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Crítica | Frankenstein (2015)

Direção e elenco renomado não assegura o desastre narrativo e estético dessa versão 2015 do clássico gótico.

por Leonardo Campos
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Lançado em 2015, “esse” Frankenstein é uma tradução com ares contemporâneos para o clássico romance de Mary Shelley. O enredo, como nós já imaginamos, desde os créditos iniciais, gira em torno de um cientista que, obcecado pela ideia de criar vida a partir de matéria morta, acaba trazendo à vida uma criatura feita de partes de cadáveres, reanimada por meio de uma escusa experiência científica. No entanto, ao invés de encontrar a aceitação e a beleza na sua criação, não apenas o cientista, mas todos os envolvidos no processo se deparam com o horror e o arrependimento, num esquema de abandono do que foi criado, relegado ao mundo que rejeita aquilo que não é considerado como normal em nossa sociedade de padrões. É um filme que deveria se aprofundar na relação complexa entre criador e criação, explorando temas de solidão, rejeição e a busca por identidade, pelo menos para justificar a sua existência enquanto retomada cinematográfica ao universo em questão. No entanto, isso não acontece. Traduzido numerosas vezes para telas, a criatura, interpretada com um esforço sem sucesso de empatia, é retratada não apenas como um monstro, mas também como uma vítima das circunstâncias e do abandono de seu criador. Isso não a impede, por sua vez, de se posicionar como uma espécie de Michael Myers. O que isso quer dizer? Simples: ele deixa de ser apenas aquela figura amarga pela solidão para se transformar numa sanguinária máquina assassina. Olhado pelo ponto de vista dos subgêneros do cinema, Frankenstein, de Bernard Rose, é um slasher. Ah, e dos irregulares.

O filme aborda superficialmente as questões existenciais e morais relacionadas à ciência, à natureza humana e às consequências de brincar de Deus. A estética sombria e a atmosfera densa se esforçam, mas não ajudam a enfatizar a luta interna de ambos dos personagens envolvidos na redoma de horror criada em laboratório que, depois de ter seu experimento escapado das mãos responsáveis, ganhou as ruas e se transformou num problema de calamidade pública. É surpreendente ver como o cineasta Bernard Rose, que também assina o roteiro da tradução, entrega aos espectadores uma produção tão bizarra. Mas aqui, caro leitor, não é o bizarro estético em si, mas as escolhas dramáticas, os diálogos, extraindo de veteranos como Danny Huston e Carrie-Annie Moss, os desempenhos menos interessantes de suas carreiras, ou menos, os piores, haja vista não ter assistido aos filmes que compõem o painel completo das trajetórias de ambos. Tony Todd, o icônico Candyman, faz uma participação como o deficiente visual que acolhe o “monstro”, mas que acaba se tornando alvo de sua fúria assassina, num texto que recolhe alguns elementos do ponto de partida literário, mas os recicla.

Não apenas do ponto de vista dramático, mas nos parâmetros estéticos, Frankenstein nos apresenta um desenvolvimento além do irregular. A textura percussiva de Halli Cauthery pontua o filme sem expressividade, dando ênfase em sustos que, pela experiência do espectador, são previsíveis. Candace Higgis, na direção de fotografia, estabelece uma tonalidade acinzentada, com a maior parte das cenas em espaços diurnos, outro setor que não ajuda no desenvolvimento do filme com proposta tão deslocada. Bradd Fillmann, na posição de supervisor do design de produção, também não favorece a trama com elementos visuais que pudessem disfarçar, ao menos, os equívocos textuais. Os cenários são simplórios, a criatividade parece minada, com direção de arte, adereços e outros elementos que compõem a linguagem cinematográfica deixado de lados em prol de muito sangue esparramado e mortes extremamente violentas. É desapontador ver um cineasta experiente cometer algo do tipo. Durante a exibição, me veio o questionamento da intromissão de produtores: será que o que foi entregue como produto final é a mesma versão idealizada pelo realizador? Independentemente da resposta, ato falho: a versão que contemplamos é puro horror, mas não o horror estético. É na verdade demasiadamente ruim.

