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Crítica | Meu Amigo Robô (graphic novel)

Uma história infantil do jeito que histórias infantis deveriam ser.

por Ritter Fan
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Sara Varon é uma quadrinista americana talvez mais conhecida por suas obras voltadas para o público infantil com personagens não-humanos. Sua primeira obra publicada foi uma coleção de contos batizada de Sweaterweather & Other Short Stories, em 2003, com Meu Amigo Robô (Robot Dreams no original – usei o título dado no Brasil ao longa animado baseado na graphic novel) sendo sua quarta obra, lançada em 2007. Apesar de ela mirar no público infantil, sua graphic novel não apresenta o mundo idealizado, perfeito e imaculado que costuma ser entregue de bandeja para os pequenos, criando uma zona de conforto irreal que, não demora, é estilhaçada pela realidade. Por outro lado, o que Varon faz é um trabalho delicado, que não é feito para ensinar com o choque, mas sim com a aclimatação para o cotidiano da maioria das pessoas que, no longo prazo, é repleto de mudanças.

Meu Amigo Robô é, essencialmente, sobre amizade. Um solitário cão antropomórfico compra um robô e cria fortes laços de amizade com ele até que um incidente na praia separa os dois, levando o cão a procurar outras conexões humanas (ok, não humanas, mas vocês entenderam) e o robô, paralisado, a sonhar com seu retorno para o seu amigo, o que estabelece, então, o título em inglês original que, também não coincidentemente, é o mesmo de uma compilação de contos de Isaac Asimov, lançado por aqui como Sonhos de Robô. E esse drama – ou tragicomédia, como queiram – é contada completamente sem balões de fala ou de pensamentos, apenas com imagens e onomatopeias, em uma escolha narrativa que, claro torna a obra universal e conversa bem e imediatamente com os pequenos, mas sem subestimá-los.

Aliás, não subestimar o público alvo é a marca dessa graphic novel de Varon. A amizade idealizada existe, mas ela não só nasce da incapacidade do cão de criar conexões… animais com outros, o que aponta levemente para um personagem antissocial, talvez até mesmo com algum distúrbio mais grave e que reflete a realidade como ela é, como ela acaba bruscamente a partir do acidente. Ou melhor, ela esfria, com o cão sendo obrigado a literalmente abandonar o robô na praia a que vão no último dia de verão. A expectativa é que o cão volte para salvar seu amigo, mas, apesar de isso estar em sua mente constantemente, as circunstâncias o impedem e, com isso, a vida segue tanto para ele quanto para o próprio robô ao longo dos meses.

Em outras palavras, a história é linda, mas nunca sanitizada ao ponto de se tornar irreconhecível quando a transpomos para o mundo real. É bem verdade que crianças pequenas não compreendam exatamente a natureza do que acontece, mas isso é bom, pois, provavelmente, gerará dúvidas que serão verbalizadas de alguma forma a seus familiares e/ou professores e, se as respostas forem suavemente honestas, ensinamentos de vida poderão ser passados. Uniões – amizades, casamentos ou qualquer outro tipo – até podem começar querendo ser para sempre, mas a grande verdade é que elas raramente são assim e nunca é fácil romper esses laços, ainda que em diversos momentos esse rompimento seja absolutamente necessário. Meu Amigo Robô introduz essa noção da maneira mais benigna possível, deixando um sorriso agridoce de reconhecimento no rosto de qualquer adulto que a ler.

Como não há falas, Varon secciona sua graphic novel em pequenos trechos bem definidos que contam uma história única, com sua arte muito simples, mas também muito eficiente (interessantemente, ela diz que tende a usar personagens não-humanos porque ela acha que não desenha bem humanos), facilitando a fluidez da progressão narrativa. Não é sempre que ela acerta em cheio nas transições ou nas motivações dos personagens, mas o conjunto de sua obra transmite verossimilhança e, mais ainda, honestidade. Meu Amigo Robô definitivamente não é o tipo de história que se espera de uma obra mirada no público infantil, mas tenho para mim que é justamente essa abordagem mais real que os pequenos deveriam enfrentar com mais constância mesmo em suas tenras idades, pois, não podemos esquecer, eles são muito mais fortes e resistentes do que achamos que são.

Meu Amigo Robô (Robot Dreams – EUA, 2007)
Roteiro: Sara Varon
Arte: Sara Varon
Editora: Square Fish
Data de publicação: 2007
Páginas: 224

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