Entusiasmados com o impacto cultural dos filmes de vampiros realizados pelo estúdio britânico Hammer, idealizadores japoneses também entraram na onda das criaturas da noite e resolveram investir em narrativas vampíricas que emulavam elementos próprios da cultura ocidental, deixando de lado a mitologia destes seres conforme o que está estabelecido na tessitura cultural oriental. Globalizado, O Vampiro da Noite, clássico que eternizou Christopher Lee como o mais famoso vampiro da literatura e do cinema, ganhou projeção em vários países ao redor do planeta e manteve o legado do romance Drácula, do irlandês Bram Stoker, solidificado na produção cinematográfica. Dirigidos por Michio Yamamoto, a trilogia na qual o filme aqui analisado integra começou os seus trabalhos aterrorizantes com A Boneca Vampira, finalizando com A Maldição de Drácula. Tal conde, conhecido por sua sensualidade, mistério e onipotência na maioria das traduções cinematográficas, sequer é um personagem devidamente inserido na história, em títulos que contemplavam o seu poderoso nome apenas como chamariz para o público.
Assim, devo dizer que conferi os três filmes em sequência. Foi um mergulho intenso na abordagem ocidental, melhor possível de ser analisada depois de uma intensa dedicação aos filmes da Hammer envolvendo Drácula. Conhecer, analisar e refletir sobre as produções do estúdio britânico me permitiu melhor adentrar nos códigos dispostos pelos realizadores dos filmes que compõem a Trilogia Sanguinária, sendo O Lago de Drácula o mais instigante do conjunto. Lançada em 1971, acompanhamos uma curiosa história ao longo de seus breves 82 minutos de duração: logo na abertura, acompanhamos uma garotinha angustiada, em busca de seu cachorrinho desaparecido. Ela vive numa região próxima ao lago que intitula a trama. A atmosfera gótica, sabiamente estabelecida, cria um clima favorável para a sensação de estranheza.
Guiado por uma série de coincidências para permitir que a narrativa tenha fluência, O Lago de Drácula nos apresenta Akiko (Midori Fujita), uma professora constantemente assombrada por pesadelos que remetem ao seu período enquanto criança. Ela vive tranquilamente com a sua irmã, Natsuko (Sanae Emi), mas as coisas começam a mudar rapidamente quando vizinhos e amigos próximos desaparecem misteriosamente. E, no geral, são pessoas que mantiveram contato com ambas antes de partirem para ninguém sabe exatamente onde. O momento clichê se dá com a presença do namorado de uma delas, um homem cético que, mesmo diante de situações que comprovem os acontecimentos nada convencionais, está o tempo inteiro mantendo a racionalidade em jogo. Nós, do lado de cá, sabemos da ameaça vampírica, mas quem integra o interior da narrativa terá que atravessar por muitos maus bocados para garantir a sobrevivência.
Com as habituais cenas de composição fantasmagórica, O Lago de Drácula é um filme de terror tipicamente japonês: não há uma linha exata separando pesadelo de realidade, os personagens são esféricos, mas pedem por interpretações além do trivial, o roteiro de Ei Ogawa e Masaru Takesue amontoa situações, trazendo ainda hipnose, psicanálise e alguns subtextos que confundem os espectadores acostumados exclusivamente com o formato narrativo padronizado dos filmes estadunidenses. Os conflitos, uma vez estabelecidos, noutras são abandonados sem desfecho para que o vampiro entre em cena e cometa os seus ataques sangrentos. E, com uma carga considerável de erotismo, a produção traz um vampiro (Shin Kishida) que se propõe a representar, numa versão oriental, o estilo adotado por Christopher Lee na concepção do icônico Drácula. Em linhas gerais, confuso e nalguns momentos, monótono, mas interessante para compreendermos o quão o legado de Bram Stoker atravessou territórios e contaminou culturas.
O Lago de Drácula (呪いの館血を吸う眼, Japão– 1971)
Direção: Michio Yamamoto
Roteiro: Ei Ogawa, Hiroshi Nagano
Elenco: Midori Fujita, Sanae Emi, Choei Takahashi, Shin Kishida, Yukiko Kobayashi, Atsuo Nakamura, Yoko Minazake
Duração: 82 min.