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Crítica | Agnès Varda – Pier Paolo Pasolini – New York – 1967

Dois diretores na nação das alienações.

por Luiz Santiago
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Eu escrevo estas poucas linhas de referência ao filme Agnès Varda – Pier Paolo Pasolini – New York – 1967 na noite de 16 de outubro de 2023 (o tom pessoal da abordagem, aqui, exige data precisa, pois estou adentrando ao território da crônica cinematográfica). Por indicação de um antigo professor, descobri a existência deste curta-metragem dirigido por Agnès Varda em 1966 e editado por ela um ano depois. Para mim, este é o tipo de achado que vale ouro. O filme teve lançamento póstumo, apenas em 2022, após um achado da cuidadosa Rosalie Varda-Demy, filha da cineasta belga, que administra a produtora da família (Ciné-Tamaris) e o legado artístico de sua mãe e de seu pai, o também cineasta, Jacques Demy.

Faço questão reproduzir abaixo, na íntegra, o texto de apoio de Rosalie Varda que traduzi, meio “cambaleantemente“, do francês. Nestes pequenos parágrafos, concebidos para a exibição online do filme, na Cinemateca Francesa, a atriz, cineasta e figurinista nos faz entender todo o processo de produção e contexto do curta, do momento em que sua mãe criou a obra, até o momento em que os negativos foram encontrados e restaurados, 54 anos depois.

Durante a pandemia, na Ciné-Tamaris, nossa pequena empresa familiar, nós organizamos muita coisa. No porão do escritório, encontramos caixas de filmes: 35mm, 16mm, bobinas Super 8. Havia duas caixas de 16mm com um rótulo bastante enigmático: “PASOLINI NEW YORK”. Quando eu a abri, descobri duas bobinas de 16mm, em dupla faixa. Ao desenrolar esse filme, descobri o rosto de Pasolini.

 

Obviamente, foi uma grande surpresa! Agnès sempre dizia: “Ah, tem muita coisa para organizar! Você cuidará disso mais tarde.” Então, cuidamos disso: enviamos imediatamente as bobinas para o laboratório […] e, para surpresa de todos, descobrimos que Agnès filmou em Nova York com uma câmera de 16mm.

 

A segunda surpresa foi que, na verdade, Agnès havia editado as imagens com uma entrevista sonora que ela fez mais tarde com Pasolini. Investigamos. Pasolini e Agnès estavam juntos no New York Film Festival em 1966. Eles já se conheciam. Por que ela não terminou a edição desta entrevista? O mistério permanecerá sem solução.

 

O que é extraordinário sobre esse pequeno tesouro é que Agnès, sempre perspicaz, faz perguntas muito precisas e simples, e Pasolini, que é bastante complicado, responde igualmente simplesmente. Isso é o que torna a originalidade desta descoberta: dois amigos conversando.

É um encontro ímpar, não é? A conversa toca com brevidade em diferentes pontos da vida e das ideias, enquanto vemos a quase mítica caminhada de Pasolini pela rua, sendo acompanhado pela câmera atenta de Varda, que faz questão de também focar nos outros transeuntes, mostrando diferentes etnias, idades, tamanhos de corpos, maneiras de se vestir e de fazer poses, caras e bocas. É um daqueles documentários que, despreocupadamente, se propõem expor uma deia, um conceito (nesse caso, algumas opiniões de Pasolini), mas que acaba criando através da imagem e da edição, muitas outras possibilidade de leitura, talvez bem mais complexas e instigantes do que a defendida na narração — especialmente quando um dos assuntos discutidos é a relação entre ficção e realidade, que acaba extrapolando a própria visão de Pasolini e sendo uma brincadeira de Varda com o próprio curta. Uma provocação com belas cores, boa música e muitos gestos da mãe da Nouvelle Vague.

Agnès Varda – Pier Paolo Pasolini – New York – 1967 (França, 2022)
Direção: Agnès Varda
Roteiro: Agnès Varda
Elenco: Agnès Varda, Pier Paolo Pasolini
Duração: 4 min.

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