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Crítica | Longlegs: O Colecionador de Almas

Você não tem medo do escuro porque você é a escuridão.

por Roberto Honorato
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Se você segue o trabalho de Osgood Perkins como diretor (a maior parte do público deve reconhecê-lo como o coadjuvante David de Legalmente Loira, quando ele ainda usava o nome Oz Perkins), também deve ter notado uma identidade visual bem forte desde seu primeiro longa, A Enviada do Mal, e ele tem se dedicado exclusivamente ao cinema de horror desde então, com obras que costumam dividir um pouco o público, muitas vezes por conta da forma que o diretor explora os temas sem seguir uma estrutura narrativa mais clássica, como acontece em seu Maria e João: O Conto das Bruxas, de visuais que sabem utilizar muito bem a simbologia em volta do conto de fábulas, porém sofre um pouco com um enredo sem o mesmo brilho.

Não vou resumir tudo em “muito estilo e pouca substância” porque o cinema é contato exatamente no visual, então há uma necessidade intrínseca do cinema (e toda obra de arte, na verdade) em se considerar o estilo com o mesmo peso que todos os outros elementos, e o cinema de Perkins costuma se aproveitar bastante da forma para contar suas histórias, e o mesmo acontece em Longlegs, seu novo filme, que chamou bastante atenção pela campanha de marketing, e que provavelmente deve criar opiniões diversas por conta da expectativa do público, principalmente quem não está acostumado com o diretor.

Dessa vez introduzindo o gênero de thriller policial no terror sobrenatural, é fácil fazer comparações entre Longlegs e outros filmes do tipo, seja o clássico Silêncio dos Inocentes, o Zodíaco de David Fincher e até A Cura, de Kiyoshi Kurosawa, principalmente por termos pequenas referências e elementos que remetem imediatamente a essas obras (os quais não vou mencionar agora por questão de spoilers, não só de Longlegs, mas dos outros). Aqui temos uma agente do FBI investigando um assassino em série que retorna depois de anos e faz com que ela precise desvendar sua identidade e reviver o próprio passado em busca de respostas, tendo como pista apenas as cartas criptografadas do assassino e uma estranha sequência de eventos envolvendo vítimas bem específicas.

Como mencionei antes, Longlegs se aproveita do formato para contar sua história, e nesse departamento Osgood se garante, brincando com a razão de aspecto para deixar clara a transição entre passado e presente e criar uma atmosfera de inquietação no espectador – aqui lembra o filme Ao Cair da Noite nesse sentido -, algo que também é intensificado através de um excelente trabalho de composição, dando muitas vezes atenção para um elemento inanimado de onde poderia facilmente surgir um jumpscare bem colocado, mas aqui ele é utilizado para aumentar a incerteza do ambiente e uma sensação de paranoia, com personagens que parecem estar sendo constantemente observados. Isso é algo que combina com a premissa do filme em explorar tanto o seu lado thriller policial, que tenta resolver o mistério da identidade de Longlegs, quanto uma aspecto mais sobrenatural que também levanta questões e novas interpretações em cima até mesmo do que já foi dado como verdade pelo enredo.

Ainda que eu esteja completamente a bordo da proposta, Longlegs parece interessado em equilibrar muita coisa em cima de uma boa ideia, mas que fica carregada com a quantidade de temas e subtramas que acumula no caminho. O mistério principal, o lado thriller investigativo, chega a ser previsível na execução da trama, no entanto há charme na construção daquele mundo e na forma que as personagens se comportam, alguns bastante contidos e outros mais extravagantes, quase caricatos, o que deixa muitas situações de tensão mais leves por conta de um alívio cômico inesperado.

A agente Lee Harker, interpretada pela queridinha indie Maika Monroe, é uma protagonista reservada, mas também a menos interessante por conta de sua personalidade similar a de tantos outros agentes do FBI capazes de investigar um caso impossível por conta de um talento inexplicável, o que além de ser um cliché que o filme sequer tenta subverter (ele não tem obrigação, mas nesse caso fez diferença), é possível interpretar Lee como mais um exemplo do estereótipo da personagem que é inteligente por ter características de um indivíduo neurodivergente. Isso me lembra imediatamente de uma cena da série Community, onde Abed critica esse estereótipo usando exatamente produções investigativas como as principais culpadas por isso. Por outro lado, Nicolas Cage está em um dos papeis que melhor soube utilizar o lado mais teatral do ator, interpretando um Longlegs que não só é angustiante de assistir por conta de seu comportamento imprevisível, mas pela atuação física que faz todo o diferencial na personagem.

Longlegs é mais um exemplo de Osgood Perkins sendo ótimo em dirigir seus atores e criar uma ambientação específica, embora também traga alguns de seus vícios em inserir várias ideias que soam interessantes isoladamente, mas nem sempre são bem aproveitadas dentro da narrativa. Por mais que eu adore uma obra carregada de questionamentos e debates que você vai ter com seus amigos depois da sessão, Longlegs coloca tudo no guarda-chuva do sobrenatural e do subjetivo, o que não conversa seu lado de thriller policial tão bem quanto as obras que claramente inspiraram essa. 

Longlegs: O Colecionador de Almas – EUA, 27 de junho de 2024)
Direção: Osgood Perkins
Roteiro: Osgood Perkins
Elenco: Maika Monroe, Nicolas Cage, Blair Underwood, Alicia Witt, Michelle Choi-Lee, Dakota Daulby, Lauren Acala, Kiernan Shipka, Lisa Chandler, Jason William Day
Duração: 101 min.

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