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Crítica | Dê uma Mão aos Garotos (Mistérios do 87º Distrito #11), de Ed McBain

O ápice do ciúme.

por Luiz Santiago
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Dê uma Mão aos Garotos (sim, há um duplo sentido aqui) inaugura a década de 1960 na série Mistérios do 87º Distrito. O livro começa de uma maneira muito similar a outra ótima entrada na série, O Traficante do Vício, com a diferença de que naquele volume de 1956, o patrulheiro Dick Genero reclamava de um inverno rigoroso, e aqui, ele lastima a incessante chuva que há dias castiga a cidade. É um início de história que eu gosto muito, mostrando um domínio cada vez maior de Ed McBain na maneira como apresenta o espaço geográfico onde as coisas acontecerão (a cidade de Isola) e o ponto de partida inesperado — ao menos neste livro, é inesperado — para o crime que resultará na investigação da vez. O assassinato aqui acontece em elipse, alguns dias antes, e apresenta-se ao policial de patrulha Dick Genero como uma mão decepada dentro de uma mala de viagem com o selo de uma prestigiada companhia aérea.

Por conta de uma investigação difícil, sem muitas pistas satisfatórias para a equipe, Steve Carella e alguns de seus colegas ligados ao caso vão ficando progressivamente impacientes e frustrados. Há uma sequência inteira mostrando Carella sendo rude pela primeira vez com a esposa (não o sentido criminoso, nem nada, mas ainda assim, rude), e saindo dos trilhos, para os padrões policiais, quando dá um soco em um colega que estava sendo xenofóbico em relação a um outro policial, de ascendência portorriquenha.

Como já é de praxe na série, existem vários blocos narrativos que mostram o lado pessoal dos policiais, suas emoções, desejos, decepções, e como tudo isso afeta (ou eles se esforçam para não afetar) o dia a dia no trabalho. A ligação entre a questões pessoais dos homens da lei e a busca pelo assassino decepador de mãos acaba em diversos becos sem saída, e mesmo que alguns suspeitos imediatos apareçam, há sempre uma grande dificuldade de encontrar a devida ligação, mais do que aconteceu nas outras vezes. Em algumas cenas, algo sugere uma luz no fim do túnel, mas no processo de questionamento, acaba não dando em nada.

Em certa medida, me senti lendo uma história de Simenon, porque existe aqui uma grande preocupação do autor em destacar questões pessoais, conflito de ideias, explosões emotivas e até mesmo caminhos diferentes no processo de investigação. Sem contar que o crime, dessa vez, é um feminicídio (grifo aqui o fato de estar consciente de usar um nome contemporâneo para o ato) com traços de forte desequilíbrio psicológico por parte do criminoso. A revelação do assassinato, a maneira como os policiais encontram o assassino e os detalhes do delito são chocantes. Acredito ser a revelação mais detalhada e o mais cruel que já tivemos na série até o momento, por mostrar mais elementos grotescos numa perspectiva passional e insana — o que piora tudo.

O choque dos policiais é tamanho, quando chegam à verdade, que o encerramento da narrativa é depressivo, pesado, com o grupo inteiro do Distrito sem nem vontade de tomar um cafezinho, quando lhes é oferecido. Quando comecei a ler o livro, não fazia ideia de que me depararia com um dos enredos mais fechadinhos e mais intensos dos casos do 87º, mas foi justamente isso que encontrei aqui. Uma investigação que passa muito tempo sem dar frutos, mas que de maneira rápida, revela o que tem escondido e, quando esses esqueletos no armário se revelam, nos espantamos e lamentamos o horror que um ser humano pode infligir ao outro.

Mistérios do 87º Distrito – Livro 11: Dê uma Mão aos Garotos (87th Precinct #10: Give the Boys a Great Big Hand) — EUA, 1960
Autor: Ed McBain
Edição lida para esta crítica: Thomas & Mercer, 2012
202 páginas (edição digital)

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