- Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos demais episódios da série.
Como esperado, o terceiro e último episódio da minissérie O Continental é o clímax do que vinha sendo construído nos capítulos anteriores, com o palco do hotel que dá título à série recebendo uma festa sangrenta com alta contagem de corpos e muitas mortes gráficas. Em termos narrativos, é um desfecho extremamente problemático, como falarei mais à frente, mas com um tantinho mais de frenesi e ação para manter a atenção do público. Apesar da nota, considero Theatre of Pain melhor e mais divertido do que Loyalty to the Master e até Brothers In Arms, do qual dei uma nota maior, mas como finalização de temporada é difícil não passar da mediocridade que é a conclusão da história e da própria minissérie, daí a classificação baixa.
Bem, o roteiro continua ruim. Confesso que a escolha por ir desmembrando o plano de Winston à medida que ele acontece é relativamente interessante, mas a criatividade da história por trás da invasão é fraca e estranhamente fácil, tanto na forma que encurralam Cormac quanto nos confrontos entre as facções no hotel. Da infiltração do grupo de Winston até a forma como dominam um local em tese cheio de assassinos treinados, não ganhamos nenhum tipo de explicação ou desenvolvimento que faça jus a tarefa impossível, com pouca ameaça antagonista fora dos gêmeos macabros. A própria representação do Cormac é terrível, puxando as piores canastrices e histrionismos de Mel Gibson em cenas ridículas que o personagem deturpa passagens bíblicas e usa drogas.
Obviamente que a franquia de John Wick é destilada desse tipo de representação genérica de vilões e passagens de trama, mas tudo faz parte do jogo de ação. Aqui nessa minissérie, como a abordagem é de fazer uma história de crime com camadas dramáticas mais acentuadas, temos que olhar criticamente para as revelações previsíveis do roteiro, como a subtrama descartável de KD, e a falta de qualidade para os conflitos de poder e tomada de território da história, que evoca da pior maneira possível obras de máfia e de gangues. O desfecho atabalhoado e sem sentido de Winston matando a juíza e, após uma edição safada de tempo, olhando da sacada como novo dono do hotel solidifica a fraqueza de um roteiro que passou dois episódios explicando muita coisa e no final resolve a subida de poder do protagonista em elipse.
A questão problemática continua sendo a mesma: O Continental quer trazer um tipo de leitura diferente para a franquia em sua história do submundo do crime, mas se aproveitando das premissas básicas e dos fiapos de trama da cinessérie. Não dá para ter os dois mundos. Se realmente queriam construir uma história sobre poder e justiça com substância, faltou tempo, personalidade e intriga para vermos a subida de Winston no meio da Alta Cúpula, sem falar de melhores subtramas, porque o arco de KD não tem força, tampouco o de Lou descobrindo sobre seu pai (é tudo jogado ali sem emoção, tentando nos forçar sentimentalismos, como na morte indiferente de Lemmy). E se queriam emular a ação dos filmes, faltou mergulharem no eterno balé visual de combates e set-pieces de Stahelski.
Ganhamos um pouco disso aqui em Theatre of Pain, o que torna o episódio relativamente divertido, com destaque para a coreografia da cena da cabine de Lou, a imortalidade dos gêmeos e suas respectivas lutas finais (os contorcionismos de Gretel são fantásticos e quase cartunescos) e o humor ácido e sarcástico durante algumas das mortes e em referência à violência. Mas é muito pouco para salvar uma minissérie chata, superficial e que não agrega nada para um universo que não precisa de expansão de mitologia ou de gêneros, e sim expansão formal com o entretenimento da ação. Erraram logo na identidade da franquia, então deu nisso: uma produção que iremos esquecer amanhã.
O Continental: Do Mundo de John Wick (The Continental: From the World of John Wick) – 1X03: Theatre of Pain (EUA, 06 de outubro de 2023)
Desenvolvimento: Greg Coolidge, Kirk Ward, Shawn Simmons
Direção: Albert Hughes
Roteiro: Greg Coolidge, Kirk Ward, Shawn Simmons, Ken Kristensen
Elenco: Mel Gibson, Colin Woodell, Mishel Prada, Ben Robson, Hubert Point-Du Jour, Nhung Kate, Jessica Allain, Ayomide Adegun, Jeremy Bobb
Duração: 97 min.