Alan Moore deixou os roteiros da série Tom Strong em Como Surgiu Tom Stone, o arco anterior a este aqui, sem de fato concluir a série — o que foi uma pena. Como sempre, nessas ocasiões, a editora precisou contratar roteiristas de emergência para cobrir um buraco qualitativo imenso, numa abordagem difícil de equiparar, como fica bastante evidente na versão desse herói científico agora escrito por Mark Schultz, Steve Aylett, Brian K. Vaughan e Ed Brubaker. Infelizmente, nenhum desses roteiristas conseguiu entregar algo que fosse chamativo do começo ao fim, fazendo com que A Terrível Vida Real de Tom Strong terminasse como o arco mais fraco da série até o momento, distanciando-se muito das propostas gerais de Alan Moore, ao mesmo tempo que tenta emular certas características narrativas comuns aos textos do mago.
Por um lado, é necessário dizer que a saga continua divertida. Por ser um personagem metalinguístico, Tom Strong está o tempo inteiro protagonizando piscadelas para o leitor, fazendo ou aludindo a momentos icônicos da história dos quadrinhos, bem como a personagens e destinos de heróis e vilões memoráveis. Embora menos interessante em termos de contexto, esses elementos permanecem aqui, e fortes, sustentando o interesse do leitor na série. O problema é que só isso não basta para fazer com que um arco inteiro dê certo; que diálogos consigam passar da superfície ou que o conteúdo geral das histórias comunique coisas que não parecem forçadas nem bobas demais, como o discurso ambiental sem graça que Mark Schultz insere na edição de abertura, O Dia em que Tom Strong se Reconciliou com os Céus.
Artisticamente, todas as histórias do volume são válidas, com destaque para o trabalho de Duncan Fegredo (desenhos) e Peter Snejbjerg (arte-final) nas edições que nomeiam e encerram o arco. É uma pena que esse enredo não tenha sido expandido, servindo de linha de conexão entre as “aventuras isoladas” anteriores. Não digo isso porque vejo essa crônica onírica como algo brilhante, mas trata-se da melhor história do compilado e tem bastante potencial para esticar os seus tentáculos dramáticos a outros polos textuais. Na trama, Ed Brubaker se aproveita de um recurso narrativo utilizado de forma inteligentíssima por Alan Moore em Miracleman, e até faz um bom trabalho com isso, mas é tudo tão contido e tão isolado que não permite que a proposta ganhe peso e finalmente ascenda em qualidade ou impacto.
Muitos dizem que é “clubismo” ou “fanatismo“, mas o fato é que existem artistas, em todo tipo de arte, que realmente são insubstituíveis em suas propostas originais. Ou os novos roteiristas e editores deixam muito claro que estarão começando “uma Nova Era” com o título e/ou personagem, grupo, realidade; ou uma substituição dessas tenderá a levar o leitor para um oceano de decepção. No caso de A Terrível Vida Real de Tom Strong, não é uma questão de estarmos numa trama ruim, até porque temos bons roteiristas no projeto, mas criando uma abordagem e problemáticas difíceis de reconhecer como parte do título Tom Strong.
Tom Strong – Vol.5: A Terrível Vida Real de Tom Strong (Tom Strong: Book Five: The Terrible True Life of Tom Strong) — EUA, junho de 2004 a fevereiro de 2005
Publicação original: America’s Best Comics
No Brasil: Tom Strong N°5 (Panini, maio de 2017)
Roteiro: Mark Schultz (#26), Steve Aylett (#27), Brian K. Vaughan (#28), Ed Brubaker (#29 e 30)
Arte: Pascal Ferry (#26), Shawn McManus (#27), Peter Snejbjerg (#28), Duncan Fegredo (#29 e 30)
Arte-final: Pascal Ferry (#26), Shawn McManus (#27), Peter Snejbjerg (#28 e 29),
Cores: Wendy Broome, Carrie Strachan
Letras: Todd Klein
Capas: Chris Sprouse, Karl Story
Editoria: Scott Dunbier, Kristy Quinn
Tradução: Eduardo Tanaka
140 páginas