Se tem algo que temos visto na recente Hollywood, é que filmes não são mais apenas filmes, eles são franquias! A disseminação de universos compartilhados, spin-offs e cinesséries intermináveis tem feito as audiências se acostumarem com a “serialização” do Cinema, principalmente com blockbusters e longas de terror. A bola da vez é Bird Box, fraco longa-metragem de 2018 que acabou fazendo muito sucesso na Netflix e que agora ganhou seu primeiro derivado, na forma de Bird Box Barcelona. A premissa é a mesma e a execução tem suas similaridades, acompanhando sobreviventes em um cenário pós-apocalíptico em que criaturas desconhecidas fazem as pessoas se suicidarem e cometerem atos de violência ao vê-las.
Nessa febre de franquias, um elemento recorrente é a expansão de universo, sempre com histórias maiores e mitologia cada vez mais intricada. Isso nem sempre é um acerto, ainda mais em uma narrativa com as características e a essência de Bird Box, que se beneficia do desconhecido e do inexplicável para trabalhar suspense. Então, quando ao longo deste derivado temos diversos momentos rasos e genéricos de explicação e insinuações do que pode ser a ameaça misteriosa, vemos a produção perder o melhor atributo do material de origem com detalhes desnecessários. O final até tenta dar uma pista em forma de cliffhanger para possíveis novas produções, mas é um desfecho anticlimático e que não gera curiosidade para o que seja que venha a partir daqui.
Entremeio a trama, alguns dos momentos de “explicações” (que acabam levantando mais perguntas do que respostas) servem de maneira simbólica e representativa de dilemas religiosos, críticas ao fanatismo religioso com os “videntes” (pessoas que obrigam outros sobreviventes verem as criaturas) e trabalho visual ritualístico com os diversos suicídios. É uma abordagem curiosa, se beneficiando de um twist logo no início da obra para quebrar a expectativa da história familiar de um pai (Sebástian, interpretado por Mario Casas) protegendo sua filha (algo que já vimos no primeiro longa, em The Last Of Us, The Walking Dead e dezenas de obras pós-apocalípticas), mas falta criatividade, substância e emoção para nos envolver em qualquer debate minimamente engajante sobre tais temas.
Voltando-se mais para a direção, Álex e David Pastor têm as mesmas dificuldades de Susanne Bier na primeira adaptação em torno da construção de suspense e mistério das criaturas, se resignando a ventanias ensurdecedoras e objetos levantando que não criam nenhum estado de ansiedade na audiência. A aparição dos monstros fica até repetitiva, sempre acontecendo a mesma coisa de novo e de novo, sem nenhum artifício mais criativo, a não ser o cansativo desfile de pessoas se suicidando de formas diferentes enquanto agentes do caos destroem um grupo de cada vez. As mortes vão se tornando gratuitas, às vezes com gore pelo gore, e em todos os momentos sem nenhum vínculo com os personagens que nos façam sentir empatia e emoção com as mortes.
Bird Box Barcelona até tenta apelar para sentimentalismos baratos com o protagonista, colocando uma montagem atrapalhada que mostra seu passado, mas é tudo muito convencional e estereotipado. Em uma história tão comum, se nem nos preocupamos com os personagens, fica difícil a experiência ser sequer razoável. Até mesmo a atuação ruim de Sandra Bullock no filme original consegue extrair mais do telespectador do que o derivado, que só realmente ganha uma protagonista simpática no último ato. No entanto, consigo enxergar algumas ideias interessantes no roteiro (a reviravolta com Sebástian; os temas religiosos; o foco em um segundo antagonista mais tangível com os videntes), mas nada é interessante ou desenvolvido o suficiente para nos salvar do marasmo e do ritmo ruim da produção, que também trabalha muito mal qualquer senso de expansão (apesar dos sets serem bonitos, Barcelona é só outro cenário), que, aliás, já não combina com a essência desta história. Também não ajuda o enredo o quão sem visão e sem imaginação é a direção dos irmãos Pastor.
Bird Box Barcelona | Espanha – 2023
Direção: Álex Pastor, David Pastor
Roteiro: Álex Pastor, David Pastor (baseado em romance de Josh Malerman)
Elenco: Mario Casas, Naila Schuberth, Georgina Campbell, Diego Calva
Duração: 112 min.