Ademais, Xavier Samuel até tenta entregar um desempenho dramático viável, afinal, ele praticamente segura os 89 minutos de filme praticamente, mas a falta de direcionamento mais coeso impede que o ator consiga se sair bem. Em linhas gerais, é ultrajante, mas como outros filmes focados no universo de Mary Shelley e sua obra-prima, o filme nos permite ampliar as reflexões sobre a relação do monstro, de Victor Frankenstein e do contexto de criação em geral com a narrativa bíblica da criação do homem, presente no livro de Gênesis. Não por causa do roteiro, mas por conta do processo de recepção e da curiosidade para entendermos os motivos para a criatura laboratorial ter um nome, neste caso, não um nome qualquer, mas ser chamado de Adam. Tanto Victor Frankenstein quanto Deus, na narrativa bíblica, são figuras que exercem o papel de criadores. Victor, em sua busca pelo conhecimento e pelo poder, tenta superar as limitações humanas ao criar um ser vivo a partir de matéria morta. Ele é um científico ambicioso que busca demonstrar que o conhecimento humano pode empurrar as fronteiras da vida e da morte. Da mesma forma, a figura de Deus na Bíblia é apresentada como onipotente, realizando o ato de criar o homem à sua imagem e semelhança. Essa criação de Adão é vista como uma ação deliberada e guiada por um propósito maior. Observado de prismas comparativos, podemos dizer que Frankenstein quer ser como Deus. Só que o projeto dele fracassa vertiginosamente.

E, curiosamente, nos perguntamos: será que o propósito bíblico também não falhou? Guerras, racismo, violência, ganância, tudo de ruim que a humanidade ainda apresenta, mesmo o nosso mundo tendo mudado tanto. Para pensar.

De volta: o aspecto do propósito é central em ambas as histórias. Deus cria Adão com uma finalidade: dar-lhe a gestão do Éden e a capacidade de se relacionar com Ele. O ato de criar possui um significado intrínseco e reflexivo, uma relação de carinho e responsabilidade. Em contraste, a criação de Frankenstein surge de uma motivação mais egocêntrica. Victor está mais preocupado com o reconhecimento e o poder que a criação lhe conferirá do que com o bem-estar de sua criatura. Esta diferença de intenções revela uma crítica à falta de responsabilidade que pode acompanhar a busca desenfreada pelo conhecimento. A relação entre criador e criatura apresenta semelhanças importantes nas duas narrativas. Após a criação, tanto o monstro de Frankenstein quanto Adão são figuras que se encontram em um estado de solidão e alienação. O monstro, abandonado por Victor logo após sua criação, tenta encontrar seu lugar no mundo, mas é continuamente rejeitado por causa de sua aparência grotesca. Isso reflete a angústia existencial e a busca por aceitação e amor. Adão, por outro lado, ao ser criado, inicialmente goza de um relacionamento próximo com Deus, mas também enfrenta a solidão até a mulher criada de sua própria costela o leve a cometer o “pecado original”. Assim, ambas as criaturas buscam significado e conexão, mas infelizmente, eles enfrentam rejeição, o que acentua suas ansiedades e descontentamentos. Lamentável que o filme em questão, analisado por aqui, não tenha nada de curioso, filosófico ou fascinante quanto essa relação comparada.

No final das contas, é apenas mais um filme de terror pouco conhecido. Não é a toa que foi uma das versões mais difíceis de achar para contemplar e entregar esse breve texto para vocês.

Frankenstein (EUA, 2015) 
Direção: Bernard Rose
Roteiro: Sean Tretta (inspirado no romance de Mary Shelley)
Elenco: Danny Huston, Xavier Samuel, Carrie-Anne Moss, Peter Adrian Sudarso, Steve Hart, Matthew Jacobs, Dave Pressler
Duração: 89 min

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