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Crítica | Batman: Cidade da Loucura

Mais uma variação do Batman para a coleção...

por Ritter Fan
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Batman: Cidade da Loucura é mais uma história do Homem Morcego no selo Black Label da DC Comics, que veio infelizmente substituir a intensa variedade e ousadia da Vertigo com a insistência em se usar a Bat-Família para grande parte do que é feito nessa linha de quadrinhos. Mas há muita coisa boa mesmo assim e a mais nova empreitada de Christian Ward, dessa vez capitaneando tanto o roteiro quanto a arte, é uma espécie de continuação espiritual da normalmente aclamada graphic novel Asilo Arkham – Uma Séria Casa em um Sério Mundo por Grant Morrison e Dave McKean, mas com uma pegada que mergulha 100% no ocultismo e no sobrenatural lovecraftiano.

Não é, confesso logo de início, uma abordagem que adoro para o Batman, personagem que, claro, há muito tempo deixou de ser um detetive vigilante mascarado que espancava bandidos em sua cidade, para ser basicamente tudo, de deus a vilão, passando por absolutamente tudo e qualquer coisa. Mesmo assim, eu acho que o sobrenatural puro, com raras exceções como Chuva Rubra (que tem a vantagem de muito claramente ser um Elseworlds, algo que, até onde sei, não necessariamente se aplica à Cidade da Loucura), e não apenas algo que fica nos sussurros e nas sombras, acaba sendo muito mais um artifício narrativo para chamar atenção do que algo que tenha méritos próprios.

E, na medida em que me aprofundava em Cidade da Loucura, minha impressão de que a graphic novel é muito mais uma invencionice para apresentar os leitores a (mais) uma nova versão do Batman aumentava e, ao final, ela é que ficou. Esse novo Batman, que mistura o herói com um demônio cósmico retirado diretamente de uma obra de H.P. Lovecraft que vive na Gotham Abaixo (tradução direta minha para Gotham Below), uma versão “Mundo Invertido de Stranger Things” da icônica cidade que fica literalmente embaixo dela, separada por uma porta vigiada pela Corte das Corujas que, claro, é aberta logo no início, é, lá no fundo, apenas mais um Batman em uma história que muito claramente partiu desse conceito para fazer nascer todo o restante.

Ward esforça-se no roteiro para inserir referências mil, especialmente à citada HQ de Morrison e McKean, e para lidar com trauma, com o Batman que diz que não mata, mas que, na verdade mata e outras coisas assim que, porém, ficam apenas na superfície, em uma sucessão de diálogos compostos de frases de efeito que, muito sinceramente, parecem ter sido escritos somente para preencher o espaço e dar um semblante de história complexa, algo que fica soterrado debaixo do didatismo exagerado do autor que parece escrever para crianças pequenas que nunca leram nada do Batman (e o público alvo obviamente não é esse), ainda que ele saiba muito bem fazer uso de Harvey Dent para servir de perfeito e um tantinho óbvio guia para uma narrativa que tem duas Gothams em seu cerne. Mas com isso eu não quero dizer que o roteiro não tem mérito no que expõe, pois muito claramente tem, só que ele não mergulha realmente em seus temas, ficando muito mais preocupado em construir a toque de caixa esse “universo espelho”, aproveitando para retconar a origem da Corte das Corujas que, por si só, como sabemos, já é um retcon (essa é uma das razões por eu ter dúvidas se essa revelação será canônica ou não).

Mas o que Ward não consegue fazer com seu texto, ele mais do que consegue com sua arte. Ele não chega a ser um Dave McKean ou um Bill Sienkiewicz em seus momentos mais inspirados (e aloprados), mas ele tem pleno domínio de seu estilo e o impõe de maneira inclemente do começo ao fim, criando sua própria abordagem para Gotham City e, ato contínuo, subvertendo-a para criar Gotham Abaixo e os personagens que lá vivem, especialmente, claro, o Batman Abaixo que sequestra um garoto traumatizado de Gotham Acima para transformá-lo em seu Robin. Usando ao máximo o formato quadradão típico do selo Black Label, Ward ocupa os espaços com sombras carregadas que parecem ser a materialização visual da dor, do trauma e podridão humana, fazendo do Homem Morcego uma espécie de símbolo não de justiça, não de altivez, mas sim de tudo o que está errado na cidade e, claro, na sua versão invertida. Seu uso de cores é potente, com uma paleta azul, preta e cinza quebrada por cores que não chegam a ser fortes ou chocantes, o que seria “fácil” fazer, mas sim que dão vida débil ao que vemos transitar diante de nossos olhos e que combina muito bem com a abordagem sobrenatural da minissérie.

Sobre o epílogo – que não revelarei aqui para deixar a crítica livre de spoilers -, diria que ele é tão aleatório que sua função é, apenas, de causar frisson internético e, portanto, é algo de menor valor ainda do que introduzir mais uma variação do Batman que não precisávamos. Como eu gostaria que um artista do naipe de Ward não sucumbisse a inventar moda e trabalhasse o Batman como um ser humano fantasiado perturbado lidando com criminosos essencialmente humanos (temos que abrir exceções para vilões como Cara de Barro e outros), mas ainda mais problemáticos. Não sei se realmente precisamos de uma entidade cósmica para tornar o Homem Morcego mais interessante do que ele já é ou poderia muito facilmente ser.

Batman: Cidade da Loucura (Batman: City of Madness – EUA, 2013/2014)
Contendo: Batman: Cidade da Loucura #1 a 3
Roteiro: Christian Ward
Arte: Christian Ward
Letras: Hassan Otsmane-Elhaou
Editoria: Matthew Levine
Editora: DC Comics (Black Label)
Data original de publicação: 10 de outubro e 12 de dezembro de 2023 e 13 de fevereiro de 2023
Páginas: 137

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