Enquanto Hollywood experimentava uma era de refilmagens, além do aumento de filmes sobrenaturais e o torture porn ganhava mais força, em 2005, surgia Hellbent, lançamento limitado da estreia de Paul Etheredge como diretor e roteirista em longa-metragem. Em meio a essa faceta do cinema americano, o cineasta apostou numa trama nada original, mas inovadora ao provocar no slasher uma nova safra para o terror: o protagonismo gay. Refletindo vários tropos que eternizaram o subgênero, Etheredge trazia o que de melhor consagrou um dos mais potentes segmentos do terror iniciado no final da década de 70, tanto que, com a chegada do projeto em DVD, depois de ser exibido em festivais de cinema no ano de 2004, a divulgação destacava que o nome envolvido na produção de Halloween II: O Pesadelo Continua e A Hora do Pesadelo estava à bordo.
Quer Hellbent seja caricato e estereotipado e também aclamado por isso, Etheredge conseguiu evocar um efeito semelhante ao que Kevin Williamson fez com o roteiro de Pânico: mostrar que ainda não estava explorando todas as possibilidades que se tinha com o terror. E se Scream fez vários filmes se dedicarem a metalinguagem para parecerem mais inteligentes, Hellbent trouxe o terror queer como subgênero, e foi graças a ele que filmes de baixo orçamento com vampiros gays, lobisomens ou tramas sobrenaturais protagonizadas por homens brancos foi ganhando destaque. A exemplo de Alerta Noturno e Acampamento Sinistro, filmes com acenos queer que ousaram ainda na década de 80, Hellbent: Halloween Sangrento teve a sorte de se popularizar e influenciar outras produções – como AHS: NYC – e também ser a realização queer que mais se aproxima do slasher.
Estrelado por homens héteros, em seu filme, Etheredge trouxe o típico do terror americano com grupo de amigos, espelhando os estereótipos em personagens gays: o líder com passado traumático e destinado a ser final boy; o durão; o promíscuo e o ingênuo, que durante uma noite de halloween só queriam deixar de ficar encalhados e se renderem a pegação, mas durante o caminho, conseguem transformar a noitada de sedução, flerte e desejo numa caçada de sangue ao atraírem um serial killer que gosta de colecionar as cabeças de suas vítimas. Na caracterização de seu vilão, Etheredge mistura o fetichismo em trajes BDSM com a moral punitiva de Sexta-Feira 13 e a pura personificação do mal de Michael Myers ao pôr uma máscara de diabo como a face a ser encarada do assassino.
Mesmo utilizando dos elementos de praxe, o texto do filme ainda tentava adaptar isso ao forro queer, como por exemplo, o protagonista Eddie não ter a virgindade como simbolismo de pureza critérios para sobreviver e sim conseguir ficar com o cara que chamou sua atenção. E foram em pequenos momentos que a direção brincava com a ideia de desejo, tensão sexual e sangue se misturando como a cena em que Eddie se perdia em pensamentos vendo seu crush sangrar ao fazer uma tatuagem ou quando o atrapalhado Joey se sujava com sangue falso na festa. E embora não contasse com uma cena de perseguição memorável, Etheredge entregou cenas de mortes que quase parecia um giallo pelo exagero estético, o que entra o trecho de um ataque em meio a uma balada com luzes piscando fazendo um balanço desproporcional de melodrama, falsa tensão e urgência.
Provando como mesmo sendo caricato sabia apresentar boas ideias, Hellbent fazia seu momento de metalinguagem ao colocar os personagens zombando da motivação inexistente do assassino que poderia ser um gay de 40 anos que ainda não saiu do armário ou que os supostos problemas maternos seria a justificativa – outra forma de citação a Jason Voorhees. Ridículo, estereotipado e raso, a estreia de Etheredge lançou uma divertida comédia de terror inconsciente de tão caricato, mas ainda envolvente (principalmente com os personagens assumindo destaque nos tropeços do roteiro) e com seus méritos. O que sobra o terceiro ato para maior menção, que, ainda que tenha sido anticlímax, trouxe um embate final categórico entre vilão e final boy, com direito a linguada, fetiches e olhos de vidro para lembrar que o filme era slasher, mas queer.
Hellbent: Halloween Sangrento (Hellbent – EUA, 2004)
Direção: Paul Etheredge
Roteiro: Paul Etheredge
Elenco: Dylan Fergus, Bryan Kirkwood, Hank Harris, Andrew Levitas, Matt Phillips, Luke Weaver
Duração: 84 min.