Com referências bíblicas, Alice no País das Maravilhas e autorreferências ao seu universo antológico, AHS apresenta o terceiro episódio da atual temporada de maneira lenta, carregados de simbologias que intensificam o estado emocional e psicológico de Anna. Nesse sentido, mesmo mudando de endereço para se proteger, a estrela continua sendo perseguida e atormentada por membros de um possível culto que envolve sua gravidez e carreira. Apesar de não avançar em nada no que diz respeito ao mistério, When the Bough Breaks estava sendo interessante ao usar de representações sobre o processo de luto e paranoias da protagonista. A cena inicial ilustra esse acerto ao vermos o primeiro reflexo do aborto sofrido no episódio anterior: por um momento, numa espécie de sonho, ela experimenta a alegria de finalmente estar grávida, depois, o terror que sobra ao lembrar que isso lhe foi tirado – com o vestido branco ficando vermelho, desfazendo também a pureza que idealizava como mão.
É válido ressaltar, como, desde essa abertura, a ideia de paraíso continua sendo reforçada no decorrer do episódio, ao menos de maneira representativa – como o fato do marido de Anna oferecer incansavelmente uma maçã, fruto do pecado, em sinal de que precisava que ela comesse para dar continuidade aos preparos da seita e gaslight – mas ao contrário de Anna sair do estado de paranoia ao comer a maçã, ela fica cada vez mais convencida que a perseguem, e também, que nunca sofreu um aborto. De todos os episódios, até o momento, esse é o que mais foca na personagem, e ainda assim, não consegue tornar o tema da temporada envolvente e tampouco mostrar que pretende ser menos óbvio.
Ainda que Siobhan em seus poucos minutos de participação tenha sido a voz da reflexão sobre o processo de inseminação artificial e efeitos hormonais, por outro lado, o roteiro de Halley Feiffer continua sugerindo familiaridades entre Delicate e Rosemary’s Baby o que pode ser uma forma de fazer acreditar – a exemplo da frase que referencia Satã na parede da “clínica” encontrada por Anna – que até a reta final a temporada irá reproduzir o final chocante do filme de Polanski para então trazer uma reviravolta diferente ao que estamos esperando. E se Feiffer usar a bizarrice ao seu favor, as influências que Anna tem sofrido antes e durante sua gravidez pode resultar não em um Anticristo, mas numa aranha, como analogia aos terrores da maternidade e técnicas intrauterinas gerar um “monstro”. Dessa forma, essa se faria uma releitura esforçada ao que vários outros títulos emularam acerca de O Bebê de Rosemary, ainda que não tenha tanta cadência na construção de mistério, como imagina.
Tudo indica que Anna está sendo vítima de membros de seitas diferentes, onde a primeira (com seu marido, Sonia e Siobhan) são os responsáveis pelo seu aborto e vão tentar intervir novamente na fertilização de Anna, e a segunda, a com as bruxas, precisa do corpo da atriz para outro tipo de gestação. Seja como for, os dois lados traçam objetivos opostos contra Anna, o que fortalece a ideia de que o fruto será uma consequência, em representação, aos processos agressivos que envolvem a inseminação artificial. Mas não importa muito quando o caminho para as teorias e interpretações sempre caem em um lugar óbvio – como a ferida no rosto de Anna ser um lembrete de que as paranoias e investidas contra seu corpo e sanidade estão aumentando, da mesma forma, as bonecas sinalizarem que estão mudando os métodos dessa inseminação tenebrosa.
Enquanto o episódio anterior tinha uma abordagem caricata e até debochada sobre a indústria de entretenimento e na relação de Anna e Siobhan, When the Bough Breaks foca numa atmosfera mais densa e psicológica, com direitos a acenos a fantasia do mundo de Alice e bíblicas, o que, além da maçã, seria o vinho um símbolo de mudança para o procedimento que Anna sofre? – uma vez que, ela só descobre os lugares escondidos no porão depois de tomar o vinho. Tudo colabora para Anna entrar cada vez mais nos preceitos da suposta seita e conspiração, e ficar cega com a ideia de que continua grávida e que os sinais estranhos que seu corpo manifesta, é a confirmação de que seu sonho está acontecendo.
Na ideia de que tudo e todos não são confiáveis, ainda resta para Delicate o alter-ego de Anna que se manifesta através de Ivy e a boneca, dando demonstrações do que ela tem sofrido quando perde a noção de tempo e o que teria feito durante sua confusão – me pergunto que cesta ela precisaria receber para enxergar além do que seus conspiradores quer que ela veja. Como essas peças vão se encaixar, depende do que Feiffer tem preparado para a temporada: o nascimento do Anticristo ou uma aranha?
American Horror Story: Delicate – 12X03: Quando o Galho Quebra (American Horror Story: Delicate – 12X03: When the Bough Breaks- EUA, 2023)
Direção: Jennifer Lynch
Roteiro: Ryan Murphy, Brad Falchuk, Halley Feiffer
Elenco: Emma Roberts, Matt Czuchry, Kim Kardashian, Annabelle Dexter-Jones, Denis O’Hare, Julie White, Maaz Ali, Sarah Elizabeth Hewitt
Duração: 38 min.
