie para sua performance final, algo que a atriz faz com muito vigor, seja parecendo “desmiolada” no subsolo do Caminho das Bruxas, seja como a segura e altruísta Glinda, na superfície. A revelação de que Vidal é a Morte, com um visual inspirado no Dia de Los Muertos mexicano empresta uma camada extra de interesse ao episódio, criando uma conexão mental para mim – que inexiste no Universo Cinematográfico Marvel, eu sei, mas não consigo evitar – entre ela e Thanos, já que os dois, nos quadrinhos, são amantes e o Titã faz o que faz por amor, mas, na prática, pavimentando o caminho para que ela seja a vilã dos episódios finais, mesmo que isso ainda não exatamente diga a que veio a série, se eu quiser ser bem sincero, já que as peças ainda não foram completamente encaixadas, pelo menos não para mim.