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Crítica | Meu Nome é Gal (2023)

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por Luiz Santiago
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Meu Nome é Gal (2023) está voltado para um período muito específico da vida e da carreira da incomparável Gal Costa (1945 – 2022): de sua chegada ao Rio de Janeiro, a fim de iniciar uma trajetória como cantora, até o show que deu origem ao histórico álbum Fa-Tal – Gal a Todo Vapor (1971), onde o filme se interrompe, faz uma ligação direta com o futuro e nos deixa com cenas de outros shows e trechos de músicas que marcaram a carreira da grande artista baiana. Sob direção de Dandara Ferreira e Lô Politi, o musical é uma cinebiografia do tipo “chapa-branca” que parece não conseguir encontrar o seu próprio rumo, que é narrar a história de uma grande estrela. O mais curioso é que, a despeito disso, o longa possui um encanto difícil de ser explicado. Talvez uma parte disso tenha a ver com a nostalgia, a memória e o carinho que temos em relação à artista e à arte que ela produzia, mas há também outras coisas boas a se considerar no meio do roteiro mambembe e da direção que não se mantém nos trilhos.

Muito se falou sobre a performance de Sophie Charlotte no papel de Gal Costa como estando muitíssimo distante, em qualidade dramatúrgica, da atuação de seus colegas, o que, para mim, não é verdade. A versão que a atriz compõe para a cantora é sim muito boa, pelo menos na maior parte do filme (em algumas cenas, temos a impressão de uma contemplação exagerada, de uma monotonia que contrasta até mesmo com aquilo que o contexto está explorando), mas não se difere da boa qualidade de todo o elenco, até mesmo em relação à expressão caricata que Luis Lobianco fez de Guilherme Araújo. Gosto muito de todos os atores e atrizes aqui em cena, e vejo que todos procuraram criar versões reconhecíveis, mas não imitadoras, dos artistas que homenageiam. A escolha dos figurinos, maquiagem e trabalho com os cabelos também dão um bom toque final de representação, que se torna agradável e aceitavelmente similar aos biografados, além de coerentes com a versão criada pelo elenco.

O tropeço em Meu Nome é Gal vem na concepção da biografia, que funciona como uma colagem de curtas-metragens e pseudo-clipes musicais. De certa forma, me lembrou a ideia geral do curta-metragem de mesmo nome, lançado em 1970,  dirigido por Antonio Carlos da Fontoura. Chega um ponto em que nos perguntamos: onde está a história do filme? E não, o filme não tem, de fato, uma história. O roteiro de Ricky Hiraoka e Lô Politi explora o conceito de “criação e amadurecimento de uma artista“, trabalha alguns fatos isolados, mas absolutamente as todas cenas encerram-se em si mesmas. Não há um entrelaçamento progressivo de um assunto que ganha corpo, é fortalecido e conclui-se. A costura feita pela montagem é apenas conceitual, na esteira da já citada ideia de amadurecimento de uma jovem mulher e seu engajamento político através da arte, em plano Brasil de ditadura empresarial-militar. Isso, porém, é feito com uma coletânea de momentos musicais e dramatização de eventos que não se extrapolam. Dá-se assim a ideia de um longa que junta acontecimentos isolados da vida de Gal Costa, e para por aí. Melhor seria ter produzido um documentário com cenas dramatizadas!

O recorte de tempo é acertado, mas a direção, infelizmente, não sabe explorá-lo bem. Sem a ambição de falar sobre “tudo” e tendo um viés de transformação ideológica para a cantora (em todos os sentidos), a trama poderia deixar o abuso das imitações em Super-8, dos planos gerais de propagandas nos prédios de São Paulo ou das cenas aleatórias nas praias e dar a merecida atenção a Gal, que em quase todo o filme é filmada em função de outros indivíduos ao seu redor, especialmente os homens. Seu ponto de vista é raramente priorizado, e seus temores, suas dores e alegrias são encerradas em poucos momentos de tela. No restante do tempo, a Gal desta produção tem seu brilho é picotado: algumas cenas de shows, outras de gravações dos grandes sucessos e um desfile de “melhores momentos da carreira” nas cenas finais, o que ajuda a derrubar muito a qualidade da obra. Mesmo com o charme e o engajamento ou encantamento que nos traz em muitas cenas, Meu Nome é Gal não está à altura da gloriosa mulher que desejava se corresponder com um rapaz que fosse o tal. O filme entretém, ao mesmo tempo que enfurece.

Meu Nome é Gal (Brasil, 2023)
Direção: Dandara Ferreira, Lô Politi
Roteiro: Ricky Hiraoka, Lô Politi
Elenco: Sophie Charlotte, Rodrigo Lelis, Dan Ferreira, Camila Márdila, Pedro Meirelles, Caroline Andrade, Fábio Assunção, Barroso, Chica Carelli, Lavinia Castelari, Elen Clarice, Nathalia Ernesto, Dandara Ferreira, João Gil, Claudio Leal, Luis Lobianco, Antonio Miano, George Sauma, Liza Schechtmann, Caio Scot
Duração: 120 min.

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